A greve não supera a crise
Gestão precária, prejuízos aos usuários e omissão política

A greve dos trabalhadores do sistema de ônibus públicos de Teresina iniciada, na manhã da segunda-feira (12), mascara aspectos sociojurídicos, para além das demandas da categoria – p.ex. o reajuste salarial e as melhorias de benefícios (vale-alimentação e plano de saúde).
Nesse sentido, a greve, em si, enquanto direito dos trabalhadores não é apenas um reflexo da longa crise dos transportes coletivos em Teresina, mas uma parte do todo. Cujo usuário, como a razão de existir e o sustentáculo do sistema de transportes coletivos, é, de longe, o mais prejudicado e humilhado.
Isto é, a greve é um importante instrumento de pressão coletiva utilizado pelos trabalhadores para defender seus interesses e reivindicações frente a classe patronal, mas, necessariamente, não se vincula ao bem-estar dos usuários de coletivos.
E, mesmo que os trabalhadores dos transportes coletivos conquistem os seus pleitos, os usuários não recuperarão os seus prejuízos nem serão beneficiados. Por exemplo, uma usuária de coletivos residente no bairro Tancredo Neves, na Zona Sudeste, pagou R$ 44 de motorista por aplicativo para ir a uma consulta médica no centro – ou seja, 11 vezes mais que o valor da passagem de coletivo.
Até porque, o poder público, responsável pela concessão do sistema de transportes coletivos, não falta de um plano gestor sempre usa de paliativos para amenizar os danos irreparáveis à população, que a onera ainda mais – p.ex. o cadastramento de veículos alternativos, incluindo aplicativos, que cobram acima do valor integral da passagem, R$ 4, para todos os passageiros.
Porém, há décadas, a questão fundamental em torno do sistema de transportes públicos da cidade, mesmo com greves sucessivas e mudanças de gestores municipais e de vereadores, não entra na pauta política (só em campanhas eleitorais): a construção participativa da política municipal de transporte coletivo.
Dessa forma, abriremos para o debate público a caixa preta do transporte coletivo de Teresina, para revelar, entender e apresentar soluções aos vários desafios, incluindo a falta de investimento em infraestrutura, as dificuldades financeiras, a quebra de monopólios, a falta de manutenção e de segurança, o planejamento urbano deficiente, a falta de controle de itinerários, o modelo de tráfego, os problemas de acessibilidade e outros.
Assim, a greve dos trabalhadores do sistema de ônibus públicos de Teresina, que é justa e legal, não supera em nada a crise que maltrata, há décadas, todos os passageiros de coletivos. É um desafio complexo, que nem mesmo um falso “visionário do além”, que outrora prometeu, em campanha eleitoral, resolver em cem dias o problema, sem sequer saber que gestão pública eficiente se faz com planejamento estratégico e técnicos qualificados.
Por isso, até hoje, o sistema é ineficiente e se mantém, precariamente, às custas do aumento de tarifas, de gratuidades oportunistas, da manutenção de privilégios patronais, de frotas defasadas, do engodo político em campanhas eleitorais, da exploração da classe trabalhadora, da humilhação dos passageiros, de improvisos na gestão pública dos conflitos de classe, da falta de integração modal, da baixa qualidade dos serviços prestados etc.
Portanto, ao se encerrar a greve e atendidas (ou parcialmente atendidas, como é de costume) as demandas dos trabalhadores do sistema de ônibus públicos de Teresina, a população em si em nada será beneficiada, pois se a questão fundamental permanecer fora da pauta política, outras greves virão.
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