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Noite histórica em Cannes: vitória de Wagner Moura e consagração de "O Agente Secreto"

Cinema brasileiro vivendo momentos memoráveis


Reprodução Noite histórica em Cannes: vitória de Wagner Moura e consagração de "O Agente Secreto"
O Agente Secreto

O cinema brasileiro alcançou um marco histórico neste sábado (24), na 78ª edição do Festival de Cannes. Wagner Moura foi consagrado como Melhor Ator por sua atuação em O Agente Secreto, longa-metragem dirigido por Kleber Mendonça Filho, que também recebeu o prêmio de Melhor Diretor. A cerimônia de premiação, marcada por aplausos calorosos e forte comoção, consolidou o protagonismo do Brasil na cena internacional.

O filme, que já havia causado forte impressão em sua estreia, foi ovacionado com mais de 10 minutos de aplausos após sua primeira exibição, um feito raro mesmo para os padrões do prestigiado festival francês. Desde então, O Agente Secreto figurou entre os favoritos da crítica, colecionando elogios em veículos como The Guardian, que descreveu a obra como “ambiciosa” e “visualmente magnífica”, e destacou a atuação de Moura pela sua “complexidade empática em cena”.

O entusiasmo se repetiu em publicações como o Hollywood Reporter, que classificou o desempenho do ator como um “retorno brilhante ao cinema nacional”, ressaltando que Mendonça Filho extraiu dele “uma performance digna de uma estrela global”. O site The Playlist foi ainda mais direto, atribuindo nota máxima ao longa e chamando-o de “obra-prima”.

Premiação múltipla e reconhecimento internacional

Além da estatueta de Melhor Ator, O Agente Secreto foi duplamente laureado: conquistou o Prêmio da Crítica, outorgado pela Federação Internacional de Críticos de Cinema (Fipresci), que destacou a obra por sua “generosidade romanística e épica”, capaz de evocar “um tempo e lugar ricos, estranhos e profundamente preocupantes”. O júri elogiou a capacidade do filme de criar um universo próprio, descrevendo-o como “pessoal, mas universal”.

O longa também foi agraciado com o Prix des Cinémas Art et Essai, concedido por exibidores europeus a cineastas comprometidos com o circuito de salas especializadas. Nas edições anteriores, esse prêmio foi entregue a obras de autores como Mohammad Rasoulof e Alice Rohrwacher, reafirmando a relevância artística da escolha.

Brasil, País de Honra em Cannes 2025

A vitória de Moura e o sucesso do longa coincidem com uma edição simbólica do festival: o Brasil foi escolhido como País de Honra de 2025, distinção promovida pelo Marché du Film, setor de negócios do festival, que destaca anualmente uma cinematografia de relevância global. O Brasil se junta, assim, ao seleto grupo que já homenageou Índia, Espanha e Suíça.

Em nota oficial, o Ministério da Cultura celebrou o reconhecimento, que “evidencia a vitalidade da produção audiovisual brasileira, a força de seus talentos e o papel do país nas redes de coprodução internacional”. A homenagem incluiu ainda uma ampla programação dedicada ao cinema brasileiro, com exibições, debates e iniciativas para o fortalecimento da presença nacional no mercado global.

Sinopse: entre o real e o fantástico

Ambientado em Recife, em 1977, O Agente Secreto acompanha Marcelo, um professor especializado em tecnologia, interpretado por Wagner Moura, que busca escapar de um passado violento ao se mudar de São Paulo para a capital pernambucana. Chegando à cidade durante o Carnaval, Marcelo vê-se tragado pelo caos que sempre tentou evitar e passa a ser espionado pelos vizinhos, mergulhando numa atmosfera de paranoia e opressão.

Embora não trate diretamente da ditadura militar, o filme articula uma crítica contundente à repressão e à corrupção do período, utilizando elementos de realismo fantástico para discutir memória, trauma e a reconstrução histórica.

No tapete vermelho: frevo, emoção e política

O longa foi um dos destaques da programação na Riviera Francesa, com direito a frevo no tapete vermelho e uma presença marcante de artistas brasileiros. Wagner Moura, embora ausente da cerimônia de premiação, foi homenageado por Kleber Mendonça Filho, que subiu ao palco para agradecer em nome do ator: “Tive a sorte de trabalhar com Wagner Moura, um grande artista e ser humano. Espero que este reconhecimento lhe traga muitas alegrias. Obrigado ao júri e à presidente Juliette Binoche”, declarou o cineasta.

Mendonça Filho também destacou o papel da coprodução internacional na realização do filme, agradecendo à parceira francesa Emilie Lesclaux: “Este reconhecimento mostra que histórias locais podem dialogar com o mundo inteiro”, afirmou.

Em discurso emocionado, dedicou o prêmio “a todos que insistem em fazer cinema no Brasil”, enquanto Moura, em mensagem enviada à equipe, reforçou a necessidade de políticas públicas para a cultura.

Um novo marco para o cinema brasileiro

A vitória de Moura marca a segunda vez que um ator brasileiro conquista um prêmio de interpretação em Cannes — as anteriores foram Fernanda Torres, em 1986 (Eu Sei que Vou Te Amar), e Sandra Corveloni, em 2008 (Linha de Passe). Trata-se, porém, da primeira vez que um brasileiro recebe o troféu de Melhor Ator na competição principal.

Para Kleber Mendonça Filho, o prêmio consolida uma trajetória internacional iniciada com O Som ao Redor (2012) e alavancada com Bacurau (2019), vencedor do Prêmio do Júri em Cannes há seis anos.

Críticos e especialistas destacam que o duplo reconhecimento — artístico e político — simboliza um momento de renovação para o audiovisual brasileiro, que vem enfrentando sucessivos cortes de financiamento e instabilidade econômica. O sucesso de O Agente Secreto pode abrir novas portas para coproduções internacionais e ampliar a circulação do cinema brasileiro em festivais e plataformas de streaming.

Ano de ouro para o cinema nacional

O triunfo em Cannes coroa um ano excepcional para o cinema brasileiro no exterior. Recentemente, Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, venceu o Oscar de Melhor Filme Internacional, enquanto O Último Azul, de Gabriel Mascaro, foi laureado com o Urso de Prata no Festival de Berlim.

Com essa vitória, o Brasil não apenas reafirma sua força criativa, mas também seu potencial como protagonista no cenário audiovisual global. A noite histórica em Cannes é, assim, mais do que um reconhecimento artístico: é a celebração de uma cinematografia que resiste, se reinventa e conquista o mundo.

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