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O “adulador de Lula” conhece ex-presidente e continua a adulação

Agricultor do Ceará que viralizou no WhatsApp como “adulador de Lula” realiza em Natal sonho de conhecer ex-presidente

Foto: Whats AppO adulador e Lula
O adulador e Lula

saibamais - O chinelo de dedo que Pedro Félix calçava quando criança era o mesmo do irmão mais novo. Por falta de dinheiro, o revezamento era regra na família. Se pela manhã o privilégio de andar calçado era de um, à tarde a prioridade era do outro.

Geralmente, o garoto mentia quando andava os 2 quilômetros a pé de Lavras de Mangabeira, distante 460 km de Fortaleza, até a cidade ou povoado mais próximo. Quando um adulto perguntava porque um dos dois estava descalço, para não assumir a pobreza Pedro inventava que era promessa do pai, Chico de Dezin, que pedia a um dos filhos para ir de um canto a outro descalço por uma certa graça alcançada.

Hoje, aos 48 anos de idade, Pedro lembra daquele tempo com alívio. E agradece a um homem nordestino, de origem pobre como ele, as oportunidades que lhe ajudaram a dar uma guinada na vida:

– Lá em casa quando meu pai comprava alguma coisa era sempre para dois. Um par de chinelo era para mim e meu irmão. Eu usava de manhã até meio-dia e ele usava à tarde. A rede também era para os dois. Na hora de dormir, eu deitava até meia-noite e de meia-noite até de manhã era ele quem dormia enquanto eu deitava no chão. Podem dizer que o mundo tem 3 milhões de anos, mas eu digo que, para mim, o mundo é de Lula para cá. Porque antes, para nós, era só sofrimento”, diz.

O carinho pelo ex-presidente Lula é tamanho que hoje o agricultor e pedreiro Pedro Félix é conhecido nacionalmente como “O Adulador de Lula”. Isso porque, embora o rosto dele ainda seja pouco conhecido, a voz ganhou o Brasil durante perseguição política e a injusta prisão do líder do Partido dos Trabalhadores.

Um dia, em casa, Pedro gravou despretensiosamente alguns áudios no WhatsApp falando do amor e gratidão que tem por Lula e imaginando o que faria pelo ex-presidente quando ele saísse da prisão. Tímido, se trancava no banheiro com vergonha até da esposa Ciça na hora de distribuir as mensagens. Jogou os áudios em grupos do aplicativo e logo se espantou com a reação das pessoas:

– Eu gravei sem imaginar nada, botei em três ou quatro grupos onde me colocaram e comecei a receber muitas mensagens dizendo kkkkkk e com palavras de incentivo. Aí falei: “tem coisa nesses áudios”. E virou o que virou. A coisa mais bonita que eu acho é quando eu ando na rua e falam: “lá vai o Adulador de Lula”. Isso me deixa nas nuvens. Eu só não digo que Lula me deu a vida porque minha vida mesmo quem me deu foi Jesus e meu pai, mas foi Lula quem me criou porque me deu oportunidade. Quando perguntam se sou fã de Lula, eu digo que não, eu sou mesmo é devoto”.

Num dos áudios que viralizaram, Pedro conta que numa consulta médica de rotina, o doutor perguntou se ele tinha algum plano. O médico se referia, claro, a um plano de saúde privado. Mas o agricultou aproveitou para adular o presidente:

– Tenho, doutor. Meu plano é botar Lula na presidência e voltar a comer picanha de manhã até meio-dia e de meio dia para a tarde comer picanha de novo”, diz rindo, lembrando o episódio.

Rede de adulação

Os áudios de Pedro já foram parar na abertura do programa eleitoral do então candidato à presidência Fernando Haddad, em 2018. E são usados por pessoas que ele nem conhece. Algumas, inclusive, ganham dinheiro se passando por ele. O agricultor, no entanto, prefere se apegar ao que as mensagens trazem de bom:

– Por conta dos meus áudios tem muito mais gente adulando Lula hoje. E a gente vai criando uma corrente”, diz.

Pedro Félix realizou na quinta-feira (16) o sonho de conhecer o ex-presidente, que cumpriu agenda de pré-campanha em Natal, onde visitou a 1ª Feira de Agricultura Familiar e Economia Solidária, almoçou com os 9 governadores do Nordeste e participou de um ato político no estacionamento da Arena das Dunas.

“Meu sonho é embalar Lula até o punho da rede mudar de cor”

A ponte entre o adulador e a equipe de Lula foi feita por assessores da governadora Fátima Bezerra. De Lavras de Mangabeira até Natal foram 8 horas de viagem de carro na companhia da mulher e do filho. A poucos instantes do encontro, as mãos inquietas e os olhos marejados entregavam ansiedade e um certo nervosismo:

– Meu deus do céu, não sei nem o que vou dizer na hora. Meu sonho é embalar Lula até o punho da rede mudar de cor e dar água de coco na chuquinha para ele, como a gente faz com menino novo”, sonha.

Para quem tem dificuldade de imaginar porquê Pedro agradece tanto a um único homem o fato da vida dele e da família ter melhorado, uma sucessão de histórias vão surgindo durante a entrevista concedida à agência SAIBA MAIS um dia antes do aguardado encontro. Numa delas, lembra outra passagem com o irmão. Quando pequenos, a única forma de ver televisão em Lavras era escondido através da brecha na parede da casa dos vizinhos:

– Era na época de He-man, Caverna do Dragão… cansei de assistir pelas brechas das portas, o povo trancado com uma televisãozinha preto e branco. Os caras que estavam lá dentro não abriam para a gente ver e ainda cuspiam nos nossos olhos pelas brechas. Quando Lula chegou à presidência e a vida da gente melhorou, comprei uma TV de 40 polegadas lá para casa, botei uma no quarto do meu filho e ainda comprei outra para botar na sala”.

O que para a elite brasileira é tratado apenas por “estímulo ao consumo”, Pedro enxergava a oportunidade como uma vitória pessoal, uma espécie de acerto de contas com o destino.

Para o agricultor, a diferença de Lula para os antecessores do passado e os adversários do presente é que ele não deu nada a ninguém, além de oportunidade. E usa como exemplo mais uma vez a própria vida para mostrar as transformações que o governo petista provocou na vida dos mais pobres:

“Antes de Lula eu morava de favor num terreno do vizinho. Minha casa não tinha banheiro, era de tijolo, mas um tijolo de qualidade bem ruim, a casa não tinha reboco. O chão da minha casa não sustentava uma cadeira de tão fraco”, recorda.

Dali para a frente, com Lula na presidência, tudo o que Pedro conquistou foi fruto do próprio trabalho:

– Tem uma coisa que nunca esqueço na vida. Uma vez eu vi um cunhado comprando uma moto e pensei: “eu nunca vou conseguir comprar uma moto dessa”. E quando Lula assumiu eu consegui comprar uma moto do ano, à vista. Comprei um Siena do ano à vista… com o meu trabalho, entendeu ? Comprei dois carros de uma vez só, fiz duas casas, uma de primeiro andar. Consegui comprar o que eu quis. Fui para restaurante, comi a melhor comida. Tudo por causa do meu trabalho, fruto da oportunidade que Lula me deu“, afirma.

Pedreiro virou construtor e chegou a ter mais de 30 funcionários

O incremento na construção civil, especialmente através do programa “Minha Casa, Minha Vida” foi fundamental para a ascensão profissional e pessoal dele e de milhares de outros Pedros. Nos tempos das vacas gordas, o pedreiro que virou construtor chegou a ter mais de 30 funcionários trabalhando para ele:

– A construção civil é a mola desse Brasil. Na época de Lula eu trabalhava na roça, um serviço muito melindroso, não tinha muita oportunidade. Quando Lula foi presidente aprendi a trabalhar de pedreiro porque ele expandiu esse setor. E começou a ter obra na minha cidade, principalmente pela Caixa Econômica. Fui fazer casa em Fortaleza, Maracanaú, Caucária, Xorozinho, Crato, Juazeiro do Norte… comprei carro, moto, televisão, eu construí casa para mim… e digo a você: o que eu construí na época de Lula agora eu tô vendendo e não tem quem compre”.

A casa que construiu em Lavras de Mangabeira tem o alpendre em formato de L. Advinha por qual motivo ?

– Por causa de Lula, claro. Fiz uma casa em L por causa de Lula, arrodeei de pé de coco, goiaba, laranja. Chegou a época e não estava pegando. Eu botava estrume, adubo… um dia resolvi botar uma foto de Lula em cima do pé de goiaba e agora dá que nem presta”, conta, jurando que a história é verídica e ganhando a confirmação da companheira.

Pergunto se a esposa Ciça não tem ciúme de tanto amor e devoção. Ela ri e balança a cabeça negativamente. Mas e de Janja ? O que o adulador de Lula acha da esposa do ex-presidente ?

– Ciúme não, mas raiva eu tenho do povo que acha que Lula não dá conta da mulher por ser mais nova. Eu tenho raiva de quem duvida de Lula”, afirma.

Pedro fala pouco de Bolsonaro e prefere apontar as esperanças e o turbilhão de sentimentos na direção do homem que ele já considerou um pai e que, agora, acredita que voltará diferente:

– No tempo em que ele passou na presidência, Lula foi nosso pai e agora será o nosso avô, que é pai duas vezes. Ele está mais maduro, forte. Ele vai ajudar a gente de uma forma que não tem medida não. Tenho certeza de que vai ser igual ou melhor que antes: vamos comer carne de desbotar os dentes, comer picanha de novo”, encerra.

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