Aécio, políticos mal-intencionados, algoritmos, big techs e esfera pública e o sistema cognitivo do ser humano
É muito mais que sobre Aécio

Por Luis Felipe Miguel, professor, no facebook
A história de Aécio
Quis o destino que a derrocada de Aécio Neves fosse tão grande que, hoje, não é mais senhor nem de seu prenome.
Pois a história, aqui, é de outro Aécio, hoje mais famoso que o ex-futuro presidente.
É Aécio Lúcio Costa Pereira, funcionário da Sabesp - e primeiro golpista condenado pelo 8 de janeiro.
Não era bem o que Romero Jucá estava pensando quando disse que “Aécio vai ser o primeiro a ser comido”. Mas quem lê Nostradamus sabe, profecias se realizam de maneira surpreendente.
Reportagem da Folha conta que Aécio era considerado um bom colega de trabalho.
De repente, começou a ficar esquisito. Ficava nervoso quando alguém não aceitava que a terra é plana. Ligava para as pessoas de madrugada, para avisar que Hillary Clinton é um holograma. Passou a acreditar que reptilianos dominavam o mundo.
Terminou, como sabemos, frequentando o acampamento bolsonarista na frente do QG do Exército em São Paulo e, de lá, indo para Brasília, invadir as sedes dos poderes e “salvar o Brasil”.
O que aconteceu com Aécio? Não sei a resposta, mas é muito improvável que ela não inclua uma palavra: YouTube.
Enquanto o WhatsApp é o canal para difundir as fake news de massa, é no YouTube que se dá a verdadeira formação intelectual do extremista.
Na busca pelo maior “engajamento”, na obsessão por manter os usuários conectados cada vez por mais horas (o que é uma obrigação assumida pelos executivos da Google), o conteúdo extremista é privilegiado.
No livro A máquina do caos, Max Fisher mostra como as mídias sociais, que tomam o “engajamento” como única métrica relevante, programam seus algoritmos de maneira que as teorias da conspiração ganhem destaque. Afinal, quem sabe que vacinas salvam vidas não gasta muito tempo pensando no assunto. Já um antivax tende a ver muitos vídeos, participar de muitos grupos sobre o tema, difundir a “verdade oculta” para todo mundo.
Ele narra o experimento feito por Guillaume Chaslot, que foi programador do YouTube:
"Quando ele procurou papa Francisco no YouTube, por exemplo, 10% dos vídeos que o site exibia eram de conspirações. Sobre aquecimento global, eram 15%. Mas o choque de verdade aconteceu quando Chaslot seguiu as recomendações algorítmicas do que assistir depois. Um número assustador - 85% - de vídeos recomendados sobre o papa Francisco era de conspirações, que afirmavam a identidade "real" do pontífice ou alegavam expor complôs satânicos no Vaticano. Quanto ao aquecimento global, o número era de 70%. E, em tópicos com poucas conspirações consagradas, era como se o sistema as inventasse."
Aécio foi abduzido pelo extremismo e por teorias da conspiração. Como milhões de pessoas no mundo todo.
É o resultsado da combinação entre agentes políticos mal-intencionados, algoritmos projetados apenas para garantir o lucro das empresas, o império das big techs sobre a esfera pública - e as falhas no sistema cognitivo do ser humano, que eles sabem explorar.
Agora Aécio está condenado a 17 anos de prisão.
E os mandantes, inspiradores e financiadores da intentona golpista à qual ele aderiu? E as grandes empresas de tecnologia que promoveram sua descida ao abismo na busca por lucros astronômicos, não importa as consequências?
Quando serão punidos?