Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

“Desigrejização” pela política

Foto: Montagem Pensar PiauíReligião e política
Religião e política

A política (partidária – uma "união voluntária de cidadãos com afinidades ideológicas e políticas, organizada e com disciplina, visando a disputa do poder político") é para todos – cristãos, ateístas e sem religião –, enquanto arte ou ciência de governar. Porém, nenhum texto bíblico diz que se um eleitor não votar em candidato defendido por padre ou pastor não é crente e deverá ser expulso da igreja.

Sem generalizar, por causa de um Deus ao averso e de falsos profetas mercenários, muitos fiéis carentes da Palavra Sagrada, que lhes confortem a dor pandêmica, o desemprego, a miséria, a fome, o desalento etc., estão abandonando, sutilmente, os templos religiosos que foram transformados em sedes partidárias.

Existe uma repulsa ao “comércio da fé pelo voto” e uma aversão aos discursos políticos de cunho maniqueísta - que divide o mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou Diabo -, oprime os fiéis e instrumentaliza os obreiros como cabo eleitoral e boca-de-urna. Trata-se de um processo de “desigrejização pela política” com constrangimentos, violência, mentiras e ódio, estimulando a guerra entre os irmãos em Jesus Cristo.

O processo de “desigrejização pela política” explora o princípio da fé utilizando os fiéis e os obreiros no papel de militantes partidários, inclusive em boca-de-urna, para metamorfosear os altares em palanques políticos, sem relativizarem os riscos implicados – p.ex. a descrença na Igreja, a perda de fiéis, o profano sobrepondo o sagrado, o uso das igrejas para conseguir votos, a fragmentação da religiosidade, a banalização de cultos e missas, a fusão entre cristianismo e partidarismo etc.

Assim, a laicização do Estado, ou o processo pelo qual a sociedade torna-se laica sem incentivos religiosos ou o pragmatismo natural das religiões, é suprimida pelo processo de “desigrejização pela política”, abrindo espaço para o que prever o texto sagrado: “Então, numerosos falsos profetas surgirão e enganarão a muitos” (Mateus 24:11).

Com o abuso do “poder religioso”, os falsos líderes espirituais fazem proselitismo político contra o Evangelho e dentro das igrejas, contribuindo para a perda da esperança, o aumento do desânimo e à adesão ao cinismo religioso do que para edificar a vida espiritual dos crentes, ou seja, promover a reflexão da espiritualidade, através de atitudes pautadas no amor de Jesus Cristo, tais como: a gratidão, o perdão, a oração e o diálogo permanente com Deus.

Assim, a crítica que se faz ao processo de “desigrejização pela política” deve servir de alerta sobre os riscos morais que correm as Igrejas ao estabelecerem uma relação promíscuas com a política – p.ex. o altar vira palanque –, pois aquelas serão niveladas por esta. E, nesse contexto, “se levantarão falsos cristos e falsos profetas e apresentarão grandes milagres e prodígios para, se possível, iludir até mesmo os eleitos” (Mateus 24:24).

Todavia, não se trata em dizer que a religião nada tem a ver com a ação política. Ao contrário, Religião e Política podem, sim, e deve ser discutidas sem substituir as verdades bíblicas pelo propósito do Estado e vice-versa. Pois, a intersecção dialógica entre ambas acontece "onde habita a justiça" e não ódio.

A fé cristã está para além do apetite de poder dos partidos políticos e o Estado é uma possibilidade de construirmos um país, cuja sociedade seja mais justa, igualitária, com equidade e respeito à pluralidade, independentemente de quem nos represente. Afinal, o povo é o poder e toda crença (ou descrença) é um direito subjetivo, inegociável no templo ou no altar.

Logo, deve-se reforçar a visão cristã de que o Estado não deve ser “cristão” e o seu papel não é defender ou promover uma determinada igreja ou religião ou seita. 

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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