Política

Trabalhador não pode fazer greve, opinar? Trabalhador deve se limitar a votar?

Greves em SP despertaram a ira da mídia e de políticos de direita.


Foto: Reprodução/jc24hGreve no Metrô de São Paulo
Greve no Metrô de São Paulo

 

Por Luis Felipe Miguel, professor, no facebook 

As greves de metroviários, ferroviários e de funcionários da empresa de saneamento de São Paulo, a Sabesp, despertaram a ira da mídia e de políticos de direita.

A Folha publicou um editorial com título eloquente: “Privatize-se”. Merval Pereira chamou de “irracional”. Tarcísio de Freitas, o bolsonarista que governa São Paulo, se disse indignado porque a greve “causa sofrimento”. E assim por diante.

Em comum, e de forma nada surpreendente, todos assinalam o pecado imperdoável: a greve era “política”.

É um discurso tão repetido que entrou no senso comum. Greves podem ser legítimas se têm motivação econômica. Se têm motivação política, são ilegítimas.

Por quê? Trabalhadores não podem fazer política, é isso? Votam a cada quatro anos e se calam o resto do tempo?

Os patrões fazem política o tempo todo. Pressionando governantes, ao definir suas prioridades de investimento, financiando campanhas, fazendo lobby, com lockdowns disfarçados, usando da corrupção.

Trabalhador não pode. Trabalhador deve se limitar a votar.

Além disso, as privatizações impactam fortemente os próprios empregados das empresas. Privatizações apontam para demissões, substituição dos trabalhadores por outros com salários mais baixos, jornadas mais longas, redução dos padrões de salubridade e segurança.

Mesmo no reduzido enquadramento que a direita aponta, a greve é legítima.

Privatizações também apontam para serviços voltados mais para o lucro do que para o atendimento à comunidade. Os trabalhadores não podem se voltar contra isso?

É como se a força de trabalho fosse completamente a mercadoria que ela se torna sob o capitalismo. Não pudesse pensar, não pudesse ter vontade, precisasse se submeter sem qualquer reação às decisões do patrão.

O direito de propriedade anularia qualquer outro direito.

Bernard Edelman escreveu que, para o direito burguês, o local de trabalho pertence ao patrão e os trabalhadores pertencem ao “trabalho” (isto é: ao patrão). É isso.

Pois eu tenho certeza de que os trabalhadores do Metrô, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos e da Sabesp são essas empresas e têm muito mais autoridade para discutir o destino delas que o bolsonarista carioca que governa São Paulo.

Por fim, não custa lembrar: toda greve é política.

Como escreveu há muitos anos André Gorz, mesmo as reivindicações trabalhistas aceitas em geral como sendo apenas econômicas, como aquelas por melhoria no salário ou nas condições de trabalho, implicam uma contestação política, pondo em xeque a ideologia do contrato (que legitima o poder do patrão sobre o empregado) e também o direito do proprietário à extração de mais-valor e ao controle sobre o processo de produção.

A destruição simbólica e material do sindicalismo foi o grande projeto da direita brasileira – unidas, aí, suas vertentes “limpinha” e bolsonarista, de Collor e Fernando Henrique a Temer e Bolsonaro.

Reconstruir o movimento sindical, dotá-lo de maior capacidade de iniciativa e de pressão, massificá-lo – eis um dos grandes desafios da esquerda.

As relações de trabalho mudam, o capitalismo se reinventa, mas uma coisa permanece: a exploração. E a necessidade de que os explorados se unam para combatê-la.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiauí.

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