Freitas Neto, Elba Ramalho e um jumento embriagado
Pode haver um imponderável na política

Trecho da crônica O imponderável na política, de Gaudêncio Torquato, publicada no blog do Noblat, Metrópoles
Começo contando o caso do jumento no Piaui. Eleições de 1986, comício de encerramento de Freitas Neto, do antigo PFL, na Praça do Marquês. Desde a manhã os carros de som convidavam o povo para o monumental show de Elba Ramalho. Às 18 horas, praça lotada, a massa urrava: “Queremos Elba, queremos Elba!”. Os caminhões com os equipamentos de som só chegaram em cima da hora do comício. Começou a cair um toró. Pipocos e faíscas. Os cabos, em curto-circuito, queimaram. Comício sem som? Elba mostrou o contrato: “Sem som não canto”. Sob insistente apelo do candidato, propôs cantar uma música. Arrumaram um banjo para acompanhá-la. Nem mesmo começara a cantar, passou a vociferar: “Imbecis, ignorantes, não façam isso”. No meio da multidão, a cena constrangedora: alguns bêbados abriam a boca de um jumento, derramando nela uma garrafa de cachaça. Sob apupos, acabava o comício.
As pesquisas nos davam, às vésperas do dia das eleições – em 15 de novembro de 1986 – entre 3% e 5% a mais que o adversário. Garantia do Instituto Gallup, por meio de Carlos Matheus, seu diretor, estabelecido em São Paulo. “Fiz e refiz”, dizia ele. Vibramos. No dia da eleição, senti em Teresina um clima de velório. Acompanhei Freitas Neto às urnas. Pouco aclamado. Perdemos a campanha por 1%. Concluí que um evento infeliz contribuiu para nossa derrota. Um showmício, que acabou sendo um caso de reversão de expectativas. O caso foi contado de boca a boca.
Às vezes, em minhas palestras, surge a pergunta:
– Professor, não pode haver um imponderável na política?
Respondo: Pode, sim. Por exemplo, um jumento embriagado no Piauí.
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