Política

#Emendas de corrupção : o bordão popular das ruas e das redes para atuação dos políticos

No coração da engrenagem das emendas estava o senador Ciro Nogueira, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro


Reprodução #Emendas de corrupção : o bordão popular das ruas e das redes para atuação dos políticos
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Por trás do discurso técnico sobre a alocação de recursos públicos, uma engrenagem política se consolidou no Congresso Nacional — e ganhou musculatura após o impeachment de Dilma Rousseff. Nas ruas e nas redes, já virou um bordão popular: são as “emendas da corrupção”.

As emendas parlamentares nasceram com a Constituição Federal de 1988. A proposta era, em tese, nobre: permitir que deputados e senadores sugerissem o destino de uma parte do orçamento federal para atender às demandas locais. No entanto, o modelo original dava ao Executivo a palavra final sobre sua execução. Eram, portanto, não obrigatórias.

O ponto de virada veio em 2015, com a aprovação da Emenda Constitucional nº 86, parte da famosa “pauta-bomba” que ajudou a implodir a base do governo Dilma. A proposta — de autoria de Hélio Leite, hoje no União Brasil e aliado do bolsonarismo — obrigou a execução das emendas individuais. Foi um presente ao Congresso, que, a partir dali, passou a controlar diretamente bilhões do orçamento público. A mudança, apoiada por forças como o então senador Aécio Neves, aprofundou o esvaziamento do Executivo e escancarou o caminho para o golpe parlamentar.

Sob Jair Bolsonaro, o processo foi aprofundado. Em 2019, o mesmo Hélio Leite apresentou uma nova PEC, convertida na Emenda Constitucional nº 100, que tornou obrigatórias também as emendas de bancada. Os recursos explodiram: mais de dez vezes o volume de 2015. PT, PSOL e PCdoB denunciaram o risco de corrupção e clientelismo. Bolsonaro, no entanto, sancionou tudo — e não vetou uma linha.

Nesse ambiente, nasceu o orçamento secreto. Por meio das chamadas “emendas de relator”, líderes do Congresso — longe dos olhos da população — passaram a distribuir bilhões sem qualquer critério técnico, sem transparência, sem fiscalização. Era o paraíso do toma-lá-dá-cá. E no coração dessa engrenagem estava o senador Ciro Nogueira, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro.

Para operar esse sistema, Bolsonaro escalou dois nomes-chave: Flávia Arruda, na Secretaria de Governo, e o próprio Ciro Nogueira, responsável direto pela negociação política com o Congresso. Segundo o ex-ministro Ricardo Berzoini, Ciro era o “operador político do orçamento secreto” — e, até hoje, não foi alvo de uma investigação profunda. “Espero que ele me processe, porque aí eu vou provar o que estou dizendo”, desafiou Berzoini em entrevista à Revista Fórum, ao defender que se peça a quebra de sigilos bancários para apurar o esquema.

Berzoini denuncia ainda o uso das emendas para o que chama de "cashback" — quando parte dos recursos retorna, em esquemas ilícitos, a parlamentares e operadores. Casos como o de shows superfaturados, revelados pelo Ministério Público de São Paulo em 2024, com cachês até 78% acima do valor de mercado, são exemplos claros do uso distorcido dos recursos. "O Congresso virou uma holding, com gabinetes operando orçamentos próprios de até R$ 80 milhões por ano", afirmou.

O Supremo Tribunal Federal tentou pôr freios. Suspendeu a execução das emendas de relator por ausência de critérios públicos. A medida, porém, foi recebida com resistência por parte do centrão e da extrema direita, que passaram a mirar o STF — especialmente o ministro Flávio Dino, que recentemente convocou os presidentes da Câmara e do Senado para um debate sobre transparência nas emendas. Ambos recuaram.

Mais do que uma disputa orçamentária, a história das emendas parlamentares escancara um modelo de captura do Estado pelo Congresso. Um sistema que trocou a representação popular por redes de influência, favores, repasses e shows superfaturados. Um Congresso que, segundo Berzoini, deixou de legislar para negociar.

Se hoje o presidente Lula está cercado por “negociantes”, como também apontou o ex-ministro, é porque a estrutura montada desde 2015 — com a cumplicidade de setores do Legislativo e o apoio decisivo de Bolsonaro e Ciro Nogueira — institucionalizou o clientelismo com carimbo constitucional. Um retrato fiel de uma democracia sequestrada.

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