Arnaldo Eugênio

A mentira na política

Na política, o mentiroso é nocivo ao coletivo, pois, nivela a política à arte da trapaça


Reprodução/sebygarcia A mentira na política
A mentira na política

Por Arnaldo Eugênio, doutor em antropologia 

Analisar o contexto atual das eleições municipais no Brasil tem várias dificuldades, se constituindo numa tarefa demasiado complexa. Porém, é possível perceber, empiricamente, o fato de que a mentira se vincula à política pela imaginação. Segundo Millôr Fernandes, “o perigo de uma meia verdade é você dizer exatamente a metade que é mentira”.

A mentira é o ato ou efeito de mentir; engano, falsidade, fraude. Nesse sentido, em maior ou menor grau, todas as pessoas mentem, pois, a mentira é um ato condicionado e funciona como uma estratégia de preservação e de controle social. Mentir é um comportamento social, muitas vezes, necessário para a vida em sociedade, mas, também, pode esconder sérios distúrbios psíquicos.

O mentir é uma habilidade mental para persuadir, por meio da qual um indivíduo busca, intencionalmente, convencer outrem a acreditar naquilo que a própria pessoa sabe que é falso. Os motivos para mentir são múltiplos, cujo fim último é levar vantagens ou evitar perdas dentro de uma dinâmica egóica.

Segundo Hannah Arendt (2004), “o problema com a mentira e o engodo é que só são eficientes se o mentiroso e o impostor têm uma clara ideia da verdade que estão tentando esconder. Neste sentido, a verdade, mesmo que não prevaleça em público, possui uma primazia inerradicável sobre qualquer falsidade”. Isto é, a mentira não se sobrepõe, por muito tempo, à verdade. E todo mentiroso será, mais cedo ou mais tarde, desmascarado.

“Brincar de mentir” é saudável, desde que não ultrapasse os limites e acreditar no que não existe de verdade. Toda pessoa viciada em mentir esconde doenças psíquicas e distúrbios de caráter. A falta de caráter em um mentiroso é percebida quando, mesmo errando repetidamente com os outros, causando prejuízo a terceiros e ferindo sentimentos através de manipulações e mentiras, o indivíduo insiste no ato de mentir.

À luz da moral política arendtiana, a mentira se revelou, portanto, como um problema, além de político, moral. Para Alberto do Amaral (2020), a mentira na política é profundamente negativa, pois os seus efeitos são devastadores para as relações sociais no Brasil, e em qualquer parte do mundo: “o primeiro é levar ao erro, o segundo é o engano e o terceiro é a violência. A mentira contradiz os fatos e a contradição dos fatos tem como reação, por parte da população, a violência”.

Hoje, como alerta Mauro Iasi (2023), há “uma emergência espetacular da mentira como arma política, onde os meios digitais, algoritmos, redes sociais e plataformas, apenas potencializam a profundidade e a dimensão dos efeitos da falsificação dos fatos, inverdades e manipulações”.

No caso da política, o mentiroso é nocivo ao coletivo, pois, nivela a política à arte da trapaça. Onde tenta impregnar no senso comum que todo político, ou quem está na política, é, por princípio, um bandido e corrupto, que só pensa nele, fazendo tudo só para ele e por ele. Para tanto, usa da mentira com o intuito de desestabilizar o processo eleitoral e dissimular a própria falta de caráter.

Conforme Terry Eagleton (1997), “[...] a mentira é um componente de toda ideologia e não um simples fator contingente”. Isto é, mesmo expressando a materialidade real da qual parte, toda ideologia, enquanto uma forma de controle social, implica em inversão e falsificações.

Na política, o mentiroso se engana ao crê que só o poder econômico amarra os enganados. Quando "os estímulos para a ação são muito contrastantes", estes levam o povo à "imobilidade", à "irrequietude, isto é, descontentamento, insatisfação" (GRAMSCI, 2001).

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