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O suicídio de policiais

O suicídio de policiais

Arnaldo Eugênio, doutor em antropologia
No Brasil, os últimos episódios envolvendo a morte de policiais por suicídio tem gerado uma inquietação social, um mal estar institucional e faz surgirem muitos questionamentos, tais como: Por que policiais cometem suicídio? Quem está imune ao suicídio? O suicídio é o mal do século XXI? Quais os fatores que dinamizam o estresse ocupacional da classe policial?
Antes, cabe fazer uma advertência relevante sobre a percepção social equivocada de que somente as pessoas que estão sofrendo com algum transtorno mental – p.ex. depressão, vícios e/ou dependência química, como alcoolismo – irão cometer o suicídio nem tão pouco que este seja o mal do século XXI.
Na verdade, os fatores sociais que podem levar alguém a cometer suicídio são múltiplos. Sabe-se, empiricamente, que, no Brasil, a cada 40 segundos, uma pessoa comete suicídio. Em média, 25 pessoas dão fim à própria vida por dia, enquanto outras 20 tentaram sem sucesso. E nenhuma pessoa está imune ao suicídio, independentemente de qualquer condição social nem é um ato de covardia. O suicídio é um sintoma de uma sociedade doente, que se recusa a recolher sua patologia, a tratar e a falar abertamente sobre o problema.
Possivelmente, entre os policiais seja o estresse da profissão associado a outros aspectos psicossociais que resulta numa série de situações positivas e negativas, que pode está levando-os ao suicídio. De acordo com o sociólogo clássico Émile Durkheim (1858-1917), o suicídio é um ato pessoal de quem está pensando em coisas positivas ou negativas, executado pela própria vítima por múltiplas causas. Por isso, não devemos julgar o policial que cometeu suicídio, pois era um profissional que precisava de ajuda das pessoas ao seu redor e não de culpabilização, já que ninguém é capaz de sobreviver sozinho em sociedade.
Todo ato de suicídio – não somente de policial –, direta ou indiretamente, é produto de um ato positivo ou negativo de caráter multicausal e pluridimensional. Mas, passivo de prevenção e controle social. Por exemplo, quando as corporações oferecem apoio psicossocial na formação inicial e continuada para os policiais. No Brasil, as corporações policiais têm nas suas estruturas institucionais setores responsáveis pelo apoio psicossocial para os policiais, mas não consegue manter uma periodicidade e frequência de tratamento daqueles.
Um dos problemas é que existe, por um lado, um baixo nível de profissionalização das policiais, deixando a maioria dos seus membros expostos ao estresse funcional. E, por outro, os policiais – e não somente estes profissionais – não recebem formação inicial e continuada para identificar os sintomas clínicos do estresse nem fazem exames psicossociais semestrais.
Há quem diga que vestir a farda faz com que eles se sintam super-heróis e não queiram externar seus problemas. Porém, essa visão romantizada de ser ou de se sentir um super-herói da sociedade é equivocada e, de certa forma, é uma manipulação política para estimular o policial a ignorar as más condições de trabalho. Além disso, um homem ou mulher, antes de ser policial, é uma pessoa comum da sociedade, logo passível de doenças, morte, sofrimentos, indignações, etc. Portanto, o policial não é mais nem menos humano do que o cidadão comum, mas vive no limite.
Assim, é fundamental a sociedade (e as corporações policiais) se abrir para o debate e a compreensão das causas do suicídio, enquanto um produto do processo social perpassado por fatores sociais que agem sobre os indivíduos e a coletividade – uma doença social.

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