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As balas paramilitares que atingiram Cid Gomes

O episódio levanta dúvidas se há em curso, nos bastidores, uma grande articulação nacional no sentido de apoiar Bolsonaro

Foto: google imagensSenador Ciro Gomes sofre tentativa de homicídio
Senador Ciro Gomes sofre tentativa de homicídio

O episódio no qual o senador Cid Gomes (PDT-CE) levou dois tiros – uma bala saiu pela clavícula, a outra atingiu o pulmão esquerdo –, em Sobral (CE), disparados por policiais grevistas, encapuzados e amotinados num quartel da Polícia Militar (PM), mostra que há um sentimento preocupante ganhando força nas polícias. E não tem a ver com o respeito às instituições, ao estado democrático de direito, à sociedade à qual deveriam defender. Não se trata, evidentemente, de uma questão trabalhista, greve por melhores salários. Há algo por trás.

Claro, há neste caso uma insatisfação salarial e com as condições de trabalho, porém, o incidente do final da tarde desta quarta-feira (19-2) serve de alerta para o cenário de tensão e conflito político que está sendo armado no País. Parte do núcleo duro do bolsonarismo – os tais 10% ou 15% que apoiam o presidente Jair Bolsonaro em qualquer circunstância, tendo ele feito ou não alguma coisa, por pior que seja –, esse segmento traz apreensão por suas inspirações antidemocráticas, estar muito armado e disseminado em todo o País.

Cid Gomes agiu de forma intempestiva, bem ao seu estilo, ao pilotar uma retroescavadeira em direção ao piquete formado pelos policiais junto ao portão do quartel, mas foi desproporcional a reação dos militares, ao tentar matar um senador da República, sob o manto da impunidade garantido por máscaras, capacetes e capuzes. Como observou a jornalista Eliane Cantanhêde, foram tiros para matar, e por pura sorte não conseguiram. Afinal, o parlamentar foi alvo não apenas de dois disparos, mas um verdadeiro tiroteio.

Violência potencial política

As informações de que o comércio, em várias cidades do Ceará, foi obrigado pelos grevistas a fechar suas portas, entre outras situações problemáticas, teriam motivado o gesto de Cid Gomes. Mas o que chama a atenção, neste momento delicado da vida nacional, é a violência potencial usada como instrumento político, por parte de setores das forças policiais, insufladas constantentemente pelo clã Bolsonaro e seu discurso de ódio. São pessoas que exibem seu desprezo pela democracia, nas redes sociais ou em qualquer ambiente real.

Sob suspeita de manter relações com as milícias cariocas, formadas basicamente por policiais militares, a família Bolsonaro tem um longo histórico de condecorações a oficiais milicianos e muitos supostos negócios com essas organizações paramilitares. É lógico, se formou uma grande identificação entre o clã e parte das categorias policiais, célebre por defender coisas, como golpe militar, fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), liberação total de armas, tortura, perseguição dos inimigos, etc.

Isso talvez explique um pouco do que levou ao atentado contra o senador cearense, irmão do ex-ministro e ex-governador Ciro Gomes, um dos mais contundentes opositores de Bolsonaro. O episódio levanta dúvidas se há em curso, nos bastidores, uma grande articulação nacional, por parte desses policiais, no sentido de apoiar o presidente, caso as respectivas condições de governabilidade estejam completamente perdidas. Corre-se o risco de haver um golpe – ou autogolpe – paramilitar no Brasil, a exemplo do que aconteceu na Bolívia?

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