Pensar Piauí

A direita brasileira não tem legitimidade democrática

O que ela tem é força política

Foto: ReproduçãoDireita não legítima
Direita não legítima

Por Luis Felipe Miguel, professor, no facebook 

Três notícias recentes:

1) A Câmara Municipal de São Paulo está montando uma CPI que tem como principal objetivo atazanar o padre Júlio Lancellotti e atrapalhar seu trabalho assistencial com moradores de rua.

2) Tarcísio de Freitas conseguiu sustar, na justiça, a instalação de câmeras nos uniformes dos policiais paulistas.

3) A lei “Não é não”, para combater o assédio e a violência sexual contra mulheres em eventos públicos, ganhou um artigo que diz que ela “não se aplica a cultos nem a outros eventos realizados em locais de natureza religiosa”.

Lancellotti incomoda porque ajuda os pobres e afirma a dignidade deles, em vez de escorraçá-los.

Incomoda também porque demonstra que é possível simultaneamente ser cristão e exercer o amor ao próximo. Como é que Malafaia ou o padre Genésio suportam isso?

(Genésio é aquele que pediu a excomunhão dos eleitores de Lula. O outro é um mala feio.)

Dar comida a quem tem fome. Realmente, o tipo de atitude que precisa ser investigada por uma CPI.

Os dados mostram que as câmeras reduzem em 75% a letalidade policial. Inibem a ação dos maus policiais e protegem os bons.

Tarcísio disse: “Qual a efetividade da câmera corporal na segurança do cidadão? Nenhuma”. É que para ele o pobre, o preto, o periférico, isto é, as vítimas preferenciais da polícia, não são cidadãos.

Se o objetivo é matá-los, as câmeras são mesmo um estorvo.

Não há outra justificativa que explique o esforço para interromper uma política tão simples, barata (custa menos de 0,5% do orçamento das polícias de São Paulo) e eficiente.

Assim como não há justificativa para que nas igrejas as mulheres não sejam protegidas de seus agressores. A não ser que os agressores desejem impunidade.

Não se trata de uma lei prevendo igualdade de gênero – um tabu para os religiosos conservadores. É para combater assédio e violência sexual.

Outro dia, Wilson Gomes, o colunista liberal da Folha de S. Paulo, escreveu que a esquerda precisa “aceitar de uma vez por todas que os conservadores não apenas representam interesses legítimos presentes em sociedades pluralistas, como também possuem uma legitimidade democrática tão válida quanto a de qualquer outra posição política. Se na democracia, há lugar para a esquerda e para progressistas, tem de haver lugar também para a direita e para conservadores. É simples assim.”

Muita gente à esquerda torce o nariz pro Wilson. Eu, ao contrário, acho que ele é um bom interlocutor, mesmo quando discordo dele.

Como é o caso agora. Seu argumento talvez seja válido em abstrato, na Noruega ou na Finlândia – ou era, no passado, porque a extrema-direita tem avançado por lá também.

No Brasil, temos uma direita absolutamente troglodita, que defende a violência e a discriminação.

Quem é a voz conservadora, no Brasil de hoje, que se diferencia de Bolsonaro e de Tarcísio, de Malafaia e Edir Macedo, de Zambelli e Kataguiri?

Será que a perseguição contra quem auxilia os mais pobres, a defesa da brutalidade policial, o racismo e a promoção da violência de gênero contam como “interesses legítimos presentes em sociedades pluralistas”?

Não, a direita brasileira não tem legitimidade democrática. Pode ter força política, mas legitimidade democrática não tem. É simples assim.

E a esquerda? Covarde. O presidente Lula preferiu não vetar o artigo que, desfigurando a lei proposta pela deputada Maria do Rosário, dá às igrejas imunidade para ignorar a violência contra as mulheres.

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