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Economista

Acilino Madeira

Economista

Tributar grandes fortunas já que o mercado não distribui renda e nem riqueza

Foto: PSB

Taxar grandes fortunas

 

A crise financeira internacional de 2008 e, na sequência, a pandemia do Covid-19, muito serviram para desmistificar o que a ortodoxia econômica vinha defendendo com ardor desde os primeiros anos do pós-guerra, ou seja, a primazia do mercado.

Significa dizer que o mercado é capaz de se autorregular e, portanto, tudo nele se fortalece, como deseja Paulo Guedes. As forças do mercado buscam e conseguem, por exemplo, o equilíbrio de preços e salários, no mínimo. Não obstante, mesmo os países de capitalismo liberal e de concertação social liderados por anglo-saxônicos e germânicos, respectivamente, têm visto nos últimos anos o crescimento dos gastos sociais. Pelo lado do aumento da despesa pública é possível a constatação da importância do papel do Estado nas sociedades contemporâneas, cujas economias são mistas ou de mercado.

Por outro lado, tomando de empréstimo uma assertiva institucionalista, o mercado não distribui renda e nem riqueza. A tradução da questão pela teoria econômica das instituições se dá pela negação de que os comportamentos dos indivíduos e das dinâmicas dos espaços econômicos sejam apenas o resultado de uma lógica de cálculo e de racionalidade, como diz o economista português José Reis. Infelizmente, a concepção de que as instituições contam porque estão diretamente vinculadas a culturas, sistemas de valores, crenças e regras ainda não conseguiu uma posição de destaque no debate com os teóricos econômicos neoclássicos.

Talvez pela debilidade da ciência econômica em não ter avançado na construção de uma economia política do Estado. Porém, não se queira com isso dizer que os velhos e novos institucionalistas não tenha incomodado o mainstream da ciência econômica. Não menos verdade é que os economistas institucionalistas, desde Thorstein Veblen, Ronald Coase até Douglass North, sempre estiveram ligados à economia do desenvolvimento do capitalismo.

O fato de que a ciência vive para a superação é uma realidade expressa há muito tempo por Max Weber. Por isso, o livro “O Capital no Século XXI”, do economista francês Thomas Piketty, tem sido alvo de críticas e ataques também pelo mainstream econômico. Trata-se de uma narrativa do desenvolvimento do capitalismo desde a metade do século XIX até os dias atuais. É também um manifesto de defesa da social democracia europeia continental onde o Estado costuma ser grande pela provisão dos bens públicos e dos serviços e seguros sociais básicos. Nela existe a ação efetiva de intervenção no setor público quanto à afetação tributária como instrumento impeditivo da concentração em excesso da renda e da riqueza.

O autor relaciona duas variáveis, uma microeconômica e outra macroeconômica, para defender a tese sobre o avanço da desigualdade nas sociedades contemporâneas, ou a de que, a desigualdade é a relação r>g, sendo “r” a renda sobre o capital e “g” o crescimento econômico.

A teoria da poupança que assegura que as pessoas poupam enquanto trabalham para consumir na velhice (Franco Modigliani) foi contestada por Thomas Piketty quando o mesmo afirma que “a partir de certo nível de riqueza, a renda gerada pelo capital é tão elevada que é possível consumir, acumular e legar para os herdeiros mais do que se recebeu”. O autor propõe a tributação das grandes fortunas ou dos mais ricos (1%) para a redução das desigualdades. Isto causou mal estar na ortodoxia que vê nesse normativo tributário a proposição de um confisco de fortunas.

O Brasil não disponibilizou nenhuma base tributária de dados para Piketty e seus colaboradores no âmbito da tributação da renda (as famosas declarações de renda de pessoas físicas e jurídicas). Entretanto, estudos recentes sobre a tributação dos ganhos de capital no Brasil, em sede do IRPF, elucidam que a mesma contribui com menos de 1% na formação da base de cálculo do imposto. Esta parte do imposto é gravada nas operações de renda variável realizadas em bolsa de valores.

Tal fenômeno fiscal contribui para que o nosso Brasil seja um campeão das desigualdades econômicas e sociais. A expressão r>g é facilmente verificável e constatável na economia brasileira desde a emancipação política do país.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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