O Brasil Oficial tem negado a importância do Nordeste Real
Em 8 de outubro foi comemorado o dia do nordestino
Por Acilino Madeira, economista e colunista no Pensar Piauí
Muitos parabéns, mesmo com o passar da data, 08 de outubro, para todos os nordestinos e nordestinas e, um grande abraço a todos e todas brasileiras.
Eu como nordestino, Acilino Madeira, vivendo há muito tempo entre o Piauí (nascido) e a Paraíba (adotivo) tornei-me um economista por influência de um filho da Paraíba, notável doutor em ciência econômica: Celso Furtado (Pombal-PB). Assim também como me fiz poeta e compositor tocado pela sensibilidade de dois mestres da literatura nacional e portuguesa. O primeiro piauiense, Torquato Neto, e o segundo paraibano, Ariano Suassuna, que por sua vez muito bem se dividiu entre as Capitanias de Artes e Verdades da Paraíba e de Pernambuco. Ariano nunca escondeu as suas predileções pelo Nordeste brasileiro, região que defendeu com toda a força d sua alma. E assim o faço também.
O Brasil são dois brasis: o real e o oficial. O Nordeste também são dois, um da realidade outro da oficialidade. Na verdade, economicamente, sempre falamos do boi em cima do couro; pois, dos grandes interpretes do Brasil, dois deles nasceram para se cobrirem com o manto nordestino, um nascido em Pernambuco e o outro em São Paulo, mas de pai também pernambucano, respectivamente Gilberto Freyre (Casa Grande e Senzala) e Sergio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil). Caio Prado Junior, também nascido em São Paulo, forma a trempe, com a obra Formação do Brasil Contemporâneo.
Nos últimos tempos, o Brasil Oficial tem negado a importância do Nordeste Real tanto na formação como na integração e desenvolvimento econômico nacional. Porém, economicamente, é matéria fácil de ser contestada, haja vista que nós nordestinos temos estudos fartos a respeito da importância da região para o país: “Formação Econômica do Brasil” (Celso Furtado, 1958/1959), um clássico.
Economicamente, também o Nordeste fundou o Brasil, em seu primeiro Ciclo econômico: Ciclo da Cultura Canavieira, a partir do Ciclo da Mineração a economia brasileira foi fincando as suas bases fora do Nordeste, até montar e desenvolver plantas (pré) industriais nas regiões Sudeste e Sul com maior força, em sede do desenvolvimentismo, em novos modelos de acumulação. Neste sentido, o Nordeste perdeu importância econômica sim, mas não a sua importância social, politica e cultural.
Fundamos o Brasil, criamos a grande Escola de Direito do Recife e criamos também o moderno romance brasileiro pela obra “Menino de Engenho” de José Lins do Rego (Paraíba) publicado em 1932. Sempre estivemos presentes na história geral e econômica nacional.
E as novas tendências e perspectivas econômicas trazem para o Nordeste a realidade de fatos relevantes. A produção de energias renováveis transformará o Nordeste novamente em novo motor da economia nacional. A produção de energia solar, eólica e de hidrogênio verde no Nordeste corresponderá o elemento central na transição para uma economia mais sustentável e limpa no Brasil.
Se não bastar estes argumentos econômicos em defesa da importância do ser NORDESTINO/NORDESTINA, proponho uma imersão dos internautas na poesia de Ivanildo Vilanova e Bráulio Tavares (Paraíba): Ouça a música "Nordeste Independente" - Elba Ramalho.
Nordeste Independente ou Imagine o Brasil (1984)
“Já que existe no Sul esse conceito
Que o Nordeste é ruim, seco e ingrato
Já que existe a separação de fato
É preciso torná-la de direito
Quando um dia qualquer isso for feito
Todos dois vão lucrar imensamente
Começando uma vida diferente
De que a gente até hoje tem vivido
Imagine o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente
Dividindo a partir de Salvador
O nordeste seria outro país
Vigoroso, leal, rico e feliz
Sem dever a ninguém no exterior
Jangadeiro seria senador
O cassaco de roça era suplente
Cantador de viola o presidente
E o vaqueiro era o líder do partido
Imagine o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente
Em Recife o distrito industrial
O idioma ia ser nordestinense
A bandeira de renda cearense
“Asa Branca” era o hino nacional
O folheto era o símbolo oficial
A moeda, o tostão de antigamente
Conselheiro seria o inconfidente
Lampião, o herói inesquecido
Imagine o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente
O Brasil ia ter que importar
Do nordeste algodão, cana, caju
Carnaúba, laranja, babaçu
Abacaxi e o sal de cozinhar
O arroz, o agave do lugar
A cebola, o petróleo, o aguardente
O nordeste é autossuficiente
O seu lucro seria garantido
Imagine o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente
Se isso aí se tornar realidade
e alguém do Brasil nos visitar
neste nosso país vai encontrar
confiança, respeito e amizade
tem o pão repartido na metade
tem o prato na mesa, a cama quente:
brasileiro será irmão da gente
venha cá, que será bem recebido…
imagine o Brasil ser dividido
e o Nordeste ficar independente.
Eu não quero com isso que vocês
imaginem que eu tento ser grosseiro
pois se lembrem que o povo brasileiro
é amigo do povo português.
Se um dia a separação se fez
todos dois se respeitam no presente
se isso aí já deu certo antigamente
nesse exemplo concreto e conhecido,
imagine o Brasil ser dividido
e o Nordeste ficar independente.
Todo ano no Rio de Janeiro
chegam levas e levas de migrantes
são milhares de braços retirantes
que fabricam montanhas de dinheiro.
Pois que o Rio prossiga em seu roteiro
e o Nordeste não seja um afluente
que conduz mil riquezas na torrente
e nem mesmo no mapa é conhecido;
imagine o Brasil ser dividido
e o Nordeste ficar independente.
Se São Paulo é a tal ‘lomocotiva’
que conduz estes mais de cem milhões,
então deixe pra trás estes vagões
que lhe tornam a carga cansativa.
Eles vão ter a iniciativa:
ser puxados por boi, cavalo e gente.
Talvez andem bastante lentamente
mas seu rumo é seguro e conhecido.
Imagine o Brasil ser dividido
e o Nordeste ficar independente.
Se houver essa tal separação
através de um acordo ou de um tratado
o Brasil se verá desobrigado
de ampliar essa imensa região
e o Nordeste será uma nação
mais vistosa, mais rica e mais contente
sem ninguém que lhe humilhe e lhe sustente
sem um pai, um patrão ou um marido…
Imagine o Brasil ser dividido
e o Nordeste ficar independente.”
Compositores: Ivanildo Vilanova e Bráulio Tavares
Intérprete: Elba Ramalho
Álbum: Do jeito que a gente gosta (1984)
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