Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

O massacre do povo negro

Foto: DivulgaçãoManifestação
Manifestação

No Brasil, segundo o estudo “Pele Alvo: a Bala não Erra o Negro”, da Rede de Observatórios da Segurança do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESEC), somente em oito estados da federação, em 2022, 4.219 pessoas foram mortas pela polícia, sendo 2.700 (65,7%) consideradas negros (pretos ou pardos) pelas autoridades policiais. Os dados foram extraídos das estatísticas fornecidas pelas polícias - do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Bahia, Ceará, Piauí, Maranhão e Pará -, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI).

A Bahia ultrapassou o Rio de Janeiro como a “polícia mais letal contra os negros” no total de óbitos (1.465 contra 1.330). Nos outros estados, as proporções de mortes de negros entre aqueles com cor/etnia informada e percentuais de negros na população são: Pernambuco (89,7% e 65,1%, respectivamente), Rio de Janeiro (87% e 54,4%), Piauí (88,2% e 79,3%), Ceará (80,43% e 71,7%) e São Paulo (63,9% e 40,3%). O que demonstra o crescente nível da letalidade policial contra pessoas negras, em relação a 2021.

Considerando somente aqueles com cor/etnia informada (3.171 mortos), a proporção de negros é de 87,4%. Ou seja, trata-se de um massacre do povo negro, principalmente devido ao racismo estrutural, que permeia as relações sociais, institucionais e interpessoais no Brasil, reificando a anuência da sociedade em relação à violência praticada contra a população negra.

O “racismo estrutural é quando o preconceito e a discriminação racial estão consolidados na organização da sociedade, privilegiando determinada raça ou etnia em detrimento de outra” (Silvio Almeida, 2018). Em seu livro “Racismo estrutural”, Silvio Almeida classifica três concepções de racismo, que parte da relação entre racismo e subjetividade, Estado e economia: individualista, institucional e estrutural.

Em 2022, a polícia baiana foi a mais letal no país, com 1.465 mortos (1.183 tinham cor/etnia informada), sendo 1.121 negros, ou seja, 94,8% daqueles com cor/etnia informada, bem superior a parcela de negros na população baiana (80,8%); no Pará, 93,9% dos mortos com cor/etnia identificadas eram negros, enquanto o percentual de negros na população é de 80,5% (IBGE, 2022).

O racismo estrutural é explícito e está caracterizado pelo fato de que os negros são a grande parcela dos mortos pelas policias. Pois, tem muito mais negros entre os mortos pela polícia do que existe na população. E a violência contra os negros pode ser ainda maior se considerar a falta de transparência com o registro e a divulgação dos dados, revelando o lado obscuro do racismo estrutural, que impossibilita em tratá-lo com a devida atenção, por meio de políticas públicas intersetoriais.

Atrelado ao racismo estrutural e à anuência da sociedade, outros fatores que contribuem para a matança de negros no Brasil são: a impunidade, a formação policial inadequada e a marginalização da população pobre. O descaso com tais aspectos dificulta o estabelecimento de metas e indicadores para a redução da letalidade das forças policiais no país.

Portanto, não existem dúvidas em perceber que persiste uma “mentalidade policial” calcada numa estrutura violenta e racista, caracterizando-se como uma questão política e social. Além de uma questão de saúde pública, pois os assassinatos em ações policiais geram, também, vários prejuízos psicossociais aos membros das próprias corporações. Assim, urge debater e ressignificar as formações policiais, para que se pautem nos princípios da Cidadania e Dignidade Humana, através de cursos e práticas perpassadas pelas ações antirracistas.  

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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