Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

A consciência negra

Foto: Montagem pensarpiauiDia da Consciência Negra
Dia da Consciência Negra

Mesmo com a quimera do 13 de maio, quando a Lei Áurea foi assinada pela Princesa Isabel, visando a abolição da escravatura no Brasil, o conhecimento e o reconhecimento da cultura negra segue num processo de vaivém do pêndulo nos direitos sociais, civis e políticos. Esse movimento oscilatório se esquiva de colocar o “racismo estrutural” no centro de um debate nacional.

O Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro, sendo oficializado no calendário escolar em 2003, através da obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-Brasileira. Em 2011, um novo decreto a firmou também como Dia Nacional de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares e ícone da resistência negra no país, que morreu em 20 de novembro de 1695.

A celebração da data é justa e importante, embora sendo um único dia, que não faz jus à emergência da discussão sobre o “racismo estrutural”, para propor e implementar políticas públicas intersetoriais para a inclusão social da população negra no país. Pois, a legalização do fim da escravidão não impactou em uma melhoria na qualidade de vida, principalmente de trabalhadores rurais – p.ex. os direitos trabalhistas e acesso à educação.

De fato, o 20 de novembro é parte da onda de mudanças e transformações do movimento negro em busca de superar o processo de “coisificação da negritude” – que surgiu com a abolição – para visibilizar os sujeitos negros que fazem parte da sociedade e necessitam de políticas públicas”. A negritude se refere ao sentimento de orgulho da identidade negra e conscientização do valor e da riqueza cultural dos negros.

Nos últimos dez anos, dentre as recentes conquistas de direitos pela população negra no Brasil, destaca-se a política de cotas raciais (Lei nº 12.711/2012). Trata-se do acesso à universidade pública que mudou vidas, pois a Política de Cotas assegurou a inserção de jovens pretos, pardos e indígenas nos espaços acadêmicos. Com isso, foi possível garantir que 50% do total de vagas nas universidades e institutos federais fossem reservadas para estudantes que venham de escolas públicas.

Nesse contexto, celebrar o Dia Nacional da Consciência Negra e relembrar Zumbi é colocar a luta e a resistência no centro das discussões políticas, visando a desconstrução do racismo estrutural, que impede o fim da impunidade à matança de negros, a formação e o reconhecimento de um país diverso e igualitário para todos.

Não se deve esquecer que, no Brasil, em 2022, 4.219 pessoas foram mortas pela polícia, sendo 2.700 (65,7%) consideradas negros (pretos ou pardos) pelas autoridades policiais. Além disso, mesmo com a Lei 7.716/1989 (Lei de Crime Racial) que tipificou os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, a injúria continua tipificada apenas no Código Penal.

Outro agravante de gênero e sexista no Brasil, que perpassa a população negra, é que, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2023), 84,5% dos brasileiros e brasileiras têm algum tipo de preconceito contra as mulheres. São visões distorcidas e prejudiciais às mulheres que suscitam consequências “potencialmente criminosas”, inclusive servindo para legitimar atos de violência psicológica e à integridade física – p.ex. a execução da líder do Quilombo Pitanga dos Palmares, Maria Bernadete Pacífico (“mãe Bernadete), com 12 tiros, no município de Simões Filho-BA.

Portanto, vamos celebrar. Sem, no entanto, negligenciar que urgem ações para consolidar a consciência negra.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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