Motta e Alcolumbre fogem de debate sobre emendas após recado de Flávio Dino
Motta e Alcolumbre se inscreveram para defender emendas, mas argumentação de Dino no início da audiência pública expôs fragilidade dos argumentos e parlamentares enviaram advogados da Câmara e Senado

Fórum - Com os nomes inscritos para defender as emendas parlamentares em audiência pública realizada nesta sexta-feira (27) no Supremo Tribunal Federal (STF), os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), fugiram do debate após o ministro Flávio Dino abrir o evento mandando um claro recado aos congressistas, que reclamam de "interferência" do judiciário sobre assuntos do legislativo.
"O tema das emendas impositivas perpassa o governo da presidenta Dilma, do presidente Temer, Bolsonaro, do presidente Lula e do próximo presidente, seja quem for. Não estamos tratando de um tema de interesse de um governo", iniciou Dino, ao abrir os trabalhos no STF, que debate formas de dar transparência e evitar a proliferação de corrupção em nichos eleitorais a partir das emendas parlamentares impositivas - que o governo federal é obrigado a pagar.
Em claro recado, sobre quem estaria "usurpando" quem, o ministro afirmou que se não houver "emendas parlamentares ajustadas à sua finalidade", a "conta" será paga pelo povo.
"Temos um sistema constitucional a ser [debatido] ou modificado pelo Congresso, que pode fazê-lo a qualquer tempo, salvo em relação à forma federativa de Estado. Todos os outros elementos podem ser revogados pelo Congresso Nacional no momento que quiser. Se o Congresso Nacional quiser tirar a responsabilidade fiscal da Constituição, pode tirar. Se o Congresso quiser tirar o presidencialismo da Constituição, pode tirar. Assim como também pode desconstitucionalizar o devido processo legal orçamentário", afirmou.
"Mas, enquanto estiver na Constituição, não se cuida de uma invasão do Supremo, e, sim, de um dever. Se nós temos normas constitucionais que estão, aparentemente, em dissonância, a harmonização de tais normas é uma atividade tipicamente jurisdicional em todos os países do mundo [e] enquanto o Brasil for regime democrático. Portanto, não há nenhum intuito de usurpação de atribuições de outros Poderes", emendou Dino.
O discurso esvaziou os argumentos dos congressistas, que não querem que o STF, por meio de Flávio Dino, debata com a sociedade a regulamentação das emendas, que passaram a ser obrigatórias a partir de 2015, em meio ao golpe parlamentar contra Dilma Rousseff, e foram turbinadas com o orçamento secreto no governo Jair Bolsonaro (PL), quando também foram criadas as emendas de bancadas.
Em 2015, as emendas por deputado eram de R$ 16 milhões, quando o governo ainda não tinha obrigação de fazer o repasse.
Em 2025, cada deputado indicou R$ 37,3 milhões em emendas individuais, e cada senador, R$ 68,5 milhões. No caso das bancadas, cada estado receberá R$ 528,9 milhões este ano. E o governo é obrigado a executar esses valores.
Fuga
Diante da declaração de Dino, Alcolumbre e Motta vazaram para a mídia liberal - que faz parte do consórcio da Terceira Via - que enviariam os advogados-gerais das respectivas Casas legislativas, Gabrielle Tatith Pereira (Senado) e Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva (Câmara) para o debate com Dino.
No cronograma divulgado horas antes pelo STF, a exposição de 30 minutos de Motta estava prevista para acontecer às 12h30. Alcolumbre falaria pelo mesmo tempo em seguida, às 13h.
A partir das 13h30, o advogado-geral a União (AGU), ministro Jorge Messias vai fazer a exposição em nome do governo Lula.
Corrupção
Com Motta e Alcolumbre inscritos na audiência pública, a Polícia Federal (PF) desencadeou na manhã desta sexta-feira (27) uma operação que investiga um suposto esquema de corrupção estruturado sob emendas parlamentares enviadas pelo deputado federal Félix Mendonça (PDT-BA) aos prefeitos de Ibitanga, Humberto Raimundo Rodrigues de Oliveira (PT), e Boquira, Alan Machado (Podemos).
Alcolumbre e Motta se inscreveram para falar como representantes do legislativo na audiência pública para regulamentar as emendas parlamentares no Congresso. O objetivo era pressionar Dino sobre a obrigatoriedade dos recursos aos parlamentares, em especial sobre as chamadas "emendas Pix", estratégia criada durante o governo Jair Bolsonaro (PL) em que as verbas destinadas aos currais políticos omitiam o nome dos autores nas casas legislativas.
A audiência parte de um questionamento feito pelo PSOL e pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que afirmam que o crescimento exponencial das emendas parlamentares tem abastecido esquemas de corrupção e favorecimento próprio nas bases eleitorais dos parlamentares.
A investigação da PF sobre políticos de partidos da base do governo mostra que a ação contra corrupção com emendas não será tolerada. Na operação, denominada Overclean, a PF atua em conjunto com a Receita Federal (RF) e a Controladoria-Geral da União (CGU) sobre as suspeitas envolvendo o deputado, assessores e os prefeitos das cidades baianas.
"O núcleo investigado é suspeito de atuar na liberação de emendas parlamentares destinadas aos municípios baianos de Boquira, Ibipitanga e Paratinga, no período de 2021 a 2024, mediante pagamento de vantagem indevida, além de atuar na manipulação de procedimentos licitatórios. Os crimes apurados incluem integrar organização criminosa, corrupção ativa e passiva, peculato, fraude em licitações e contratos administrativos e lavagem de dinheiro", anunciou a PF.
Na operação, foram cumpridos "16 mandados de busca e apreensão e três ordens de afastamento cautelar de servidores públicos de suas funções, todos expedidos pelo Supremo Tribunal Federal".
Além dos dois prefeitos, o assessor do deputado, Marcelo Chaves Gomes, foi afastado do cargo. O ex-prefeito de Paratinga, Marcel José Carneiro de Carvalho, também foi alvo de buscas.
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