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Morre a economista Maria da Conceição Tavares, referência no pensamento desenvolvimentista

Economista teve um papel central no debate econômico ao longo das últimas décadas.


Reprodução Morre a economista Maria da Conceição Tavares, referência no pensamento desenvolvimentista
Maria da Conceição Tavares e o presidente Lula

Neste sábado, 8 de junho, o Brasil perdeu uma de suas maiores referências no campo da economia: Maria da Conceição Tavares. Aos 94 anos, a economista que se destacou por suas contribuições ao pensamento desenvolvimentista e por seu papel na formação de várias gerações de economistas brasileiros, deixou um legado imensurável.

Maria da Conceição Tavares nasceu em Anadia, em Aveiro, Portugal, e cresceu em Lisboa, filha de uma mãe católica e um pai anarquista que abrigava refugiados da Guerra Civil Espanhola durante a era Salazar. Iniciou sua formação em Engenharia na Universidade de Lisboa, mas logo se transferiu para Ciências Matemáticas, licenciando-se em 1953.

Em 1954, fugindo da ditadura salazarista, Conceição Tavares se mudou para o Brasil, onde iniciou sua carreira como estatística no Instituto Nacional de Imigração e Colonização (INIC). Naturalizou-se brasileira em 1957 e, nesse mesmo ano, matriculou-se no curso de Economia da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Contribuições e Influências

Sua carreira no Brasil foi marcada por importantes passagens pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pelo Grupo Executivo de Indústria Mecânica Pesada (Geimape). Trabalhou também na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), onde desenvolveu trabalhos influenciados por economistas como Celso Furtado, Caio Prado Jr., e Ignácio Rangel.

Entre suas obras mais importantes, destaca-se "Auge e Declínio do Processo de Substituição de Importações no Brasil", de 1972, que trouxe análises profundas sobre a economia brasileira e suas transformações.

Atuação Política e Acadêmica

Nos anos 1980, Maria da Conceição Tavares tornou-se uma das principais assessoras econômicas do PMDB e lecionava no Instituto de Economia da Unicamp, onde ajudou a implantar os cursos de mestrado e doutorado. Foi uma das vozes mais críticas do Plano Real na década de 1990 e se destacou como deputada federal pelo PT do Rio de Janeiro.

Em 1998, venceu o Prêmio Jabuti na categoria 'Economia', reconhecendo sua significativa contribuição ao pensamento econômico no Brasil.

Legado e Reconhecimento

Ao longo de sua carreira, Maria da Conceição Tavares formou e influenciou inúmeros economistas e líderes políticos, entre eles José Serra, Luciano Coutinho, e Luiz Gonzaga Belluzzo. Sua dedicação à justiça social e ao desenvolvimento econômico brasileiro foi uma constante em sua vida, e seu impacto será sentido por muitos anos.

A economista era também uma apaixonada torcedora do Vasco da Gama, e em 2018, sua vida e obra foram celebradas no documentário dirigido por José Mariani.

Sua morte representa uma grande perda para o Brasil, mas seu legado de luta, ensinamentos e contribuições à economia nacional continuará a inspirar futuras gerações de economistas.

Veja a Biografia dela 

Maria da Conceição de Almeida Tavares (nasceu em Anadia-Portugal em 24 de abril de 1930  foi uma economista, matemática e escritora luso-brasileira. Trabalhou na elaboração do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek e foi professora titular da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT), ela também foi deputada federal pelo estado do Rio de Janeiro entre 1995 e 1999, e é autora de diversos livros sobre desenvolvimento econômico.

Ela cresceu em Lisboa. Sua mãe era católica, e seu pai, um anarquista que abrigou refugiados da Guerra Civil Espanhola, em plena era Salazar.

Após iniciar o curso de Engenharia na Universidade de Lisboa, Maria transferiu-se para Ciências Matemáticas, licenciando-se em 1953. Para fugir da ditadura salazarista em Portugal, transferiu-se para o Brasil em fevereiro de 1954, já casada com seu primeiro marido, o engenheiro Pedro José Serra Soares, e grávida de sua filha Laura. Ela se estabeleceu com a família no Rio de Janeiro.

Quando chegou ao Brasil, ela começou a participar das atividades e debates promovidos pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Por não conseguir a equivalência de diplomas que lhe permitiria dar aulas em universidade, em 1955 começou a trabalhar como estatística no Instituto Nacional de Imigração e Colonização (INIC), atual Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

Em 1957, adotou a cidadania brasileira. Nessa época, depois de ter percebido que o conhecimento da matemática não era suficiente para o caminho profissional que pretendia seguir, matriculou-se, ainda em 1957, no curso de Economia da Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro. No ano seguinte, tornou-se Analista Matemática do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde trabalhou até 1960. Entre 1958 e 1960 ela foi também membro do Grupo Executivo de Indústria Mecânica Pesada (Geimape), um dos grupos executivos surgidos durante o governo do presidente Juscelino Kubitschek. Seu trabalho era ligado ao Conselho do Desenvolvimento, organismo central de planejamento subordinado diretamente à presidência da República, encarregado de elaborar e coordenar os programas setoriais definidos pela política econômica do governo.

Seu trabalho sofreu influência de três outros economistas brasileiros: Celso Furtado, Caio Prado Jr. e Ignácio Rangel, que a despertou para as questões relacionadas ao capital financeiro.

"Isso eu devo ao Ignácio Rangel, que chegou para mim e disse: "A esquerda tem a mania de não estudar essa coisa de moeda e finanças, e isso dá muito mau resultado." Eu disse: "Em finanças públicas tem gente." "Mas eu não estou falando disso, estou falando de bancos, balanços, essas coisas que vocês nem dão bola. Precisa estudar, precisa saber, porque a inflação..." E começou com as coisas dele sobre a inflação."

Maria da Conceição escreveu centenas de artigos e vários livros, destacando-se Auge e Declínio do Processo de Substituição de Importações no Brasil – Da Substituição de Importações ao Capitalismo Financeiro, de 1972. Dentre os textos que compõem esse livro o ensaio Além da estagnação, escrito com seu assistente José Serra, constatava, ao contrário do afirmado por Celso Furtado nos anos 1960, que era possível atingir elevado crescimento econômico, como demonstrara o Milagre Econômico brasileiro, embora com aumento ainda maior da concentração de renda. O livro foi escrito no fim dos anos 1960, quando chefiava o escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) no Brasil.

Em outubro de 1968, foi designada para o escritório da Cepal no Chile, onde também foi convidada a lecionar na Escolatina, ligada à Universidade do Chile. Sua presença no Chile nessa época evitou que fosse presa ou punida pelo AI-5, lançado em dezembro de 1968. Em outubro de 1971 licencia-se da Cepal para iniciar uma pós-graduação na Sorbonne em Paris. Com a piora da situação econômica, voltou ao Chile e passou a trabalhar, entre maio de 1972 e março de 1973, como assessora econômica voluntária do Ministro da Economia, Carlos Matus, no governo da Unidade Popular do Presidente Salvador Allende. Em fins de 1973, foi para a Universidade Autônoma do México como professora visitante, e trabalhou no escritório da Cepal daquele país durante o ano de 1974. Em novembro de 1974, quando se preparava para embarcar do Galeão para uma reunião em Santiago, foi detida e ficou alguns dias sequestrada pelos órgãos da repressão da Ditadura Militar. Ela foi liberada por intervenção direta do ministros Severo Gomes, da Indústria e Comércio, e Mário Henrique Simonsen, da Fazenda, junto ao Presidente Ernesto Geisel.

Nos anos 1980, Maria da Conceição Tavares era um dos principais nomes da assessoria econômica PMDB e lecionava no Instituto de Economia da Unicamp, onde ela ajudara a implantar os cursos de mestrado e doutorado do departamento. Dois dos seus colegas professores de economia na Unicamp, Luiz Gonzaga Belluzzo e João Manuel Cardoso de Mello, trabalharam no assessoramento do Ministro da Fazenda Dilson Funaro na elaboração do Plano Cruzado, programa do governo Sarney destinado a combater a hiperinflação da época com, entre outras coisas, a aplicação de congelamentos de preços. Embora a eclética equipe econômica contasse com nomes dos futuros elaboradores do Plano Real Pérsio Arida e André Lara Resende, que tendo assumido cargos na diretoria do Banco Central para auxiliar no Plano Cruzado e pertencerem a um departamento de economia como o da Puc-Rio, de tendência liberal e não desenvolvimentista como a Conceição Tavares, mas que não tiveram suas imagens nem a do seu departamento de economia associados ao Plano Cruzado por causa da emoção demonstrada por Maria da Conceição Tavares quando ocorreu o lançamento do plano, em março de 1986. Conceição Tavares emocionou-se e chorou em rede nacional por considerar que de partida o Plano Cruzado não era prejudicial aos assalariados e desfavorecidos da sociedade brasileira. Em entrevista de 2015, ela disse que se comoveu por ser o primeiro plano anti-inflacionário que não prejudicava o trabalhador; que "foi uma experiência amarga, depois, capotou tudo de maneira estrondosa". Pela presença pública conquistada na época, ganhou uma imitação no programa humorístico Escolinha do Professor Raimundo, interpretada por Nádia Maria.

Entre junho de 1993 e setembro de 2004 assinou a coluna Lições Contemporâneas para o jornal Folha de São Paulo. Inicialmente seus textos eram publicados a cada semana, mas depois passou dividir a coluna com seus colegas economistas, Aloizio Mercadante, Luciano Coutinho e Luiz Gonzaga Belluzzo.

Em artigo para a Folha de S.Paulo de 4 de setembro de 1994, criticou o Plano Real, ressaltando as perdas salariais ocasionadas pelos índices adotados para os reajustes dos salários e sobrevalorização cambial. Tendo sido eleita deputada federal pelo PT do Rio de Janeiro em 1994, se tornaria uma das críticas mais contundentes da orientação econômica do governo FHC. No ano de 1998, venceu o Prêmio Jabuti na categoria 'Economia'.

Em breve, mais matérias sobre a vida e obra da professora Maria da Conceição Tavares.

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