Oscar de Barros

Atenção, Banco do Brasil: “Agro” e agricultura familiar não são a mesma coisa

O "Agro" está cooptando todo mundo. Até o Banco do Brasil caiu na jogada deles


Reprodução Atenção, Banco do Brasil: “Agro” e agricultura familiar não são a mesma coisa
Quando o marketing confunde: Banco do Brasil embarca no discurso do “Agro” e apaga os pequenos produtores

O agronegócio brasileiro configura-se como uma atividade empresarial conduzida majoritariamente por grandes grupos econômicos. Voltado prioritariamente à exportação de commodities como soja, milho, algodão e carne bovina, o setor acumula lucros expressivos nas mãos de uma elite empresarial. No entanto, são os agricultores familiares — responsáveis pela maior parte dos alimentos que abastecem o mercado interno — os verdadeiros sustentáculos da segurança alimentar nacional.

Apesar disso, há anos o discurso dominante tenta igualar realidades que são completamente distintas. A agricultura familiar, baseada no trabalho direto do produtor e de sua família, possui características, necessidades e desafios profundamente diferentes daqueles enfrentados pelos grandes conglomerados do agronegócio. Esses últimos, com acesso privilegiado ao crédito, incentivos fiscais e apoio institucional, respondem por uma produção voltada quase exclusivamente à exportação, com baixa geração de empregos e pouco retorno social.

Com o passar do tempo, a imagem do agronegócio sofreu um desgaste significativo. As denúncias recorrentes de desmatamento, o uso intensivo de agrotóxicos, a grilagem de terras, a concentração fundiária e os benefícios fiscais desproporcionais contribuíram para associar o termo a práticas predatórias e pouco sustentáveis. Em reação a isso, os grandes empresários do setor passaram a investir de forma estratégica em comunicação e propaganda.

Foi nesse contexto que surgiu a campanha publicitária “O agro é pop, o agro é tech, o agro é tudo”, acompanhada de um amplo esforço de rebranding. De “agronegócio” — termo técnico e impessoal — passou-se à adoção da palavra “agro”, mais curta, simpática e de fácil assimilação. A campanha também se estendeu ao universo cultural, com o incentivo à música sertaneja que exalta a vida no campo, à moda rural estilizada e à romantização do ambiente agrícola. O objetivo era claro: reconstruir a imagem do setor junto à opinião pública.

Mais recentemente, o discurso do “agro” passou a incorporar deliberadamente a figura do pequeno produtor rural em seu marketing. Ao fazer isso, cria-se uma confusão proposital entre dois segmentos muito diferentes. Ao chamar todos de “agro”, a propaganda dissolve as fronteiras entre o latifundiário exportador e o agricultor familiar, atribuindo ao setor empresarial qualidades e funções que, na prática, são desempenhadas quase exclusivamente pelos pequenos produtores. Essa operação simbólica visa legitimar os grandes interesses econômicos sob o manto da produção popular e nacional.

Em meio a esse cenário, observa-se que o Banco do Brasil — tradicional financiador da agricultura nacional — tem veiculado novas campanhas publicitárias que reforçam essa narrativa. As propagandas recentes embarcam na lógica dos grandes empresários do agronegócio ao promover uma imagem homogênea do “agro”, sem distinguir os interesses do capital exportador daqueles da agricultura familiar. Tal postura surpreende por partir de uma instituição pública vinculada a um governo que se apresenta como popular. O Banco do Brasil, historicamente comprometido com o fortalecimento da agricultura de base, não deveria atuar como porta-voz da propaganda agroempresarial, sob pena de enfraquecer os compromissos sociais que orientam a sua razão de ser.

É preciso reforçar que o agronegócio voltado à exportação pouco contribui para a mesa da população brasileira. Ele não é responsável pelo arroz, feijão, frutas, legumes e hortaliças que chegam diariamente aos supermercados e feiras. Sua riqueza não se distribui; concentra-se. Seu impacto econômico é restrito a grandes proprietários de terra e exportadores. Enquanto isso, os agricultores familiares seguem enfrentando tributos pesados, escassez de crédito, falta de assistência técnica e políticas públicas enfraquecidas.

Portanto, embora o “agro” tenha conseguido remodelar sua imagem publicitária, a realidade segue desigual. O marketing pode tentar unificar o campo sob uma única marca, mas os números, as condições de trabalho e o papel social de cada segmento revelam verdades incompatíveis. O Brasil precisa olhar com mais atenção para quem, de fato, sustenta sua alimentação — e não se deixar enganar por slogans.


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