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Treze anos da Lei Maria da Penha: balanço e perspectivas

Treze anos da Lei Maria da Penha: balanço e perspectivas

Foto: GoogleLei Maria da Penha
Lei Maria da Penha

 Por Arnaldo Eugênio, doutor em Antropologia Em 2019, depois de treze anos de sua promulgação, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) tornou-se, no Brasil, um dispositivo legal para coibir a prática de violência doméstica contra a mulher, aumentando o rigor das punições para os autores de crimes. Trata-se, portanto, de um grande avanço na luta contra a violência de gênero, constatando que em mais de 80% dos casos, a violência é cometida por homens com quem as vítimas têm ou tiveram algum vínculo afetivo – o companheiro, cônjuge, namorado, ex-marido ou ex-namorado (Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República). Em 2016, a Lei Maria a Penha foi aperfeiçoada por uma proposição do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais, para que as promotorias do país também a aplique em casos de agressões a travestis e transexuais, independentemente de a vítima ter feito a cirurgia ou trocado de nome. Todavia, é fundamental não perder de vista que a luta pela igualdade de gênero vai muito além da própria legislação. Porém, é fato que, mesmo sendo considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) a terceira melhor lei do mundo no enfrentamento à violência contra a mulher, a Lei Maria a Penha ainda tem muitos desafios políticos, jurídicos e socioculturais para assegurar a sua efetividade no país. Por exemplo, não existem delegacias e varas especializadas em todos os municípios brasileiros – inibindo o registro de boletins de ocorrência e tomada de depoimentos das vítimas ou testemunhas; há os comportamentos machistas de alguns juízes e delegados – dificultando o cumprimento da lei; as tentativas de feminicídios aumentaram em 425% em relação a 2018. Por um lado, uma das virtudes da Lei Maria a Penha foi colocar a questão social da violência contra a mulher na pauta das discussões políticas, como ações criminosas e não banalidades da vida privada. Mas, por outro lado, ainda há muito a percorrer para que se alcance a legitimidade dentro de uma sociedade, socioculturalmente, estruturada no autoritarismo, na corrupção endêmica, na violência, no patriarcado e no machismo. Um dos caminhos possíveis para reverter, em parte, a violência contra a mulher no Brasil é estabelecer um pacto social pela desconstrução da supremacia masculina, em que a educação pela igualdade de gênero seja um tema transversal do ensino infantil à pós-graduação. Além da construção de delegacias com uma estrutura adequada para um atendimento qualificado às mulheres, através de uma rede de multiprofissionais capacitados com formação continuada sobre a dinâmica da violência, evitando a revitimização. E, principalmente, assegurar dotação orçamentária para a instalação de juizados e varas especializadas. Obviamente, que, nesses treze anos, a Lei Maria a Penha teve mais avanços do que retrocessos, mas a dinamicidade da violência contra a mulher na sociedade contemporânea exige um aperfeiçoamento constante dos mecanismos legais e socioculturais, para proteger as mulheres de possíveis agressores e fazer com que os homens ressignifiquem as suas relações com as mulheres, estabelecendo o diálogo como mediador de conflitos e não a força, a violência, a anulação, a morte. Na sociedade contemporânea, mesmo longe de um matriarcalismo, não existe mais a preponderância do homem na organização social ou um dever de obediência à imagem do homem dominante. Assim, urge romper com as relações humanas desiguais, autoritárias, hierarquizadas e violentas.

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