Quem é o grande centro de difusão de ideias da extrema-direita no Brasil?

Por Luis Felipe Miguel, professor, no facebook

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A produtora porto-alegrense Brasil Paralelo é hoje o grande centro de difusão de ideias da extrema-direita no Brasil.

Produz e importa muito material para propagar uma visão de mundo ultrarreacionária e, sobretudo, para recontar a história - do Brasil e do mundo - a partir de falsificações grosseiras.

Seu conteúdo é impulsionado por dinheiro grosso - é uma das maiores anunciantes das plataformas digitais no Brasil - e pelo algoritmo, que privilegia o “engajamento” proporcionado por extremismo e conspiracionismo.

É uma das responsáveis pela exibição do filme A voz do silêncio, sucesso construído à base de distribuição gratuita de ingressos. A pretensa cruzada contra a pedofilia serve para alimentar teorias da conspiração, reforçar valores conservadores e demonizar a esquerda.

É a Brasil Paralelo contribuindo com Damares, em sua busca por um pizzagate brasileiro.

(Pizzagate: a fantasiosa conspiração pedófila de apoiadores de Hillary Clinton no porão de uma pizzaria em Washington, que mobilizou e ainda mobiliza a extrema-direita estadunidense.)

O jornalista Pedro Doria publicou no Estadão um depoimento preocupante sobre a força da Brasil Paralelo.

“Faz parte do meu cotidiano viajar pelo país para dar palestras. Viajo por um Brasil que a maioria não conhece, mas que é um Brasil fundamental — o Brasil das médias cidades. Em geral, mais de 200 mil habitantes, até meio milhão. Nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste. É o país que cresceu mais em população, de acordo com o último censo demográfico do IBGE. E, desde o ano passado, tenho ouvido do público, com cada vez mais frequência, a menção de uma mesma referência. Brasil Paralelo.

“A Brasil Paralelo é uma produtora de vídeos sediada em Porto Alegre. Nos últimos três anos, de acordo com números oficiais da Meta — a holding por trás de Facebook e Instagram —, gastou mais de R$ 20 milhões em publicidade. É de longe o maior cliente da companhia em temas políticos. Num distante segundo, tendo gasto menos de metade disso, está o governo federal. Faz sentido: a Brasil Paralelo é um serviço de streaming, vende assinaturas, então faz propaganda. É razoável acreditar que gaste algo parecido em Google/YouTube.

“No streaming da Brasil Paralelo há principalmente documentários sobre história do Brasil e sobre temas relevantes do momento. O ponto de vista é também muito claro. Estão à direita. Muito à direita. Seu ponto de vista é olavista. Reacionário. [...]

“O que quem vive nessas cidades não tem muito é acesso a cultura. Menos população, menos espaço para uma indústria cultural típica dos grandes centros. Mas, justamente por isso, a sede por cultura é grande. Por isso contratam palestras ao longo de todo ano, se mobilizam para trazer shows de música dos artistas de que gostam. E por isso tanta gente assiste ao Brasil Paralelo.

“O brasileiro tem pouco acesso a educação e não conhece sua história. Quem conta história apresenta uma ideia de Brasil. Uma tese sobre o que o país faz bem, e sobre o que faz mal. Sobre que problemas precisam ser resolvidos e quais não. E, neste Brasil que mais cresce, o Brasil Paralelo está contando sua versão de país sozinho, livre de concorrentes. Em massa.

“Ensina de forma que entretém, ensina com convicção, é já referência aceita como com carimbo de qualidade, e choca, todos os dias, o ovo da serpente.”

É fato que a extrema-direita tem investido muito na formação - ou deformação, para ser exato - ideológica de sua base. Devemos reconhecer o papel que Olavo de Carvalho, hoje em dia tão calado, desempenhou nisso.

E a esquerda? Está sempre correndo atrás, enxugando gelo. Não dá para passar a vida desmentindo fake news ou lutando uma guerra de memes. É preciso investir na educação política, na construção de uma militância com capacidade de pensamento crítico autônomo e bagagem suficiente para travar esse combate.