Pensar Piauí

O PT disputará o segundo turno em São Paulo

Jilmar Tatto tem base no PT e base social, é um grande quadro político, bom gestor e uma pessoa preparada

Foto: El PaísJilmar Tatto
Jilmar Tatto

Por Julian Rodrigues, mestre em ciências humanas e sociais, na Fórum  

Lula foi candidato a governador de São Paulo. O ano era 1982. Alcançou 11% dos votos (o PT tinha 2 anos de idade). Suplicy disputou a prefeitura de Sampa em 1985, Erundina foi sua vice (terceiro lugar, 20% de votos). Em 1988, Erundina foi a candidata do PT. Ganhou as eleições, com 30% dos votos, derrotou Maluf e abriu uma nova era. Fez um governo histórico (Paulo Freire era o secretário de educação e Marilena Chauí a secretária de cultura, tipo assim).

Em 1992 Suplicy defendeu o legado do governo Erundina. Com 31% dos votos, perdeu a eleição para Maluf. Erundina voltou a enfrentar o malufismo – ascendente em 1996 – conseguiu 23% dos votos.

Em 2000, o PT – com Marta –  enterrou o malufismo. 35% no primeiro turno e 59% no segundo turno. Uma vitória que abriu as portas para o melhor governo que a cidade jamais havia visto.

O ex-candidato a presidente, principal quadro tucano disputou com o PT a eleição de 2004. Marta teve 36% no primeiro turno e 45% no segundo –  não foram suficientes para derrotar o PSDB. 2008 marcou novo enfrentamento com a direita. Os 33% no primeiro turno e quase 40% na segunda rodada também foram insuficientes para derrotar Kassab, o pupilo e sucessor de Serra.

E aí chegamos em 2012. Dois governos Lula de sucesso, Dilma presidenta. Lula lança o seu talentoso ministro da educação, Fernando Haddad, candidato a prefeito. Em disputa dura contra, de novo, o veterano Serra, Haddad parte de baixos patamares e vence a eleição. Com 31% no primeiro turno e 56% no segundo. De novo, o PT faz um governo inovador, que deixa profundas marcas na cidade.

Veio o golpe contra Dilma, e, no pior ano para o PT (2016), Haddad obtém 17% dos votos. Em 2018, candidato a presidente, substituindo Lula, na última hora, Haddad teve, no duro segundo turno contra Bolsonaro, 40% de votos em Sampa.

O PT na capital do estado de São Paulo tem história, organicidade, estrutura, militância. Não se trata de algo circunstancial. Da luta pela redemocratização no final dos anos 1970 até os enfrentamentos cotidianos contra o desmonte do SUAS no governo Bruno Covas, a militância do PT se confunde com a luta organizada das classes trabalhadoras e do povo paulistano por direitos, por casa e por saúde.

Derrotar o bolsonarismo

Bolsonaro normalizou a tragédia da pandemia. Baixou o tom do enfrentamento com as “instituições”. Viu sua popularidade crescer. Ensaia uma espécie de “sub-keynesianismo” (renda básica, investimento em obras), o que causa ruídos no andar de cima, provoca reações do Paulo Guedes um fundamentalista do mercado. Mas abre novas perspectivas de um governo que garanta pelo menos o auxílio emergencial. 

Centro-esquerda segue fragmentada. A legislação eleitoral, ao proibir coligações proporcionais, induz os partidos a lançarem candidaturas majoritárias no maior número de cidades possíveis. Questão de sobrevivência. O PCdoB aposta em carreira solo (cortejando Ciro, Rodrigo Maia e quem mais quiser). Não só para resistir, mas também porque tem uma tática que se soma com os que querem isolar o PT (em nome de uma suposta “frente ampla”).

O PSB, por outro lado, cada vez mais se desconstitui como partido nacional de centro-esquerda, aliando-se aleatoriamente com forças de todo espectro político. Pior ainda é a posição do PDT. Desde que Ciro Gomes transformou-se num anti-petista raivoso (buscando votos da direita, que nunca terá), o Partido que um dia foi de Brizola virou uma espécie de antagonista-mor do PT, aliado prioritário o DEM ou de qualquer outro Partido, inclusive os da base de Bolsonaro.

Portanto, à esquerda, restaram o PSOL e o PT. Pela primeira vez, nacionalmente, há alianças importantes entre esses dois partidos, em várias capitais e cidades pólo. Novidade boa que tende a se aprofundar no próximo período.

Nesse quadro de dispersão do campo progressista, há candidaturas que agregaram as forças de esquerda: Manu em Porto Alegre, Marília em Recife, Zé Ricardo em Manaus, Elson em Floripa, Edmilson em Belém, Pedro Tourinho em Campinas e muitas outras.

Ao contrário do que muitos “amigos” dizem, é legítimo e importante que o PT se apresente para disputa nas capitais. Nilmário Miranda em Belo Horizonte e Benedita da Silva no Rio de Janeiro representam o que o PT tem de melhor para oferecer ao povo mineiro e carioca.

Jilmar Prefeito

Fernando Haddad era o candidato natural de todo campo progressista na capital paulista. Defenderia o legado petista, representaria um pólo anti-bolsonarista, daria um caráter nacional à disputa em Sampa, inclusive agregando outras forças. Provavelmente atrairia do PSOL à centro-esquerda (Marta queria ser sua vice). Uma chapa Haddad-Marta estaria no segundo turno, disputando voto a voto a prefeitura com Bruno Covas.

A recusa de Haddad abriu um processo de disputa no PT paulistano. Normal e natural. Os debates se iniciaram em agosto do ano passado. Suplicy, Zarattini, Paulo Teixeira, Nabil Bonduki, Jilmar Tatto, Alexandre Padilha, Kika Silva participaram do processo. Rolou um monte de discussão em vários bairros. 

Com a pandemia, inviabilizou-se a votação presencial (lembrando que em 2019, cerca de 16 mil filiados, se mobilizaram para escolher a direção do PT paulistano). Setores do partido defenderam prévias virtuais, sem sucesso.

Em diálogo com a direção nacional do PT optou-se por uma votação que envolveu os dirigentes dos diretórios do Partido na capital (pouco mais de 600 pessoas). A disputa se afunilou entre Alexandre Padilha e Jilmar Tatto. 

Jilmar venceu. Legitimamente se consagrou o representante do Partido.

Quadro histórico do PT, foi Secretário de Transportes no governo Marta, deputado federal, presidente do Diretório do PT em Sampa e Secretário de Transportes de Haddad também. Todas transformações que houve na cidade em termos de democratização do transporte público nos últimos 20 anos levam a marca do Jilmar. Do bilhete único de Marta às ciclovias de Haddad.

Jilmar Tatto tem base no PT e base social. É um grande quadro político. Bom gestor, preparado. Experiente, fala a língua do povo, tem muita vontade de fazer enfrentamento direto com o bolsonarismo.

Cenário aberto

As eleições de 2020 são as mais confusas dos últimos anos. O prefeito  tucano, que era vice de Doria, fez um governo fraquíssimo e tem doença grave. Não está nítida qual será a candidatura bolsonarista. Marta guarda sua força e o recall de Russomano sempre aparece. Márcio França teve votação surpreendente em 2018, mas aparenta ter dificuldades para montar uma candidatura competitiva.

O PSOL, depois de uma disputa dura, apresenta a chapa Boulos/Erundina. As qualidades pessoais de Guilherme Boulos somadas à sua postura absolutamente coerente no último período (apoio a Haddad no segundo turno de 2018, protagonismo na campanha Lula Livre) e ainda trazendo Luiza Erundina como vice (um ícone para toda esquerda, que emociona e inspira, especialmente petistas) atraíram declarações de apoio de muitos artistas e intelectuais que normalmente votam e apoiam o PT.

Pesquisas por telefone (de institutos bem meia-boca) mostraram Boulos muito bem posicionado. A grande imprensa tratou de inflar a candidatura do PSOL em Sampa, porque enxergou seu potencial desagregador sobre o PT (o maior partido de esquerda do Brasil).

Óbvio que a chapa Boulos/Erundina merece todo carinho e respeito. Mas vejam: o PSOL nunca chegou aos 2% de votos em São Paulo. As prévias deste partido que escolheram Boulos candidato (em acirrada disputa com Sâmia) mobilizaram cerca de 2 mil militantes – contra os 16 mil que votaram para escolher a direção do PT em 2019.  Essencialmente, é um Partido de vanguarda, de setores da classe média progressista. 

O enraizamento do Partido dos Trabalhadores, sua construção histórica, representatividade popular, organização – mais a força do nosso Suplicy (e da mais que urgente Renda Básica), o protagonismo de Haddad, e a liderança de Lula vão impulsionar a candidatura de Jilmar Tatto para o topo das pesquisas, embolando o quadro com os atuais líderes.

Subestimar a força do PT em São Paulo é um erro. Para as petistas: menos ansiedade, mais confiança em nós mesmos. Sempre soubemos que os artistas gostam muito do Boulos (sobretudo os do Rio de Janeiro). Normal, a vida segue.

O Partido dos Trabalhadores é a maior organização da esquerda brasileira. E Jilmar Tatto nosso candidato a prefeito na maior cidade do país. Uma boa votação do PT em Sampa é fundamental para fortalecer a luta contra Bolsonaro e construir uma alternativa real (Lula) em 2022.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS