Pensar Piauí

Escola militares, escolas do fascismo

Uma sociedade que produz o fascismo em profusão é uma sociedade doente

Foto: O DiaEscola militar
Escola militar

Por José Salan, engenheiro, pós graduado em Comunicação Social.

A grande ascensão do fascismo de massas no Brasil pegou todo mundo de surpresa, principalmente aquelas pessoas que se situam à esquerda no espectro político. Depois da surpresa, quase todos se perguntaram, referindo-se aos fascistas “onde eles estavam, por que não os víamos antes”?

O conservadorismo sempre foi percebido, estudado e bem localizado na sociedade brasileira, mas havia uma grande subestimação sobre o tamanho e a força do reacionarismo e do fascismo no Brasil. A força com que se se mostrou na última campanha eleitoral, e mais especialmente depois do segundo turno, ao não aceitarem o resultado da eleição, comprova seu vigor e sua grandeza.

Se o reacionarismo apareceu com toda força e se emergiu em profusão embora não saibamos de onde, é porque a sociedade o produziu; resta-nos descobrir como e onde essa ideologia é gestada aqui no país e o que fazer para a eliminarmos ou, no mínimo, para reduzir sua influência.

Uma sociedade que produz o fascismo em profusão é uma sociedade doente, pois essa ideologia é nociva por se respaldar em mentiras, por ser preconceituosa, por estimular o ódio, o armamentismo, a discriminação e a eliminação dos diferentes e dos divergentes.

Até então achávamos que era um fenômeno restrito a alguns segmentos sociais e que se prendia exclusivamente a aspectos comportamentais e a reações políticas pontuais, sendo a “ameaça do comunismo” a mais importante por ser a mais mobilizadora.

As pessoas normais, com um mínimo de informações sabem muito bem que a ameaça do país se tornar comunista não tem mais razão de ser; primeiro por falta de comunistas, segundo porque este regime político perdeu força no mundo e praticamente desapareceu desde a queda do muro de Berlim, que simbolizou o fim da União Soviética, país que difundiu e era o principal espelho para os partidos comunistas mundo afora.

A União Soviética não mais existe, a Rússia o principal país da antiga URSS se tornou capitalista, o regime chinês é mais um capitalismo de Estado do que propriamente um sistema comunista, além do que a China não se imiscui nas políticas internas de outros países e não será agora que vai se intrometer, exatamente no momento que menos necessita de conflitos, por disputar com os EUA a liderança econômica e comercial do mundo e quando precisa estreitar suas relações comerciais e políticas  com os países capitalistas para poder atingir essa liderança.

Mesmo se fossem comunistas Cuba, Venezuela e Coreia do Norte não têm peso nenhum para influenciar nos destinos da humanidade. É, portanto um despropósito sem tamanho a ideia fantasmagórica da ameaça do comunismo. Só a desinformação e a manipulação política podem responder por essa ameaça.

Um dos vários fatores responsáveis pela produção e reforço do fascismo no Brasil é o pendor da população à cultura militarista, que apesar de fracassada e desastrada ainda serve de esperança para muita gente. Embora nem todos os militares possam ser conhecidos como defensores dessa ideologia, ela está nas raízes da formação militar no Brasil e está muito arraigada na conduta prática diária dos militares. A diferença de tratamento entre as classes sociais, com os negros e com minorias sociais é notória em todos os cantos do Brasil.

Os  trágicos resultados da Ditadura Militar e do Governo Bolsonaro, que é essencialmente um governo militar e  militarista são suficientes para demonstrar que essa cultura não serve e não faz bem ao Brasil. A ideologia militarista é sempre lembrada como sendo a solução para crônicos problemas como o da violência, onde essa ideologia aponta como principal ação a invasão policial e massacre ilegal nos bairros e comunidades pobres e de maioria negra assim como a abordagem seletiva de negros e pobres nas ruas das cidades. Mas, o mais grave de tudo é quando uma ideologia preconceituosa e discriminatória como esta serve de modelo educacional.

As escolas cívico militares são fontes primárias de produção dessa ideologia que discrimina, que espalha preconceito e exalta o militarismo armado, lugar onde não se pode falar em diversidade onde se difunde e incute que bandido bom é bandido morto, que a solução para os problemas da sociedade virar através do armamento da população. Esse lugar que serve não para ensinar e semear conhecimento serve mais para doutrinar, com é próprio da cultura militarista. Neste sistema, as escolas são recheadas de militares a fim de imporem sua ideologia.

A educação sempre foi vítima dos regimes autoritários dos regimes atrasados. Ela é o primeiro alvo. Todos nós vimos, num passado bem recente estrondosa campanha feita pela mídia e por setores da elite branca brasileira na defesa de “escolas sem partido”, como se no Brasil estivesse sendo implantada uma educação direcionada a educar as crianças com ideologias de esquerda. Assistimos impotentes às famigeradas campanhas da mamadeira erótica e da ideologia de gênero, que serviram como a base essencial e fundamental na primeira eleição de Bolsonaro e também durante seu governo, quando eles alimentavam suas redes de ódio com notícias falsas, as fake News, para manterem sempre vivas estas mentiras ideológicas.

No Brasil existe uma mística de que o ensino militarizado pode ser a solução para algumas fragilidades que a educação pública apresenta e foi criada uma metodologia para implantação de escolas cívico militares em que é levada aos estudantes uma extraordinária carga de valores e de conteúdos que exaltam demasiadamente a disciplina militar, a exclusão e o menosprezo dos diferentes, de quem “sai da linha” ou do limite “das quatro linhas” que são traçadas nos quartéis.

A partir das eleições deste ano, com o escancaramento deste jogo ideológico, fica muito claro que o país deve superar este atraso social e civilizatório encerrando o ciclo, através do encerramento destes programas militaristas e o retorno destas escolas aos currículos e sistemas normais do ensino público nacional, com sua transformação em escolas com ensino em tempo integral; seja nos estados ou na União, pelo bem da democracia e da diversidade racial e cultural, nossas maiores riquezas.

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