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Encontros e Desencontros com Glória Maria: a cliente e a operadora de telemarketing

Foto: DivulgaçãoGlória Maria
Glória Maria

 Por Tatiana Lima, jornalista, via Facebook

Não nasci e muito menos minha primeira atividade profissional foi ser jornalista. Esse não é o caminho de mulheres filhas de famílias pobres dos morros e subúrbios do Rio. Primeiro, a gente trabalhar com o que aparece para sustentar a casa e permitir viabilidade do sonho. Então, fui operadora de telemarketing- o novo chão de fábrica — em uma empresa grande de uma rede de farmácias. Uma das minhas clientes era Glória Maria.

Atendi ela por 1 ano e 3 meses. A preocupação com seus dados era algo muito forte nela. Então, ela sempre que ligava para central, ela pedia para a mesma atendente fazer seu pedido. Assim eu descobri a idade de Glória Maria, informação que guardei nos últimos 15 anos. Mas não é sobre a revelação ou não da idade dela que quero falar agora. Quero contar que quando eu estava como operadora de telemarketing, eu tinha desistido de sonhar em ser jornalista.

Depois de 2 anos de faculdade, não conseguia mais pagar as mensalidades e arcar com os custos do estudo — passagem, livros, xerox, alimentação. Quem me prometeu auxílio, quebrou a promessa, então, todos os custos eram pagos por mim. Com isso, já exercendo através de um estágio a função de repórter, eu me vi sem condições de pagar tudo e novamente voltei a ocupar um lugar no banco dos excluídos do ensino universitário. Voltei a trabalhar como telemarketing e, portanto, estava mal e frustrada. Aos poucos, fui recuperando um fio de esperança e, esse fio foi retomado a partir de conversas entre um pedido de remédio e outro com Glória Maria.

Tudo começou com um elogio dela a sonoridade do meu nome: “Nossa, Tatiana Lima, que sonoro! Bonito, uso sempre profissional lamente seu nome assim”. Eu ri. Mas gostei.

Depois de um tempo, ela começou a conversar comigo durante o pedido. Com isso, me contou sobre a época de telefonista, porque atender diferentes pessoas “no telemarketing” devia ser tão difícil quanto o dia a dia de telefonista. Essas conversas muito pontuais, começaram a trazer um fio… de esperança.

Voltei a ler livros ente um pedido. Passei a ser a ‘operadora do livro” (como as colegas de trabalho se referiam a mim). Voltei a sonhar não em ser uma Glória Maria, mas voltar ao jornalismo. Glória era uma inspiração, mas muitas vezes eu achava também que, ao contrário dela, “não dei conta… não conseguia como ela deu”.

Em outro conversa pontual, Glória soube que eu tinha deixado a faculdade de jornalismo. Ela disse que a questão: “não eram as pedras, mas como ia contornar elas”.

Certo dia, ela ligou e não me achou. Avisaram que eu estava de folga porque tinha ido fazer prova do Enem. Ela não fez o pedido. Perguntou se na 2f estaria lá, mas ela não retornou na 2f. Mas na quarta-feira, o supervisor me passou a ligação de Glória Maria, que fez um pedido de pasta de dente e coisas mais miúdas, uma desculpa para falar comigo e dizer: “Quero te parabenizar por ter ido fazer o Enem. Tomara que eu perca minha atendente e ganhe uma colega de profissão. É isso, se movimenta”.

Atendi Glória por mais uns três meses desde a realização da prova, mas no quarto mês ela me procurou e eu não estava. Falou que ligava depois então avisaram que eu tinha me desligado do trabalho para começar a faculdade de jornalismo com bolsa de 100%.

Glória então fez o pedido, mas no final quis falar pediu para falar com o supervisor. Ele veio até a central e ela fez outro pedido. Era um favor pessoal.

Pediu se ele podia me avisar que: “ela estava muito feliz por mim. E que ela aguardava conhecer a voz amiga da atendente um dia como uma colega de profissão”. Eu achei que era trote quando recebi o recado, mas foi confirmado por outras operadoras.

Eu nunca encontrei Glória Maria. Nós nunca nos conhecemos pessoalmente. Porém, a fé de Glória Maria em mim, além de ter me dado incentivo para me movimentar, me fez jornalista hoje e eu nunca vou esquecer. Obrigado Glória! Obrigado onde você estiver vivendo agora para além dos nossos corações. Você sempre estará aqui comigo vivendo nas minhas veias pulsando vida… pulsando jornalismo.

Sim, GLÓRIA MARIA sempre será uma Fantástica!

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