Pensar Piauí

A culpa não é nossa!

Quando uma mulher sofre uma violência, a primeira coisa que perguntam para ela é: o que você fez para isso ter acontecido?

Foto: DivulgaçãoMulher

Por Beel da Silva, professora e militante

Quando uma mulher sofre uma violência, a primeira coisa que perguntam para ela é: o que você fez para isso ter acontecido? E com isso tenta se justificar, e culpar, a vítima. E então caímos naquilo que estamos cansadas de dizer que não é uma roupa, estar em uma festa, estar na política, estar voltando do trabalho ou até mesmo dentro casa, que justifique uma violência. Aliás, nada justifica uma violência, seja qual for e contra quem for. E outra coisa mais injustificável ainda é culpar uma mulher pela violência que seu companheiro, seu filho, seu pai tenha cometido, seja contra ela ou contra outra mulher. E não, a culpa não é nossa!

Esse é o machismo nosso de cada dia: Se você foi vítima, tem culpa; Se você tem algum tipo de relação com um agressor, tem culpa; Se você é mulher, tem culpa. E não, a culpa não é nossa!

Esse ciclo de ser vítima e revitimizada é doloroso e parece ser interminável. E se agrava quando essa vítima é questionada pela veracidade da sua denúncia, quando essa vítima tem a violência sofrida revertida em apontamentos do tipo “você está usando isso para se promover, você é oportunista”, quando essa vítima é acusada de estar cometendo uma violência com viés identitário contra quem a agrediu (racismo, homofobia, e etc.). Vamos ressaltar que isso é machismo sim. Assim como também é machismo, você ser responsabilizada pelas atitudes de outras pessoas. E não, a culpa não é nossa!

Por inúmeras vezes, vemos a tentativa de abrandamento da agressão com base no álcool, em drogas, em estresse, em dúvidas do tipo “eu achava que estava sendo traído”. E mais uma vez, é o machismo atuando para culpar a vítima. E em situações como essas, por mais segura que a mulher esteja do que aconteceu, ela passa a se questionar “será se eu exagerei?”; “será se eu entendi errado?”; “será se eu falei algo indevido?”. E incitar a dúvida, também é trabalho do machismo. E não, a culpa não é nossa!

E se a culpa não é nossa, de quem é?

Parece óbvio, mas vale mais essa ressalta: A CULPA É DO AGRESSOR! E também é agressor, aquele que aponta a responsabilidade para outra mulher que tenha qualquer tipo de vínculo com o antecessor. Ou seja, um ciclo vicioso e asqueroso de machismo. E ainda tem mais, a mulher em questão não tem obrigação alguma de se expor ou se pronunciar pelo ato cometido pelo homem próximo a ela. E por quê? Porque um homem adulto, vacinado, são e sadio deve responder DIRETAMENTE pelos seus atos.

Até aqui já apontamos dois tipos de agressores, pautados pelo machismo. Mas como coisas ruins não acabam e nem ficam poucas, ainda temos um terceiro tipo de agressor machista, dentro desse contexto. Também é uma violência baseada no machismo, a incitação ao recuo da denúncia. Sim, fazer questionamentos ou apontamentos levianos, com intuito de abrandar a situação e estimular a vítima a recuar (retirar) da denúncia ou até mesmo desistir de fazer, também é uma forma de violentar novamente a vítima. Porque assim, além de tentar proteger o agressor, retirasse os direitos dessa vítima: direito de proteção, direito de denúncia, direito de um processo justo. Não é você, alecrim dourado, parça do agressor, que deve dizer o que é certo ou errado, se existiu ou não existiu e quais as medidas devem ser tomadas, isso é função da justiça. Uma denúncia não retira os direitos civis do agressor, porque mesmo ele tendo cometido uma barbárie, diante do devido processo legal, ele terá direito de defesa. Mas se a denúncia é retirada, o resultado é uma ou mais vítimas tendo de carregar o trauma de uma violência para o resto da vida e ainda ter sido silenciada sobre tal. E se você está nesse papel, lembre-se: quem violentou/agrediu, pode até esquecer; mas quem foi violentada/agredida, nunca esquece.

Encerro trazendo o que todo texto que fala sobre violência contra mulheres fala: PRECISAMOS ACABAR COM A VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES JÁ e NÃO, A CULPA NÃO É DA VÍTIMA! Precisamos insistir que as mulheres denunciem qualquer violência, porque não existem violências menores ou maiores, o que existe é uma sociedade machista que nos agride, nos silencia, nos deslegitima, nos expõe e nos mata! Quantos e quantos feminicídios foram o resultado do que começou com um tapa ou um xingamento? E quantas e quantas mais serão vítimas desse sistema que não nos quer no mercado de trabalho, na política, na mídia ou em qualquer lugar?

Que um dia, possamos escrever e ler sobre tudo isso no passado.

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