Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

Os jovens e a semana santa

Foto: ReproduçãoAs fotos da imagem mostram uma exceção ao texto, que é verdadeiro. Na comunidade rural Malhada (Bocaina) o povo ainda celebra a via sacra, os adultos conversam na calçada e as crianças admiram os animais
As fotos da imagem mostram uma exceção ao texto, que é verdadeiro. Na comunidade rural Malhada (Bocaina) o povo ainda celebra a via sacra, os adultos conversam na calçada e as crianças admiram os animais

Para além de uma generalização infunda, é fato que, ao longo das últimas duas décadas tem-se percebido uma mudança no comportamento de muitas pessoas, principalmente entre os jovens, que estão preferindo permanecer na capital/Teresina ao invés de seguir a tradição familiar de passarem a semana santa em cidades do interior do estado.

Tradicionalmente, no Brasil, a Semana Santa é um momento de reflexão religiosa, quando se comemoram os “mistérios da salvação” por meio da rememorização e ressignificação da última semana da vida de Jesus Cristo. A Semana Santa se inicia no Domingo de Ramos, passa pela Sexta-Feira Santa (dia da crucificação e morte de Jesus) e termina no Domingo de Páscoa, quando se celebra a ressurreição de Cristo.

Para os cristãos, a Semana Santa é um período sagrado e marcado por muitos rituais, que serve de inspiração para olharmos para dentro si e refletir sobre as ações e as mensagens de Jesus Cristo. Os religiosos, também, celebram o “Tríduo Pascal” – que representa a salvação humana e a renovação da vida.

Por fim, a Semana Santa é um momento para associar o sofrimento de Cristo ao mesmo que acontece a tantas famílias e pessoas no cotidiano. Porém, muitas pessoas, especialmente os jovens, têm relevado os significados e os rituais da Semana Santa. Uns têm se declarados sem religião e outros evitam viagens de família às cidades do interior do estado, como de costume se fazia no passado.

Existem diversos fatores sociais, institucionais, pessoais e familiares para o distanciamento de jovens das tradições religiosas, que incluem a influência das redes sociais, a pouca fé, a tensão entre o cristianismo e a ciência e até o impacto negativo do comportamento moral de líderes da igreja e dos próprios pais, quando não vivem o que pregam e falam.

Assim, a hipocrisia e a decepção com pessoas da igreja e da família são algumas das razões para os jovens se afastarem dos templos religiosos e dos significados da Semana Santa. Muitos deles, também, se sentem desconectados da igreja ou da fé, o que torna cada vez mais difícil cultivar uma fé duradoura na juventude, pois não se permite vivenciar uma profundidade em suas experiências com a igreja, e se distanciam mais.

Outro aspecto importante tem a ver com acesso irrestrito à pornografia digital, numa cultura que valoriza a hipersexualidade ao invés da plenitude. As experiências dos jovens cristãos na igreja quanto à sexualidade, o controle de natalidade e as dores socioemocionais são, muitas vezes, desatualizadas, rasas e perpassadas por julgamentos morais. Isto impede que muitos jovens se disponham a satisfazer as expectativas da igreja.

Esses aspectos, além de outros, influenciam nas percepções de muitos jovens – que não é a maioria – sobre os significados e os rituais da Semana Santa, fazendo com que optem por não participarem ou mesmo utilize o período para outras atividades, que visam a estabilidade financeira e não espiritual.

Hoje, muitos jovens não têm mais como prioridade o engajamento religioso e a continuidade à tradição familiar de celebrar a Semana Santa nas cidades do interior do estado. Por exemplo, uma pesquisa do Instituto Cidadania mostra que a educação e o emprego são os temas de maior interesse para os jovens, como uma forma de equilibrar a vida pessoal e profissional, distantes da religião, mas, sem perder a religiosidade.

Porém, a maioria dos jovens ainda vivem os significados e rituais religiosos, as ações e as mensagens de Jesus Cristo, bem como a tradição familiar de celebrar o período da Semana Santa nas cidades do interior do estado – como uma forma de visitar os familiares, os amigos e os lugares de ancoragens identitárias.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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