Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

O laudo antropológico no Ministério Público

Foto: DivulgaçãoMP

No campo jurídico, “o Ministério Público (MP) é o ente estatal autorizado a movimentar a ação penal pública e fazer a defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos e sociais” (arts. 127 e 129, da CF/88). Porém, muitas vezes, o MP se defronta com obstáculos sociojurídicos, exigindo a colaboração de outras formas de conhecimentos para a peleja jurídica.

Num cenário de impasses, o “laudo antropológico” (Arnaldo Eugênio, 2023) pode auxiliar o MP em dirimir dúvidas factuais, para realizar a movimentação da ação penal pública e a defesa dos interesses. Ele não irá substituir o MP no seu mister, mas contribuirá com outros elementos de prova. E, assim, reforçar “a legitimidade exclusiva ao MP para atos e ações ligados ao exercício da ação penal pública, visando a defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos e, socialmente, relevantes” (Valter Foleto Santin, 1997). 

A presença do MP é indispensável somente nos casos em que o processo tratar de assunto em que haja interesse público associado a uma das partes ou à natureza da questão (direitos sociais e individuais indisponíveis, difusos ou coletivos).

Nesse contexto, reconhece-se a importância do laudo antropológico, “por suas próprias condições de elaboração, pelo fato de inserir-se em um processo, ser parte de um diálogo com outros campos e saberes, e ser produzido mediante quesitos antecipadamente elaborados” (Elaine Cantarino O’Dwyer (2005).

Assim, o laudo antropológico tem função estratégica, pois “a legitimidade do MP no processo penal é matéria vasta, mas ainda pouco explorada na doutrina, fruto da acomodação com o papel atual desempenhado na ação penal pública, vista sob o enfoque processual e da sua fase judicial” (Valter Foleto Santin, 1997).

O jurista brasileiro Lenio Streck (2022), sempre defendeu a isenção do MP, enquanto ente de Estado, na figura de assistente de acusação: “Às vezes deparávamos com bizarrices como, em uma apelação da defesa, o MP fazia arrazoado pela absolvição e o assistente pugnava pela condenação; [...] sempre disse que o MP deveria ser uma magistratura, imparcial e isento, [...] especialmente relacionados às garantias processuais-constitucionais”.

Para tanto, o laudo antropológico pode e deve ser utilizado pelo MP como um recurso estratégico do assistente de acusação e, fundamentalmente, para nos preservar de substituir uma espécie de positivismo por outro. Ele possui grande relevância científica e sociojurídica, capaz de orientar a tomada de decisões na ação penal pública. 

Não se trata de forçar um diálogo da Antropologia com o Direito, usando o MP, mas de evidenciar que tais saberes estão inseridos em uma “sociedade complexa, uma noção onipresente na prática dos antropólogos, que a opõe às ‘simples’, objeto da antropologia, ou a define delimitando as condições e aspirações do exercício antropológico nas sociedades ocidentais modernas” (Marcio Goldman. 1999).

É nesse contexto que o laudo antropológico e o MP deverão se aproximar, para aquele auxiliar este na “movimentação da ação penal pública, visando fazer a defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos e sociais” (arts. 127 e 129, da CF/88).

Assim, considerando a atuação do MP na prevenção de crimes, fixação de política criminal e de segurança pública, de repressão e combate à criminalidade e de execução e cumprimento da pena, passando pela preservação dos direitos humanos, o uso do laudo antropológico surge como um aparato estratégico na seara jurídica, especial no mister do MP.
 

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS