Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

O engavetador-geral

Foto: DCMAugusto Aras vai confirmar ser o novo
Augusto Aras vai confirmar ser o novo "engavetador-geral" da República?


Se o Brasil (e o mundo) se escandalizou com o ignóbil nível do reality show in Brasília – ou a “reunião ministerial do fim do mundo”, no Palácio do Planalto (22/04) –, então, prepare-se, pois, em breve, as trevas e a barbárie que ceifam a política brasileira poderão (ou não) arrastar parte do Judiciário para o buraco negro da desmoralização e, de certo modo, corroborar com a afirmação categórica do incivil Ministro da Educação Abraham Weintraub: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”.

Às vésperas de enviar um ato de ofício, oferecendo (ou não) denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro no inquérito presidido por Celso de Mello (Min. do STF) sobre a prática (ou não) de advocacia administrativa, interferindo politicamente em inquéritos na Polícia Federal, o Procurador-Geral da República Augusto Aras – escolhido a dedo por Jair Bolsonaro fora da lista tríplice apresentada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) – recebeu a visita oportunista daquele num evento interno da Procuradoria Geral da República.

Fora das relações institucionais, o Procurador-Geral da República Augusto Aras foi besuntado de elogios farisaicos, num ato explícito de corrupção nos moldes “é dando que se recebe”. Pois, a suposta oferenda de ouro ao Procurador pode ser a garantia de uma das vagas de Ministro do Supremo Tribunal Federal, que o presidente poderá preencher.

O “caso Bolsonaro” de tentativa autoritária de usurpação da autonomia da Polícia Federal é um episódio exemplar para se enxergar o modus operandi de parte do Judiciário no Brasil – especificamente, a Procuradoria-Geral da República. De longe, já se sente um cheirinho de pizza quente pronta para comemorar o imoral engavetamento da denúncia, ignorando os depoimentos dos procuradores, ministros e delegados federais, que apontam para a veracidade das acusações do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro.

Em resposta à repentina visita presidencial, o Brasil (e o mundo), poderá assistir a um “golpe jurídico e seletivo”. Ou seja, o arquivamento pelo Procurador-Geral da República de um inquérito carregado de elementos comprobatórios de pelo menos um dos crimes, supostamente, cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro – corrupção passiva privilegiada, obstrução da justiça e advocacia administrativa –, para interferir politicamente na autonomia da Polícia Federal.

O Procurador-Geral da República tem em mãos um forte elemento para denunciar Jair Bolsonaro: a divulgação do vídeo – ou parte dele – da “reunião ministerial do fim do mundo”, no Palácio do Planalto, onde o presidente cobrou, de forma direta e ríspida, a substituição do diretor-geral da PF e do superintendente do órgão no Rio de Janeiro, humilhando Sérgio Moro diante de vários ministros e assessores do governo federal.

Assim, se Augusto Aras arquivar a denúncia contra o presidente, pensando numa vaga do STF, estará, mesmo sem a intenção deliberada, ratificando o insultuoso rótulo weintraubiano sobre o caráter dos ministros do STF e rasgando a regra de ouro – “não faça ao outro o que não queres que faça contigo”.

Portanto, diante da repercussão negativa em torno do teor da reunião ministerial, a escalada autoritária do governo, dos elementos comprobatórios de tentativa de interferência política na PF e dos abusos do presidente – que se enquadram como crimes comuns e de responsabilidade –, minimamente, espera-se que Augusto Aras não sinta filáucia em entrar para a história como um notável “engavetador-geral da República”, e formalize a denúncia e a encaminhe para o Congresso Nacional.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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