Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

O clube da fofoca

Foto: ReproduçãoFofoca
Fofoca

 

A fofoca (ou fuxico) é, enquanto fenômeno social complexo – bem com outros comportamentos humanos em sociedade –, uma invenção sociocultural, que pode assumir valores positivos ou negativos, dependendo do referencial de análise e das intenções individuais que perpassam as ações sociais.

A fofoca é parceira da inveja, do controle no processo civilizatório e consiste numa “ação social”. Para Max Weber (1864-1920), a ação social é orientada em relação ao outro. Assim, há algumas atitudes individuais e coletivas que não podem ser consideradas sociais. Em geral, a fofoca é uma ação social com a finalidade inventar, atiçar, bolar ou aumentar, subjetivamente, uma situação ou fato social para exercer controle.

Como um mecanismo de controle, por um lado, a fofoca dá prazer e “consola” o fofoqueiro – “a desgraça de poucos faz a alegria de muitos” – e, por outro lado, produz uma autofagia social, incluindo os fuxiqueiros (ou boateiros) – “morrem pela boca”. Empiricamente, 2/3 das conversações nas rodas sociais são fofocas e a mídia especializada em glorificar e bisbilhotar a vida privada lucra muito com escândalos e os fuxicos. Não é raro ouvir pessoas se dizendo ser vítima de fofocas, mas quando indagadas se também fofocam, negam dizendo que apenas fazem “comentários”.

Para Weber, a ação social pode ser dividida em quatro ações fundamentais: a) ação social racional com relação a fins; b) ação social racional com relação a valores; c) ação social afetiva; e d) ação social tradicional.

Assim, no mundo da fofoca ninguém está imune, pois o alvo dependerá do interesse e da intenção daquele que faz parte do clube da fofoca, pois a capacidade inventiva do fofoqueiro é extraordinário. Contudo, ele (ou ela) tem pouca credibilidade, pois as maledicências são de autossabotagens.

Alguns pesquisadores alemães têm desenvolvido a teoria de que a fofoca é “positiva”, ajudando os indivíduos a desenvolverem um processo de cooperação, a construir sua própria reputação fora do ambiente familiar e a conquistar a confiança alheia – um aspecto fundamental nas relações sociais. Nesse sentido, é pouco provável imaginar que existiu um grupo social sem a fofoca, onde as pessoas não pautassem as suas vidas em torno de expiação da vida alheia sem se preocupar com a sua própria vida.

Atualmente, numa sociedade do espetáculo, o fofoqueiro é perigoso porque, em busca de visibilidade e prestígio social sem limites, este pode “plantar” fatos e notícias artificiais, tentando torná-las naturais. Assim, agirá como um ser social maligno, que se projeta na sua vítima, semeia discórdias, destrói relacionamentos e se vê imune às consequências de suas fofocas.

Desse modo, a fofoca é uma moeda na estética da mercadoria. O poder maléfico da fofoca pode ser identificado em situações afetivas onde os desonestos tiram proveito da mentira, quando a reciprocidade, as dúvidas, a confiança e as reputações transferidas pela fofoca estão interrelacionadas. Contudo, no passado, a fofoca era um meio pelo qual as pessoas se informavam sobre quem era o outro.

Foi por meio da fofoca que o ser humano conseguiu s informar sobre os comportamentos de amigos e rivais, para se manter vivo. Por isso, se desenvolveu uma compulsão humana pela informação sobre os outros: a fofoca. Logo, a fofoca faz parte da estrutura das relações sociais e pode ser estudada de forma menos preconceituosa. Por isso, quase ninguém resiste a uma “boa fofoca”. O problema é não discernir o linchamento moral que subjaz as fofocas negativas ou más, que escondem verdades artificiais e vis.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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