Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

Benedito Carlos, presente!

Foto: ReproduçãoProf. Dr. Benedito Carlos de Araújo Júnior
Prof. Dr. Benedito Carlos de Araújo Júnior

 

No amanhecer do último sábado (04/02), milhares de corações entre os familiares, alunos, ex-alunos e amigos choraram, enquanto o mundo acadêmico piauiense se enlutou, abrindo um imenso vazio na UFPI com a partida do Prof. Dr. Benedito Carlos de Araújo Júnior – entre os íntimos, chamado de Bené.

Bené foi o meu professor, amigo, irmão étnico, orientador, crítico, colega de sala de aula, de futebol e de bate-papo em mesa de bar. Era um interlocutor confiável (junto com Antonio Leandro) de embates intelectuais sobre a educação e violência. Escrevo este breve obituário para aceitar a sua partida com gratidão e seguir a jornada nesta vida breve, mesmo triste na solidão do hiato que ele deixou.

De infância pobre, mas sem perder a resiliência, no bairro Lourival Parente, lutou contra os apertos e o preconceito racial, passou pelas festas no Clube de Jovens, na rua 9, e pela polícia civil. Benedito foi forjado na resignação e na luta, zabumbou nos “Capirotos” e foi ativista no grupo afrocultural “Coisa de Nêgo”. Tornou-se Bacharel em Ciências Sociais (UFPI-1992); Mestre em Educação (UFPI-1998); Doutor em Ciências Sociais (PUC-SP/2014) e professor da UFPI (1993-2023).

Bené, desde o início da carreira acadêmica se concentrou mais nos temas da violência, segurança pública, suicídio, mídia e poder. Como professor do curso de Ciências Sociais da UFPI contribuiu na formação de muitos profissionais, orientou diversos estudos acadêmicos e pesquisas científicas importantes para a sociedade piauiense. Ele foi o meu orientador no TCC e fui monitor de algumas das suas disciplinas.

O professor Benedito era um amante dos esportes, da música e um profissional dedicado, que estimulava seus alunos a navegarem nas ondas da criticidade e da reflexão, sem medo de errarem e serem felizes. Ele era um provocador de mentes, que insistia em burilar os nossos pensamentos para nos retirar da caverna de Platão.

Assim, fez comigo da graduação ao doutorado na PUC-SP, onde fomos colegas de sala – o criador e a criatura, assim muitos se referiam a nós –, juntamente com o amigo Antonio Leandro. Desde o início dos anos 2000 formávamos uma tríade em amizade profícua, sincera e de ricos debates, sem paternalismo acadêmico ou soberba, sem negligenciar a criticidade intelectual.

No mestrado, Bené foi orientando da socióloga Maria do Carmo Bedard. Durante o doutorado tivemos o mesmo orientador – o antropólogo Edgard de Assis Carvalho. A minha tese foi sobre a violência e Bené abordou o suicídio como questão social. Em comum, os nossos estudos ajudam a entender os dois fenômenos socioantropológicos no contexto local.

Como intelectual, o professor Benedito foi inquieto, questionador, profundo e provocador. Era generoso e polêmico; crítico e amoroso; engajado e destemido, que resistia contra o racismo, a mesmice acadêmica e o comodismo docente. Bené era feito de coragem.

Era um durkheimiano convicto, que acreditava que dentro dos grupos sociais o que prevalece é a consciência coletiva – o conjunto de crenças e sentimentos de uma mesma sociedade que serve para orientar a conduta de cada um de nós. Portanto, os fenômenos individuais podem ser explicados a partir da coletividade. Bené era um farol.

Com o professor Benedito aprendi que a educação de qualidade, pública e gratuita para todos é uma possibilidade de enfrentamento das causas sociais da violência e de prevenção ao suicídio.

Como ser humano, Bené era um diamante lapidado naturalmente. Uma beleza negra, de sorriso contagiante e um senso de humor refinado. Com a sua partida, o céu deu de chorar por três dias.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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