Turbulências da família Bolsonaro
O futuro do ex-presidente parece cada vez mais atrelado às investidas desesperadas de seus filhos e à deterioração de suas alianças

Por trás das movimentações políticas e judiciais que envolvem a família Bolsonaro, um novo capítulo escancara uma articulação internacional em curso, centrada nos Estados Unidos, com desdobramentos que podem impactar diretamente o destino jurídico do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). A ofensiva, que já envolve o ex-presidente americano Donald Trump e a rede social Rumble, agora mira o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes — relator do inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado no Brasil entre o fim de 2022 e o início de 2023.
Em depoimento prestado à Polícia Federal na última quinta-feira (5), Jair Bolsonaro confessou que enviou R$ 2 milhões por Pix ao filho Eduardo, que está estabelecido nos Estados Unidos. A justificativa apresentada foi simplista: “Ele está levando a vida dele. Dinheiro limpo, legal, Pix”. Mas a transferência, segundo fontes da investigação, se insere em um contexto bem mais grave: Eduardo tem atuado nos EUA com o objetivo explícito de pressionar autoridades americanas a sancionarem membros do Judiciário e do Ministério Público brasileiros, inclusive usando a chamada Lei Magnitsky, normalmente aplicada contra violadores de direitos humanos ao redor do mundo.
Na prática, o ex-presidente admitiu que financia uma operação política internacional, centrada na desestabilização de instituições brasileiras e na obstrução de investigações que envolvem a sua própria conduta. A Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República (PGR) veem a movimentação com extrema preocupação. O inquérito que apura a atuação de Eduardo no exterior foi aberto a pedido do deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) e já aponta indícios de coação no curso do processo e tentativa de obstrução da Justiça.
A campanha internacional contra Moraes ganhou impulso nesta sexta-feira (6), quando a empresa Trump Media — que pertence ao ex-presidente dos EUA — e a plataforma Rumble, da qual Trump é sócio, ingressaram com uma ação na Justiça americana. O processo, protocolado no Distrito Central da Flórida, acusa Alexandre de Moraes de violar a Primeira Emenda da Constituição dos EUA ao emitir ordens judiciais que teriam repercussão sobre usuários das redes sociais residentes em território americano.
“Permitir que ele silencie um usuário barulhento em um canal digital americano colocaria em risco o compromisso fundamental do nosso país com o debate aberto e robusto”, argumenta a petição, que ainda pede que decisões do STF não tenham valor nos EUA e que o ministro seja proibido de acionar empresas como Apple e Google para retirar aplicativos como o Rumble de circulação. A ação também cobra indenizações por supostos danos à liberdade de expressão e acusa Moraes de “abuso de poder”.
Eduardo Bolsonaro celebrou o processo com entusiasmo nas redes sociais, afirmando que as "ordens internacionais de Moraes não valerão mais nada". O parlamentar, que já havia admitido sua intenção de viver permanentemente nos EUA e exercer o mandato à distância, em uma espécie de “home office” internacional, agora tenta se consolidar como articulador político da extrema-direita internacional contra o Judiciário brasileiro.
Enquanto isso, no Brasil, o cerco se fecha sobre Jair Bolsonaro. Após seu depoimento, o ex-presidente procurou se desvincular da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que fugiu do país depois de ser condenada a 10 anos de prisão pelo STF por invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Zambelli foi colocada na lista vermelha da Interpol e agora é considerada foragida internacional.
“Não tenho nada a ver com Carla Zambelli. Não botei dinheiro no Pix dela. Estou acompanhando o caso pela imprensa”, disse Bolsonaro, demonstrando incômodo com as comparações entre a situação da ex-aliada e a de seu filho Eduardo. O próprio PL, partido de ambos, tentou intermediar a crise, pedindo que Bolsonaro evitasse críticas públicas a Zambelli. No entanto, com a fuga da deputada, o distanciamento foi inevitável — especialmente diante das investigações em curso e do temor de que Bolsonaro siga o mesmo caminho.
Em meio à turbulência, outro membro da família voltou a ser alvo de chacota nas redes sociais: Jair Renan (PL-SC), vereador em Balneário Camboriú, viralizou após publicar um vídeo em que comete um erro crasso de português, chamando os moradores da cidade de “cidadões”. A palavra inexistente rapidamente virou meme e evidenciou o despreparo do filho mais novo do ex-presidente.
A sucessão de episódios — da ofensiva nos EUA à crise com Zambelli, passando pela gafe de Jair Renan — revela não apenas o isolamento político de Jair Bolsonaro, mas também o aprofundamento de seu envolvimento em ações que podem agravar sua situação jurídica. O temor de uma fuga semelhante à de Zambelli levou parlamentares do PT a solicitarem ao STF que Bolsonaro seja monitorado com tornozeleira eletrônica. O futuro do ex-presidente, portanto, parece cada vez mais atrelado às investidas desesperadas de seus filhos e à deterioração de suas alianças.
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