Mulher branca, filho gay, racismo, preconceito: as lutas de Maguila fora dos ringues
Conheça um pouco da história do campeão que morreu esta semana
José Adilson Rodrigues dos Santos, conhecido pelo Brasil como Maguila, deixou um legado não apenas como um dos maiores nomes do boxe nacional, mas também como um homem que, com determinação e simplicidade, atravessou lutas dentro e fora dos ringues. Maguila, que faleceu aos 66 anos, foi vítima da encefalopatia traumática crônica (ETC), ou demência pugilística, uma doença neurodegenerativa associada a traumas cranianos repetidos, frequentes em atletas de esportes de contato.
Durante sua carreira, Maguila conquistou um impressionante recorde de 77 vitórias, 61 por nocaute, levando o Brasil a torcer por ele. Fora do ringue, o pugilista também travou batalhas sociais e pessoais. Cresceu em uma São Paulo onde encarou trabalhos como pedreiro e segurança antes de ganhar fama. O apelido que o acompanhou ao longo da vida, “Maguila,” surgiu em um contexto triste de racismo, quando trabalhava como segurança em uma boate e compararam sua imagem ao gorila Magilla Gorilla, da Hanna-Barbera. Este foi apenas um entre muitos episódios de discriminação enfrentados por ele, mas nunca o impediu de seguir em frente.
Foi nos anos 1980 que conheceu Irani Pinheiro, sua futura esposa e fiel companheira. Irani, então professora de datilografia, conheceu Maguila de forma casual em uma feira livre na Ponte Rasa, São Paulo, onde ele a convidou para comer um pastel. Irani, que mais tarde se formou em Direito, ajudou o pugilista a gerenciar sua carreira, assumindo papéis tanto na vida pessoal quanto profissional do marido. A dedicação foi mútua e, apesar de resistências, eles se casaram, superando o preconceito racial que marcou o relacionamento desde o início. Ela continuou ao lado de Maguila até seus últimos dias, cuidando dele e mantendo seu legado vivo como presidente do Instituto Adilson Maguila.
Maguila também foi pai de três filhos. O mais velho, Denilson Lima dos Santos, tentou seguir os passos do pai no boxe, mas não alcançou o mesmo sucesso. Edmilson Lima dos Santos, o segundo, hoje com 45 anos, seguiu outros rumos, assim como o caçula, Adilson Rodrigues Júnior, ou Júnior Ahzura. Diferente do pai, Júnior escolheu o ativismo e encontrou um espaço de fala para compartilhar experiências e discutir temas como gordofobia e homofobia. Em uma emocionante homenagem ao pai, ele lembrou como Maguila o apoiou desde cedo, mesmo quando enfrentava o bullying e o preconceito por ser um "gordinho viado," como se descreveu em seu podcast Gordosfera.
Júnior recorda que Maguila sempre lhe ofereceu uma visão humana e acolhedora do mundo, expressando opiniões abertas sobre sexualidade em uma entrevista de 1992. Na época, o boxeador, de modo surpreendentemente progressista, desafiou preconceitos ao defender que ser homossexual era algo natural. A aceitação e o apoio paterno moldaram a trajetória de Júnior, que encontrou na figura do pai não só um herói esportivo, mas alguém que respeitava e o defendia.
Após anos de luta contra a ETC, Maguila descansou. Deixou uma história que inspira não apenas pelo talento esportivo, mas também pela sua resiliência e afeto, especialmente com sua família e seu filho caçula, cuja jornada é um reflexo do amor e respeito do pai.
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