A vitória da China na “guerra dos chips”
A “guerra dos chips” entre os Estados Unidos e a China transformou-se em um dos campos de batalha mais decisivos da geopolítica moderna

Por Miguel do Rosário, jornalista, no Cafezinho
A “guerra dos chips” entre os Estados Unidos e a China transformou-se em um dos campos de batalha mais decisivos da geopolítica moderna. Por anos, Washington tem tentado conter o avanço tecnológico de Pequim, impondo sanções e restrições com o objetivo de frear o acesso chinês a semicondutores avançados – os “cérebros eletrônicos” que alimentam tudo, desde smartphones a sistemas de inteligência artificial. No entanto, a realidade emergente sugere que, apesar dos esforços americanos, a China não apenas resiste, mas está se posicionando para vencer essa disputa crucial.
A história recente dessa guerra começou com os Estados Unidos buscando isolar a China de tecnologias-chave. Empresas chinesas, como a gigante de telecomunicações Huawei, foram colocadas em listas negras, impedindo-as de acessar chips e softwares essenciais produzidos por companhias americanas ou que utilizassem tecnologia americana. O objetivo era claro: sufocar a inovação chinesa e manter a supremacia tecnológica ocidental. Contudo, essa pressão, em vez de enfraquecer a China, parece ter catalisado uma determinação sem precedentes para alcançar a autossuficiência. A resposta de Pequim foi um investimento massivo e coordenado para construir sua própria cadeia de suprimentos de semicondutores, do design à fabricação e ao empacotamento.
A ascensão da autossuficiência chinesa
Um dos exemplos mais notáveis dessa resiliência é a Huawei. Apesar das sanções severas que a impediram de usar chips de ponta em seus smartphones, esta empresa privada, de propriedade de seus funcionários, não se rendeu. Em vez disso, ela redobrou seus esforços em pesquisa e desenvolvimento, produzindo seus próprios chips, como os da série Kirin para dispositivos móveis e os chips Ascend, cruciais para a inteligência artificial. Isso demonstra a capacidade da China de inovar sob pressão e de criar alternativas domésticas viáveis.
Avançando na cadeia de produção, a China está fazendo progressos significativos em áreas críticas. A memória de alta largura de banda (HBM), por exemplo, é vital para as aplicações de inteligência artificial mais exigentes. Enquanto empresas como a NVIDIA, dos EUA, buscam fornecedores globais como a SK Hynix da Coreia do Sul para suas próximas gerações de chips de IA (como o Rubin, previsto para o final de 2025), a China está trilhando seu próprio caminho. A CXMT, uma empresa chinesa com forte apoio estatal, já está desenvolvendo sua própria memória HBM3, um passo crucial para a independência. Além disso, há indicações de que a China estaria “banindo” a HBM4 coreana – um movimento estratégico que, em vez de ser uma fraqueza, força o desenvolvimento e a adoção de soluções domésticas, acelerando a autossuficiência.
Na fabricação de chips, a SMIC, a maior fabricante de chips da China, está na vanguarda da produção doméstica. Esta empresa, embora de capital aberto, possui significativa participação e apoio estatal, sendo responsável por “imprimir” os chips, transformando designs em produtos físicos. Apesar das restrições de acesso a equipamentos de litografia mais avançados, a SMIC tem demonstrado capacidade de avançar em suas tecnologias de processo, garantindo que a China possa produzir uma gama crescente de semicondutores internamente.
Para completar a cadeia, empresas como a Tongfu Microelectronics, uma empresa chinesa de capital aberto, são responsáveis por “empacotar” e testar os chips, preparando-os para uso final. Isso garante que todo o processo, do design ao produto final, possa ser realizado dentro das fronteiras chinesas, minimizando a dependência externa.
O panorama global e a liderança chinesa
Enquanto empresas como a TSMC (Taiwan), Samsung (Coreia do Sul) e Intel (EUA) dominam o cenário de chips mais avançados, a China está rapidamente diminuindo essa lacuna. A estratégia americana de “desacoplamento” está, paradoxalmente, acelerando a determinação chinesa de construir um ecossistema de semicondutores totalmente autônomo.
A guerra dos chips não é apenas sobre tecnologia, mas sobre soberania e poder econômico. Ao focar na autossuficiência e ao demonstrar a capacidade de suas empresas de inovar e produzir sob pressão, a China está enviando uma mensagem clara: as tentativas de contenção podem atrasar, mas não impedirão seu avanço. Com uma cadeia de suprimentos de chips cada vez mais robusta e independente, a China não está apenas sobrevivendo à guerra dos chips; ela está, de fato, vencendo-a.
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