Política

A tática e o esquema dos bolsonaristas: usar UTI com "blindagem"

Ex-presidente passou por cirurgia muito invasiva, mas estadia numa Unidade de Terapia Intensiva do DF Star esconde manobra que parece vir à tona


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O réu Jair Bolsonaro é operado na manha deste domingo

Por Henrique Rodrigues, jornalista, na Fórum 

Jair Bolsonaro (PL) passa mal numa “visita” ao sertão do Rio Grande do Norte no dia 11 deste mês. Da unidade de saúde de Santa Cruz, no Seridó, onde foi atendido, é levado de helicóptero para a capital Natal. No dia seguinte, estabilizado, é transportado para Brasília e no dia 13 uma cirurgia de grande porte e muito invasiva é realizada em seu abdômen. A laparotomia exploratória tem o intuito de desfazer inúmeras aderências em seu intestino, que nunca mais foi o mesmo após o episódio da facada durante a campanha presidencial da qual saiu vitorioso, em 2018. Até aqui, nenhum questionamento, embora muita gente questione a sucessão de acontecimentos justamente no momento mais crítico de sua carreira política, a poucos passos de ser empurrado para uma cela na cadeia.

O problema todo começa após os primeiros dias de recuperação. Diariamente, e invariavelmente mais de uma vez, ele determina que seja filmado e fotografado cheio de aparelhos grudados no corpo e até no rosto, seminu, uma verdadeira exposição indigna e patética para muitos. Caminha pelos corredores do hospital, faz cara de sofrimento e evoca o tal deus dos extremistas facínoras. Tudo começa a ficar estranho, mas a coisa vai piorar e, por fim, revelar uma tática e um esquema grotescos.

O DF Star integra a glamurosíssima Rede D’Or, detentora de outras unidades ultrassofisticadas como o Vila Nova Star, em São Paulo. Trata-se de um hospital para gente endinheirada. Sim, uma empresa de saúde privada voltada para ricos e personalidades de absoluta exclusividade num país com milhões de miseráveis. Não é necessário afirmar que o DF Star, assim como todas as unidades da Rede D’Or, conta com médicos dos mais gabaritados e prestigiados, num ambiente de total profissionalismo, com tecnologia de ponta para tratamentos de saúde complexos, sob rígidos protocolos, como em todos os hospitais de primeiro escalão no mundo.

Mas afinal, por que o DF Star e a direção da Rede D’Or permitem que um sujeito como Bolsonaro trate um hospital dessa dimensão como um cercadinho de extremistas radicalizados que perambulam por seus corredores, enchem uma UTI e que de lá fazem até lives? Por que permitem que um paciente inicie um bate-boca descabido, aos berros, com uma oficial de Justiça enviada pelo Supremo Tribunal Federal?

Não há respostas para isso até agora, tampouco é possível fazer qualquer afirmação contra o DF Star e a Rede D’Or, em que pese todos esses acontecimentos serem estranhos e bizarros para um ambiente hospitalar, sobretudo envolvendo uma unidade de luxo preparada para os mais requisitados e difíceis procedimentos cirúrgicos e de tratamento de enfermidades graves. Porém, há respostas sim para o que Jair Bolsonaro, sua família e seus asseclas mais próximos vêm fazendo lá de dentro, usando a UTI como base.

Bolsonaro passou a utilizar a UTI como uma espécie de embaixada. Na cabeça dele e do séquito que o orienta, operado e em “terapia intensiva”, ele estaria longe das garras da Justiça e do rigor da lei. Quer uma comprovação disso? É só tentar lembrar quando foi que você ouviu falar de um paciente “em terapia intensiva” que abriu uma live, todo paramentado com monitores, fios e sensores, para colocar no ar um de seus filhos para fazer ameaças contra ministros do Supremo Tribunal Federal.

Aí está a tática. O esquema de “embaixada” foi colocado em prática de dentro de uma UTI do Hospital DF Star. Ele provoca, insulta, ameaça e faz todo tipo de estrepolia acreditando estar num ambiente totalmente seguro, de onde jamais poderá ser retirado. Faz isso, sim, com a conivência da empresa de saúde privada. Sim, o DF Star não pode permitir que uma de suas UTIs sirva de palanque para um cidadão de lá lançar impropérios na intenção de intimidar os juízes da mais alta corte do Judiciário nacional. A palhaçada não só foi “bem-sucedida” como segue a todo vapor, com visitas o tempo inteiro e até com mais ameaças, estas vindas agora de um ex-ministro de reputação política pífia que se notabilizou por sua habilidade discutível de tocar sanfona.

Mas a Justiça não se deixou intimidar. Alexandre de Moraes, o ministro do STF relator da ação penal na qual Bolsonaro é acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado, determinou que o ex-presidente fosse intimado na UTI. O argumento é simples: está numa UTI cheia de gente o dia todo, realizando lives e lançando ameaças contra as autoridades constituídas, então está bem para ser intimado. Até nessa ocasião rocambolesca o líder de extrema direita viu oportunidade para seguir com seu circo. Ele discutiu por infinitos 12 minutos com a oficial de Justiça que foi citá-lo, irrompendo em gritos ensandecidos durante a vexatória cena. Virou notícia, caiu no ridículo, mas não abandonou o esquema.

Sim, o esquema é esse. Usar a “blindagem” da UTI e a forma como os fatos vêm se sucedendo para adaptar o roteiro de sua tática. Logo após ser intimado no leito hospitalar e de ser retratado no Brasil inteiro como um desajustado pela grotesca encenação com a servidora da Justiça, sai um novo boletim médico de Bolsonaro: Batata! Seu quadro apresentou “piora clínica e nos exames laboratoriais”. Na prática, vai seguir enfurnado na UTI que lhe serve de território seguro para de lá continuar com uma palhaçada que esgota o país e parece não ter fim.

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