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Vítima de feminicídio, Isabel Cristina é beatificada em Minas Gerais

Solenidade na manhã deste sábado (10/12) seguiu ritos do Vaticano e reuniu milhares de devotos

Foto: DivulgaçãoBeata Isabel
Beata Isabel

 

Ao som de Aleluia de Handel e seguindo os ritos do Vaticano, foi beatificada na manhã deste sábado (10/12), a mineira Isabel Cristina Mrad Campos (1962-1982), em sua terra natal, Barbacena, na Região Central de Minas Gerais. A cerimônia, com missa solene, foi presidida pelo representante da Santa Sé, o cardeal emérito de Aparecida (SP), dom Raymundo Damasceno Assis.

A jovem foi assassinada aos 20 anos, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, em 1º de setembro de 1982 – data que passa a ser comemorativa em seu louvor. Foi morta por um homem, que, ao tentar violentá-la e não conseguindo tirar sua virgindade, desferiu-lhe 15 facadas. Na época, ela se preparava para o vestibular de medicina. Como se trata de um martírio, não foi necessária a comprovação, na Santa Sé, de um milagre.

Na imagem, que agora poderá ir para os altares de templos católicos, a Beata Isabel Cristina traz lírios e uma palma na mão direita, enquanto, no dedo indicador da mão esquerda, sobre o peito, está o anel-terço da fé em Cristo. Durante a cerimônia, os organizadores apresentaram um quadro da mártir, trazendo ao fundo um jardim com 15 rosas, as quais representam as flores tradicionais de Barbacena e os 15 golpes que puseram fim à sua vida.

Com a beatificação da Serva de Deus Isabel Cristina, Minas Gerais tem seu quarto beato (dois homens e duas mulheres) na Igreja Católica, último passo antes da canonização. Os primeiros foram Padre Eustáquio, Nhá Chica e Padre Victor. A beatificação, segundo o arcebispo de Mariana, é um momento para pedir a Deus pelo fim da violência contra as mulheres. “Que elas sejam respeitadas em sua dignidade, e cesse a exploração e o feminicídio”, disse o arcebispo de Mariana, dom Airton José dos Santos.

Cerimônia
Na presença de milhares de pessoas, a missa celebrada em altar montado no Parque de Exposições Senador Bias Fortes começou às 10h. Já o rito de beatificação teve início às 10h23, quando o arcebispo metropolitano de Mariana, dom Airton José dos Santos, fez a leitura do pedido a dom Damasceno, representante do papa Francisco. A seguir, houve a leitura da biografia da mártir Isabel Cristina, pelo postulador (advogado) da causa, o italiano Paolo Vilotta.

Em resposta, dom Raymundo Damasceno leu, em latim, a carta do papa Francisco, informando que o nome da “fiel e leiga, virgem e mártir Isabel Cristina” já está inserida na lista dos beatos da Igreja Católica.

Vestibular
Nascida em 29 de junho de 1962, Isabel Cristina “cresceu na vivência da fé, cultivando uma relação de carinho e amor em família”. Em 1º de setembro de 1982, aos 20 anos, ela foi brutalmente assassinada em Juiz de Fora (MG), na Zona da Mata, onde estava morando para se preparar para o vestibular de medicina. “O agressor tentou violentá-la sexualmente e, não obtendo êxito, desferiu-lhe 15 facadas, além de golpeá-la com uma pequena cadeira, lembrança de seu aniversário de três anos”, segundo a documentação referente ao martírio da jovem mineira.

O coordenador-geral da cerimônia de beatificação, monsenhor Danival Milagres Coelho explica que, “para a Arquidiocese de Mariana, bem como para a Igreja no Brasil e no mundo, é uma graça ter a beatificação de uma leiga, jovem, que soube viver sua fé na defesa corajosa dos seus valores”. O sacerdote diz ainda que a futura beata é uma referência para os jovens. “Isabel Cristina afirmou: ‘É preciso resistir ao mal, custe o que custar’. E custou a vida dela. Por isso, nós agradecemos a Deus o testemunho de fé desta jovem”.

A exemplo de Santa Maria Goretti e a Beata Benigna Cardoso da Silva, a mártir Isabel Cristina também foi vítima de violência contra a mulher. Nesse sentido, monsenhor Danival afirma que, “na pessoa da futura Beata Isabel Cristina, nós queremos lembrar a vida de tantas mulheres vítimas da violência, vítimas da tentativa de abuso sexual e de outros crimes”.

Processo
Devido à forma como Isabel Cristina morreu, mas sobretudo como viveu, foi instaurado oficialmente, em 26 de janeiro de 2001, o Tribunal para a Causa de Beatificação da Jovem Isabel Cristina. Em 1º de setembro de 2009, o processo foi encerrado em âmbito arquidiocesano, quando também ocorreu a exumação dos restos mortais e a trasladação para o Santuário Nossa Senhora da Piedade, em Barbacena.

Após onze anos, em 27 de outubro de 2020, o papa Francisco autorizou a publicação do decreto reconhecendo o martírio de Isabel Cristina, possibilitando a beatificação. Ela foi vítima não somente de um, mas de dois martírios, sendo um físico e outro moral. Além, de ter sofrido a violência física que a levou à morte, ao longo de todo o processo criminal, foram levantadas suspeitas, e, assim, apresentaram acusações falsas contra a moralidade da sua vida e da sua pessoa. Foi vítima também de calúnia e mentiras, para tentar defender o criminoso. Mas a justiça, graças a Deus, levou muito a sério o processo, revelando e comprovando toda a verdade do fato que a levou a esta morte tão violenta”, afirma o padre.

Em Barbacena, a Paróquia Nossa Senhora da Piedade reformou a Capela dos Sagrados Corações de Jesus e Maria, para onde irão as relíquias da Beata Isabel Cristina.

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