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Vamos falar sobre maconha?

Vamos falar sobre maconha?

Uso da maconha. Pronto, basta se falar o termo para as reações serem as mais diversas possíveis, seja o aceno positivo de parte da população que lembra dos efeitos terapêuticos da erva e dos que veem na legalização/descriminalização uma redução no tráfico de drogas e violência ligadas a esta prática; seja a feição de desaprovação dos que acreditam que a maconha é a porta de entrada para drogas mais pesadas e que a “liberação” provocaria um aumento no número de usuários.
Entretanto, o importante mesmo, é que a sociedade brasileira enfrente o debate sobre a questão e encare de uma vez por todas uma realidade que esta na sua frente e ela não quer ver. E é para contribuir com esta discussão que o Pensar Piauí inicia uma série sobre o tema.
É lugar comum que maconha hoje no Brasil é peça da criminosa engrenagem do tráfico de drogas e que o modelo de repressão a esta prática é ineficaz e levou o Brasil ao sétimo lugar entre os que mais matam e a terceira população prisional do mundo.
Esses dados foram apresentados recentemente durante a Marcha da Maconha, realizada em todo o País, que também protestou contra prisões e mortes decorrentes da guerra das drogas.
Segundo uma das organizadoras da marcha no estado de São Paulo, Gabriela Moncau, a intenção foi discutir com a sociedade os efeitos da política de proibição das drogas que já se mostrou ineficaz em cumprir o seu papel de controlar o uso de substâncias ilícitas e que a cada ano estão mais acessíveis a toda população, principalmente aos jovens.
Segundo dados do Ministério da Justiça a população carcerária do Brasil em 2012, era de 515.482 pessoas presas para apenas 303.741 vagas, deficit de 211.741 vagas, sendo que 38% desta população encontra-se em situação provisória.
O Brasil já é o quarto país que mais encarcera no mundo e, mesmo assim, convive com taxas de criminalidade muito altas. Também é importante apontar que a maioria das pessoas encarceradas no Brasil foi presa pela prática do crime de tráfico de drogas. Entre os homens presos 25%, o foram por causa do tráfico e, entre as mulheres, a porcentagem dispara, 63% das mulheres presas respondem por tráfico de drogas. Ressalte-se, porém, que esses dados não levaram em conta a maior população carcerária do país, pois o Estado de São Paulo não forneceu os seus dados ao Ministério da Justiça.
O Piauí não está fora desta estatística e em relação aos dados específicos da maconha o Comando do Policiamento do Interior do Piauí informa que foram apreendidas no primeiro semestre de 2015, 50 mil pés de maconha cultivadas em uma fazenda da zona rural do município de Miguel Leão, a 88 quilômetros de Teresina; 226 papelotes (pequenas embalagens da droga pronta para o consumo, normalmente feita com plástico, papel pardo ou papel alumínio); e, 9. 500 quilos da erva, dando ao Piauí o “status” de estado produtor de maconha.
É fato que a descriminalização da maconha não vai extinguir o tráfico de drogas, porém, os usuários poderão comprar numa farmácia ou plantar em casa, sem o contato com o traficante, que fatalmente leva a cocaína e outras drogas mais pesadas. Maconha não dá muito lucro, comparada com as outras drogas. A venda controlada por meio lícito dará uma balançada no caixa dos traficantes.
Em 2009, dezessete personalidades brasileiras e estrangeiras formaram a Comissão Latino–Americana sobre Drogas e Democracia, liderada pelo ex-presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso e pelos ex-presidentes César Gaviria (Colômbia) e Ernesto Zedillo (México).
A sugestão da Comissão é que a saída está em enfocar o consumo de drogas como um tema de saúde pública e trabalhar na redução do uso com isso ajudar a diminuir a produção e a desmantelar as redes de traficantes.
Após as sugestões da Comissão, opiniões divergentes afloraram. O tenente coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro, Milton Correia da Costa citou vários motivos para a não legalização/descriminalização.
Segundo ele, com a legalização haveria o aumento do consumo e número de usuários dependentes; o crescimento de doenças psiquiátricas; das internações em clinicas e hospitais e de custo com despesas médico-hospitalares, através de verbas do SUS, para atender mais dependentes. Ainda, na sua opinião, a legalização vai se tornar uma porta aberta para jovens no consumo das drogas mais pesadas.
Para o economista e professor doutor da Universidade Federal do Piauí, Solimar Oliveira Lima, o problema das drogas é uma questão contemporânea séria, especialmente, em países marcados por fortes desigualdades. “O consumo fácil e barato de drogas com características letais atinge, sobremaneira, a massa da população que compõe a força de trabalho periférica que ocupa postos desqualificados ou que se encontra desempregada. O mais grave é que o problema atinge, especialmente, adolescentes, jovens e trabalhadores adultos. Isto deve ser extremamente preocupante em um país em que o movimento de envelhecimento da população é crescente. O Estado brasileiro precisa agir, e rápido”, enfatiza.
Ele explica ainda que para enfrentar a violência causada pelo tráfico de drogas é preciso investir em educação, com conteúdo e qualidade para a cidadania. “A repressão ao tráfico, historicamente, não tem se revelado um modelo eficiente. Pode até acontecer, mas tem que ser construído, paulatinamente e concomitante, um modelo educativo, baseado na construção de uma consciência individual e coletiva de responsabilidade social. Neste processo tem que ficar nítido para as pessoas que o consumo de drogas, lícitas ou não, especialmente em demasia, não faz bem a ninguém e a nenhuma sociedade”.
Solimar destaca que não só os traficantes lucram com o consumo das drogas. “Por mais que pareça estranho, dizem que até o aparato estatal lucra, confesso que isso me assusta. As redes do tráfico, segundo comentam, se estendem pelas casas parlamentares e estruturas dos poderes executivos. Nas classes mais abastadas se tem um consumo sem repressão policial. Em torno do assunto, surgem também ‘personalidades’ enaltecidas cotidianamente. Programas policiais televisivos, são sensação e campeões de audiência. Ocupações de comunidades são transmitidas ao vivo pela maior rede de comunicação do país. Há, sem dúvida, uma espetacularização do tráfico e de sua repressão, onde muitos ganham com isso. Como dito, nenhuma droga consumida em demasia faz bem à saúde de ninguém, mas o aumento do consumo e da repressão parece fazer bem a muita gente”, alerta.
Para o coordenador do Núcleo dos Direitos Humanos da Defensoria Pública, Igor Castelo Branco, a polêmica em relação a esse tema, esta eivada de um discurso apaixonado tanto de um lado como do outro. “Temos que ver efetivamente o que está por trás da questão, tanto da legalização da maconha, quanto em mantê-la como ilegal. Primeiro temos que trabalhar os conceitos: criminalização é o que se tem hoje. O cultivo, o porte e o uso são ilegais e implica em penalidades para quem desrespeitar a lei. Descriminalização, quer dizer que a posse e consumo de pequenas quantidades não caracterizam crime. Legalização: é permitido o uso e posse e o comércio é regulamentado. Hoje em dia o consumo da maconha continua sendo um crime.
Para ele, o problema é que sempre existe um olhar discriminatório, colocando como traficantes as pessoas que fumam a maconha. “A questão das drogas é que há uma névoa sobre a discussão. Sempre se coloca como se fosse uma coisa terrív el e que se usou, ficou viciado e efetivamente sua vida ficaria com várias consequências negativas. Em relação à maconha percebe-se que os efeitos não são deletérios, o fumo e o álcool são muito piores, olhando sobre a questão da saúde das pessoas”.
O Sanitarista José Ivo, Professor Doutor da Universidade Federal do Piauí, ressalta que a maconha faz parte da História de vários povos e que não se entende o porquê da criminalização. “Por exemplo, a maconha é uma droga que a gente poderia considerar leve, faz parte da história de vários povos latinos americanos e a gente se pergunta: quem criminalizou? porque criminalizou?. Então, eu acho que essa marcha pra descriminalizar não significa incentivar o uso, mas tornar legal determinada questão, que acontecendo na criminalidade, dá origem ao tráfico, a contravenção; etc”, reforçou
Ele cita exemplos de países como Holanda e Uruguai onde o uso é liberado com um certo controle, “se isso acontecer aqui no Brasil, certamente a violência vai diminuir já que a criminalização, leva a disputa por pontos de droga, briga de gangs e outros aspectos da violência”.
A maconha na Wikipédia
"Maconha" provém do termo quimbundo (língua africana falada no noroeste de Angola) ma"kaña. O nome cientifico da maconha é Cannabis, também conhecida por vários outros nomes populares, refere-se a drogas psicoativas e medicamentos derivados de plantas do gênero Cannabis.
A cannabis é frequentemente consumida por seus efeitos psicoativos e fisiológicos que podem incluir bom humor, euforia, relaxamento e aumento do apetite. Entre os efeitos colaterais indesejados estão a diminuição da memória de curto prazo, boca seca, dificuldade motora, vermelhidão dos olhos e sentimentos de paranoia ou ansiedade.
O consumo humano da cannabis teve início no terceiro milênio a.C. e seu uso atual é voltado para recreação ou como medicamento, além de também ser usada como parte de rituais religiosos ou espirituais. A Organzação das Nações Unidas (ONU) estima que cerca de quatro por cento da população mundial (162 milhões de pessoas) usam cannabis pelo menos uma vez ao ano e cerca de 0,6 por cento (22,5 milhões) consomem-na diariamente.
Evidências da inalação de fumaça de cannabis são encontradas desde o terceiro milênio a.C., como indicado por sementes carbonizadas de cannabis encontradas em um braseiro usado em rituais em um antigo cemitério na atual Romênia. Em 2003, uma cesta de couro cheia de fragmentos de folhas e sementes de cannabis foi encontrada ao lado do corpo mumificado de um xamã de 2500-2800 anos de idade em Xinjiang, no noroeste da China.
Criminalização
A cannabis começou a ser criminalizada em vários países no início do século XX. Nos Estados Unidos, as primeiras restrições à venda da planta surgiram em 1906 e no Brasil na década de 1920. Em 1912, um acordo foi feito em uma conferência internacional em Haia, durante a Convenção Internacional do Ópio, que proibiu a exportação do "cânhamo indiano" para os países que haviam proibido o seu uso e que exigiu que os países importadores emitissem certificados aprovando a importação e afirmando que a transferência era necessária "exclusivamente para fins médicos ou científicos". Foi também posto como necessário que as partes "exercessem um controle efetivo de tal natureza a impedir o tráfico internacional ilícito do cânhamo indiano e, especialmente, de sua resina".
Nos Estados Unidos, em 1937, o Marihuana Tax Act foi aprovado e proibiu a produção de cânhamo, além da cannabis. As razões para o cânhamo também ter sido incluído na proibição são disputadas, mas vários estudiosos têm afirmado que a lei foi aprovada com o objetivo de destruir a indústria do cânhamo nos Estados Unidos, graças ao envolvimento de empresários como Andrew Mellon, Randolph Hearst e da família Du Pont. O cânhamo tornou-se um substituto muito barato para a polpa de celulose que era usada pela indústria de jornais e Hearst, consequentemente, acreditava que os seus grandes cultivos de madeira estavam em perigo. Mellon, o então Secretário do Tesouro dos Estados Unidos e o homem mais rico do país naquela época, tinha investido enormes quantias na nova fibra sintética da DuPont, o nylon, e acreditava que a substituição do seu recurso tradicional, o cânhamo, era essencial para o sucesso do novo produto.
O "Relatório Mundial sobre Drogas" de 2012, elaborado pelas Nações Unidas, afirmou que a cannabis "foi a droga mais amplamente produzida, traficada e consumida no mundo em 2010", identificando que entre 119 milhões e 224 milhões de usuários adultos existiam no planeta (população com 18 anos ou mais).
Nas últimas décadas, no entanto, surgiram diversos movimentos pela legalização da cannabis, enquanto alguns países e regiões passaram a permitir o uso do psicoativo sob certas circunstâncias, como foi o caso dos Países Baixos. Em 10 de dezembro de 2013, o Uruguai se tornou o primeiro país do mundo a legalizar o cultivo, a venda e o consumo da cannabis.
Teoria da "porta de entrada"
Desde a década de 1950, as políticas de drogas nos Estados Unidos têm sido guiadas pela suposição de que experimentar cannabis aumenta a probabilidade de que os usuários acabarão por usar drogas mais "pesadas". Esta hipótese tem sido um dos pilares centrais da política de drogas anti-cannabis nos Estados Unidos, embora a validade e as implicações desta hipótese sejam muito debatidas. Estudos têm demonstrado que o tabagismo é um preditor maior para o uso de drogas ilícitas pesadas do que fumar cannabis.
Nenhum estudo amplamente aceito jamais demonstrou uma relação de causa e efeito entre o uso de cannabis e o uso posterior de drogas mais pesadas, como a heroína e a cocaína. No entanto, a prevalência da publicidade de cigarros de tabaco e a prática de misturar tabaco e cannabis juntos em um único baseado, prática comum na Europa, são considerados fatores auxiliares na promoção da dependência de nicotina entre os jovens que usam cannabis.

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