Rede Globo com saudades de Lula e Dilma
Há um aumento expressivo no merchandising na programação da Rede Globo, ao mesmo tempo em que desapareceram os anúncios oficiais

por Eliara Santana, no Viomundo
Parecia um capítulo normal da novela. O casal saiu de casa para comprar uma TV, até pensei: “Que bobagem colocar isso numa cena da novela, coisa mais sem propósito”.
De repente, o casal entra numa loja das Casas Bahia e a cena se desenrola como se fosse um anúncio da rede – aparece inclusive o cara que já é meio um garoto-propaganda mostrando o produto – a TV 4K.
E o anúncio se desenrola como cena da novela – com o garoto-propaganda mostrando a TV, o valor (!), em quantas vezes divide. É uma fusão total entre anúncio e cena da novela – não dá pra distinguir o que é o que.
Segue a programação, TV ligada, a filha quer ver quem será eliminado no BBB, e eis que acontece de novo.
Num momento na tal casa, os participantes resolvem pedir comida por aplicativo.
O anunciante se mistura ao programa, e os entregadores do iFood entram na “casa” pra levar as comidas pedidas – e os “moradores” enaltecem as qualidades do serviço e da comida.
Na sequência, um programa de humor em forma de telejornal (não me lembro o nome). O que aparece? Uma inserção, no meio do quadro, como se dele fizesse parte, sobre o hoteis.com.
Fiquem calmos: não estou descobrindo agora o merchandising.
Sei que, desde que o mundo mediado existe, ele também existe. Não se trata de ficar surpresa com a evolução dos modos de inserção, pra parecer que a propaganda faz parte do programa ou novela.
Nada disso é novidade. A novidade que se apresentou para mim ontem foi a seguinte: temos um cenário inédito na comunicação desde o golpe de 2016.
Há um aumento mais que expressivo no merchandising na programação da Rede Globo, ao mesmo tempo em que desapareceram os anúncios oficiais – Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica, ministérios, programas do governo.
Nada mais enche os cofres de parte da mídia corporativa tradicional – isso se desloca velozmente para o outro grupamento da mídia também tradicional (SBT, Band etc.)
Nos áureos tempos de Lula e Dilma, a propaganda oficial rolava solta, mesmo após semanas e semanas e semanas de muito ataque – nem da Veja, com aquelas capas inesquecíveis, a propaganda sumiu totalmente.
Sabemos por matérias que circulam aqui e acolá que a situação financeira das Organizações Globo não é das melhores.
Pelo contrário. Tudo isso somado, nós podemos tecer um caminho que nos leva à passada geral de pano para o governo – como tem acontecido ultimamente.
É claro que essa perda sozinha não justifica o pano – há um cálculo político da mídia e um alinhamento com a política econômica (?) de Guedes. Mas esse fator importa. E muito.
A despeito de tudo o que significa o poderio global, esse cenário não me deixa feliz. Porque esses recursos estão indo para outros grupos – mais desqualificados, mais reacionários, mais conservadores.
Enfim, mais alinhados à estupidez grassante no governo. Para pensarmos a comunicação e essas composições, é um cenário inquietante. Imaginem só os grupos neopentecostais, com suas TVs e rádios, abarrotados de grana e fazendo propaganda “gratuita” para esse (des)governo em todos os seus programas?
Não gosto do que pressinto… e acho que Bonner, lá no fundo, deve estar sentindo falta de Lula e Dilma.
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