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Piauí precisa de foco na educação

Piauí precisa de foco na educação

O economista, Ricardo Paes da Barros, veio ao Piauí, a convite do governador Wellington Dias, com o objetivo de fazer uma consultoria na área social, segundo ele, o governador quer dobrar o IDH do estado do Piauí. Ele concedeu uma entrevista ao PensarPiauí sobre assuntos voltados para a área social, educação e economia no Brasil e no Piauí.
PENSAPIAUÍ - O Brasil atualmente vive uma crise política e econômica. Como o senhor vê a implementação dos projetos sociais do governo?
RICARDO PAES DE BARROS- Está complicado para o governo implementar os seus programas, porque por um lado nós temos uma grande desorganização fiscal, pois a gente andou gastando mais do que a gente podia, e não foi com a política social, agora está faltando dinheiro para a política social e devido a toda essa crise política, mesmo tendo dinheiro a implementação das políticas sociais está mais lenta do que o usual e quem vai acabar sofrendo com toda essa lentidão e desorganização, obviamente vão ser os pobres.
PENSARPIAUÍ – Qual o seu destaque para o que vai bem e o que vai mal em relação aos projetos sociais do governo
RICARDO PAES DE BARROS – Não podemos confundir os projetos sociais do governo com o governo. O governo vai mal, gastou muito mais do que tinha e nenhum governo estadual, federal ou nenhuma família pode gastar mais do que tem, então, eu acho que tem várias coisas erradas feitas pelo governo, mas, penso que a nossa política social é uma das mais bem construídas que conseguimos fazer nos últimos tempos, embora essa política social que a gente fez, na verdade, foi feita na força bruta, tipo, vamos lá, vamos fazer, vamos resolver o problema, porque o problema da pobreza, da fome, do emprego são problemas urgentes, então, ela foi construída com muita energia, muita força, muita criatividade, mas um pouco ás pressas demais. Ela precisa de um acabamento e precisa que a gente elimine uma série de sobreposições e de coisas que estão incorretamente desenhadas, é como se a gente tivesse construído uma casa desnivelada e agora precisamos nivelar e ajeitar.
A gente construiu uma política social sólida, e o que precisa agora é refinar e melhorar o desenho, para que essa política fique muita mais eficiente e eficaz, sendo perfeitamente possível com menos dinheiro conseguir mais resultado, se conseguirmos arrumar melhor a política. Uma das coisas que a gente fez bem errada, é que construímos uma política social super rica e não construímos junto com ela um sistema de avaliação, então estamos um pouco em apuros, porque sabemos que no conjunto da obra, ela foi muito capaz de reduzir pobreza, desigualdade, gerar inclusão produtiva, mas sabemos exatamente que faltou monitoramente e avaliação, e agora, não sabemos separar o que é muito bom do que não é tão bom assim, sabemos que no conjunto está ok, mas agora temos que dar uma limpada e arrumada e a gente não sabe exatamente quais as áreas que são mais importantes preservar, proteger, melhorar e quais aquelas que a gente tem que revisar com mais intensidade, embora a gente saiba que a política educacional é bem desastrosa e que a política para juventude não deu grandes resultados e tem grandes áreas que a gente tem que dar uma mexida considerável.
PENSARPIAUÍ- Hoje o senhor vem se dedicando a área da educação. O senhor faria um raio x da educação no Brasil hoje, no sentido do que fazer.
RICARDO PAES DE BARROS - Nós somos um país com um gravíssimo problema educacional, nossos jovens hoje tem uma educação que é igual a que a geração passada tinha no Chile, ou seja, a educação da minha geração no Chile é igual a geração do meu filho aqui no Brasil. A educação que o Brasil tem hoje, o Chile tinha 30 anos atrás. Temos um atraso educacional gigantesco, colossal, inexplicável. Pouco mais da metade dos jovens brasileiros tem o nível médio mais ou menos na idade certa, é muito pouco pro século XXI. Nós temos uma educação que pro século XXI não encaixa, e o pior que isso, essa educação perdeu seu significado para a sociedade, por exemplo, o Brasil apesar de ter avançado educacionalmente, a produtividade do trabalho brasileiro está parada, ou seja, nós não estamos conseguindo. Como é que a Coreia deu um salto, ela melhorou em educação e isso se transformou em produtividade, eles produziram muito mais e se tornaram um país desenvolvido, nossa educação não só melhora lentamente, mas ela não se traduz numa sociedade mais produtiva e nós estamos ensinando coisas que necessariamente não são tão úteis assim, os jovens estão percebendo isso e não estão dando a menor bola pro ensino médio.
A base do desenvolvimento de um país é uma população com um ensino médio muito sólido, tanto em termo de cidadania, senso crítico, como pro mercado de trabalho. Vários países fizeram uma melhora da educação quando eram mais pobres que o Brasil hoje, é claro que com mais dinheiro sempre ajuda, mas não por falta de dinheiro que estamos na situação que nós estamos. Vamos aqui fazer uma comparação com um clube de futebol, se eu tivesse mais dinheiro seria melhor, mas com o dinheiro que tenho ainda tem clube ai com time bom ganhando de mim, pode ser que eu não saiba fazer educação e pode ser que eu tenha que cortar um técnico, pode ser que a tenha que trazer uns educadores cubanos ou argentinos pra ensinar pra gente a fazer educação, mas se a gente olhar pra isso, vai que isso também não é verdade. Por exemplo, Pernambuco, Goiás, Rio de Janeiro e Espírito Santo estão dando saltos em educação fantásticos, tem também vários municípios que estão dando saltos em educação, um dos que eu mais gosto é Brejo Santo, no sul do Ceará, que tem uma renda per capta de mais ou menos 300 reais por mês e tem um nível de educação quase europeu. Porque que todo mundo não está conseguindo fazer educação? O nosso problema fundamental em educação é que porque não copiamos os bons exemplos.
Educação, como várias outras coisas na vida, é um questão de foco, se a gente fizer educação de uma maneira dispersa, pensando numa outra coisa, a educação não acontece. A gente precisa focar, não precisamos de educadores de outros países, embora, os que vierem serão muito bem vindos, mas, o que a gente precisa é copiar dos lugares que estão fazendo uma boa educação. O mais importante é que o Brasil desenvolveu um fantástico sistema de monitoramento de educação, porque o MEC e o INEP monitoram tudo, é só você entrar no site do INEP e em dez minutos você vai saber quais são os 100 municípios brasileiros que possuem o melhor desempenho educacional, a gente sabe quem está fazendo a coisa direito, basta ir lá e copiar.
PENSARPIAUÍ – Existe uma recomendação específica para a educação no Piauí?
RICARDO PAES DE BARROS - Em primeiro lugar o Piauí tem que focar na educação. O Piauí deu um salto absolutamente fantástico em termo de pobreza, em termo de inclusão produtiva com base na economia solidária, o Piauí sem miséria, foi um avanço fantástico. Eu acho que o Piauí tem toda a condição e tradição intelectual de ter ótimas escolas públicas no cenário brasileiro, inclusive vem vem ganhando Olimpíadas de Matemática, etc.
O Piauí tem uma tradição de excelência em educação e precisa levar isso a todas as crianças do estado. O governo tem que fazer tudo pela educação, eu acho isso ia ser muito importante para o Estado. A primeira coisa mais importante nesse processo é descobrir quem tá fazendo melhor a educação no estado e copiar, em vez do estado vir com uma regra de bolo, a secretaria estadual de educação deve descobrir que escolas estaduais e municipais estão tendo bom desempenho e copiar. Em vez da secretaria inventar um modelo, ela deve copiar o que está dando certo. O melhor programa p ara promover a educação é visitar uma escola de sucesso e fazer o mesmo.
Fora isso, educação no Piauí é como já falei, é uma questão de foco. Você tem que modernizar o Piauí para a educação. Nós vamos ser um dos estados mais dinâmicos desse país a medida em que a gente tiver uma população mais dinâmica, mais crítica, mais mentalmente rica, agora, temos que focar na educação. A educação é muito intensiva, e o professor é o cara mais importante na educação, então, você tem que ter um programa, que não é necessariamente de aumentar o salário do professor, mas é de atrair as melhores pessoas, com mais talentos, com mais comprometimento com a educação, demitir quem não é comprometido com a educação.
A gente tem que entender que uma criança só tem 10 anos uma vez na vida, e o professor que ela tiver aos 10 anos é muito importante. Eu não posso ter um mal professor na escola, pois ele causa um dano social impressionante, as vezes, a gente é muito preocupado em ter um mal médico num posto de saúde, pois sabe que ele pode causar a morte de alguém e a gente não da muita bola se tem um mal professor na escola, pois esse mal profissional , é um custo pra criança de um ano da vida dela.
PENSARPIAUÍ – O governo do Piauí tem apostado muito na militarização das escolas, temos duas em Teresina e no interior do estado já existe a previsão da implantação de mais duas escolas militares. Como o senhor vê essa educação?
RICARDO PAES DE BARROS – Em relação ao Piauí inteiro, é uma quantidade muito pequena de escolas. Eu, por exemplo, estudei em escola militar e a maior parte de meu senso crítico vem da escola militar, existem várias escolas militares de muito boa qualidade e em geral é mais fácil fazer uma escola militar ser de boa qualidade, porque se tem menos problema de disciplina, mas, provavelmente escola militar não é a solução para nenhum sistema educacional no mundo, nunca foi e nunca será. É muito mais uma exceção e um tipo alternativo de educação, que você vai dar para determinados pais que querem essa educação. Goiás é o primeiro lugar no Brasil em educação média, tem também a suas escolas militares e está aumentando o número delas, mas é um número pequeno, mas não é a solução pra isso, ninguém vai resolver o problema da educação com escola militar, podem ser excelentes escolas, pois não podemos ter preconceito contra elas, mas certamente não vai ser a regra.
PENSARPIAUÍ – Em relação a economia brasileira, o governo Dilma tem apostado no ajuste fiscal. O que o Senhor acha disso?
RICARDO PAES DE BARROS – Eu gostaria que o governo Dilma tivesse apostado no ajuste fiscal, mas a gente não fez nenhum ajuste fiscal sério. A gente precisa desesperadamente fazer um ajuste fiscal. Hoje o governo brasileiro gasta 40 por cento do PIB, e isso é menos do que a gente arrecada de imposto, isso quer dizer que a gente está se endividando.
O que é mais importante pro governo brasileiro, é definir qual é a carga tributária que a gente quer ter. Nós queremos ser um país com a carga tributária que a gente tem? Nós temos a carga tributária maior do que 75 por cento dos países do mundo, só ¼ dos países do mundo se aventuram a ter uma carga tributária maior que a nossa.
Atualmente a gente vive numa sociedade que diz que a carga tributária é 30, mas que gasta 40, mas sabe-se que algum momento ele vai ter que cobrar mais imposto pra pagar a conta, então, no fundo a gente não sabe que país tributário a gente vive, isso impede a gente de alcançar qualquer ajuste fiscal. Eu acho que mais importante que ter esse ajuste de um ano, é a gente tem que fazer uma ajuste pra nossa vida, o Brasil tem que decidir que carga tributária ele quer. Se a carga tributária é x , tem que se comprometer a viver dentro dessa carga tributária x e não ficar o tempo todo dizendo a carga tributária é um número, gasta mais e fica tentando aumentar o imposto pra compensar. Nenhum país do mundo pode viver em desequilíbrio fiscal, nenhum estado, nenhuma família, nenhum indivíduo, e nós estamos vivendo nesse mundo de faz de conta. Isso não quer dizer que tenhamos que cortar qualquer programa social, que tenhamos que cortar os gastos do governo de forma tão radical, nós somos endividados que vamos de banco em banco pedindo dinheiro. O que a gente tem que fazer é o seguinte: é chamar todo mundo e dizer, estou endividado, meu plano pra pagar dívida é esse, tenho uma série de compromissos sociais, portanto, preciso de mais dinheiro emprestado, vou cobrar tanto de imposto, vou pagar tanto e pagar dessa maneira, logo que o Brasil fizer isso, ele vai deixar de sentir essa pressão toda, porque vai ter um monte de gente querendo emprestar dinheiro, por que somos atraentes e tem muitos países querendo investir no Brasil, só que atualmente o Brasil é uma incógnita, pois eles não sabem quanto vão pagar de impostos nem como a dívida será paga. É mais uma questão de organização, planejamento e disciplina do que na verdade uma questão de falta de dinheiro.
Quem é Ricardo Paes de Barros
É professor titular da Cátedra Instituto Ayrton Senna no Insper e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Ciências para Educação do Centro de Políticas Públicas – CPP.
É graduado em engenharia eletrônica pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), com mestrado em estatística pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e doutorado em Economia pela Universidade de Chicago. Possui pós-doutorado pelo Centro de Pesquisa em Economia da Universidade de Chicago e pelo Centro de Crescimento Econômico da Universidade de Yale.
Integrou o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) por mais de 30 anos, onde realizou inúmeras pesquisas focadas em questões relacionadas aos temas de desigualdade e pobreza, mercado de trabalho e educação no Brasil e na América Latina. Entre 1990 e 1996, Ricardo foi professor visitante da Universidade de Yale e, entre 1999 e 2002, diretor do Conselho de Estudos Sociais do IPEA. Entre 2011 e 2015, foi subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
Como acadêmico, publicou diversos artigos e livros sobre seus temas de pesquisa, recebendo importantes prêmios em reconhecimento ao seu trabalho. Entre eles, cabe destacar o Prêmio Haralambos Simeonidis em 1995 e em 2000 e o Prêmio Mario Henrique Simonsen em 2000. Ricardo foi agraciado com a comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico em 2005, eleito membro titular da Academia Brasileira de Ciências em 2010 e recebeu, em 2012, a primeira edição do Prêmio Celso Furtado em Estudos Sociais, oferecido pela Academia Mundial de Ciências (The World Academy of Sciences – TWAS).
Em 2015, Ricardo PB deixou o serviço público e assumiu a Cátedra Instituto Ayrton Senna no Insper, onde se dedica ao uso de evidência científica para identificação de grandes desafios nacionais e para a formulação e avaliação de políticas públicas, cobrindo os temas de produtividade do trabalho, educação, primeira infância, juventude, demografia, imigração, além dos tradicionalmente recorrentes em sua trajetória, desigualdade, pobreza e mercado de trab

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