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Perseguição a acadêmicos e universidades no Brasil é destaque em relatório internacional

Publicação internacional traz também, pela primeira vez, um capítulo dedicado ao Brasil

Foto: Google ImagensBrasil é destaque negativo em relatório internacional
Brasil é destaque negativo em relatório internacional


Com cinco edições publicadas, o relatório anual Free to Think traz na capa da edição de 2019 uma imagem de estudantes protestando no Rio de Janeiro em maio contra cortes de orçamento e bolsas anunciados pelo governo federal, capturada por Ricardo Moraes, da agência Reuters.

Pela primeira vez, segundo a BBC, o Free to Think ("Livre para pensar", em tradução livre) traz também um capítulo dedicado ao Brasil, afirmando que "pressões significativas no ensino superior brasileiro aumentaram na véspera e no período posterior às eleições presidenciais de 2018". Nas edições anteriores, o Brasil não foi mencionado.

O relatório cita também declarações de membros e iniciativas do governo federal brasileiro sobre o corte de investimentos para instituições e disciplinas específicas, como a sociologia e a filosofia; apresenta ainda ações que, de acordo com o documento, limitam a autonomia das universidades; e episódios de pressão, por agentes policiais e civis com motivações políticas, contra campus durante e depois das eleições presidenciais.

"A rede, que está celebrando 20 anos de existência, recebeu em sua história 34 solicitações desse tipo vindas do Brasil — 30 delas no último ano, o que fez a rede acompanhar mais de perto a situação do país e depois incluí-lo no relatório", relata a BBC.

O relatório apresenta, por exemplo, declarações do ministro da Educação, Abraham Weintraub, e do presidente Jair Bolsonaro. Numa entrevista de abril, Weintraub afirmou que as universidades federais Fluminense (UFF), da Bahia (UFBA) e de Brasília (UnB) teriam cortes de verba por promover "balbúrdia" em vez de buscar excelência acadêmica, segundo ele. Outra fala incluída no documento foi referente às disciplinas de filosofia e sociologia, que de acordo com o ministro poderiam ter verbas para seus cursos cortadas por não serem rentáveis.

Esta posição foi endossada por Bolsonaro no Twitter, onde ele escreveu que a medida teria o objetivo de "focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte, como veterinária, engenharia e medicina".

"A situação (no Brasil) é preocupante", afirma Robert Quinn, diretor executivo da organização sem fins lucrativos que produz o relatório, a rede internacional Scholars at Risk ("Acadêmicos em risco"), baseada na Universidade de Nova York. "O embate entre o poder e as ideias, ele diz, acontece há séculos — mas há "algo diferente hoje", observa.

"Acho que o maior sintoma de todos no Brasil, pois é algo que se observa historicamente, voltando literalmente a séculos atrás, é a construção artificial do 'outro' por aqueles que estão no poder. Esta criação não se vale do conhecimento, da racionalidade ou de evidências, mas de emoções, energia negativa e uma remissão a um passado imaginário 'puro", declara.

Além de ações do governo federal, o relatório aponta para decisões de juízes e ações policiais em universidades no contexto eleitoral, motivadas por acusações de que estudantes e professores estariam se manifestando partidariamente em espaços públicos.

Foi o caso do confisco, por decisão judicial, de uma faixa pendurada na Universidade Federal Fluminense (UFF) com as palavras "Direito UFF Antifascista"; ou de folhetos de uma associação de docentes da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) intitulados Manifesto em defesa da democracia e das universidades públicas.

O relatório Free to Think lembra também que, no final de outubro de 2018, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia concedeu medida cautelar suspendendo ações de busca e apreensão, autorizadas por juízes de Tribunais Regionais Eleitorais, em universidades de todo o país.

Do período eleitoral, o documento denuncia ainda relatos de ataques e assédios de grupos civis com motivações ideológicas contra estudantes da Universidade de Fortaleza (Unifor); Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio); Universidade Federal do Pará (UFPA); e Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

O relatório apresenta recomendações específicas para o caso brasileiro, como a investigação e eventual punição de autores de incidentes em que membros da comunidade universitária tenham sido colocados em risco; e o recuo de declarações e políticas que estigmatizem e ataquem o ensino superior do país.

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