Pensar Piauí

O que nunca te disseram sobre os supermercados (e nem vão te dizer)

"As indústrias do agrotóxico e do 'lucro-a-qualquer-custo' estão vencendo… mas vamos trabalhar para isso mudar", escreve João Paulo Pacífico

Foto: DivulgaçãoSupermercado
Supermercado

Por João Paulo Pacífico, no Brasil 247

Daniella e Roberto tinham uma vida consolidada, trabalhavam em grandes empresas de São Paulo, mas sentiam que faltava algo... queriam um sentido mais forte no trabalho e nas suas vidas.

Assim, numa decisão bastante corajosa e ousada, pegaram as duas filhas, se mudaram para Goiânia e resolveram se dedicar a algo que causasse impacto social e ambiental!

Criaram a Fazenda da Mata, cujo objetivo era plantar orgânicos em maior escala, o ano todo e a um preço acessível. E especialmente levando dignidade aos trabalhadores (sabia que ainda tem muita exploração no campo? Assista ao filme “Pureza” e entenderá).  

Criaram a marca, organizaram o plantio de 30 variedades de hortaliças, que cuidavam com o maior carinho. Conseguiram as certificações tanto de orgânicos como de empresa B e começaram a fechar acordos com os grandes mercados.

Porém, a história que tinha todos os ingredientes para ser uma inspiração começou a virar pesadelo…

Após seguidos elogios, o supermercado CA (vou omitir os nomes para evitar problemas) os convidou para colocar os seus produtos em 12 lojas de Brasília. Mas para isso deveriam aumentar a produção.

Roberto e Dani investiram, dobraram o custo mensal, mas o executivo do supermercado saiu da empresa e o seu substituto simplesmente ignorou o combinado.

Não atendia telefone, não respondia mensagens...

Diante desse impasse, custos altos, produção de alimentos bombando, conseguiram se posicionar com o outro grande grupo supermercadista. Para entrar em uma loja, tiveram que investir uma boa quantia em equipamentos de venda do supermercado (onde já se viu, para “ter o privilégio de vender”, o agricultor tem que investir no supermercado que vale bilhões).

Entraram lá. Começaram a vender bem… até que foram pegos de surpresa com uma tática maldosa, a chamada “quebra”. O mercado de forma unilateral diz quanto foi a quebra (perda por produtos que não estavam em conformidade e outras desculpas) e só paga o que “ele define” que deve pagar.

Eles chegam a dar um desconto de até 60% no valor das mercadorias entregues. Imagine que você produz e entrega R$ 10 mil em produtos de boa qualidade, mas o gigante supermercadista define que você só vai receber R$ 4 mil.

Por diversas vezes, conseguiram descobrir que tais produtos “da quebra” estavam nas gôndolas. E que isso era só uma estratégia para pagar menos aos fornecedores.

Mas o casal continuou acreditando e insistindo. Com o aumento dos custos, pediram para reajustar os preços. Claro que o mercado disse que não, mas aumentou o valor das verduras e legumes para o cliente final.  

A mesma empresa que faz propaganda dizendo que quer clientes felizes, tem uma opinião beeem diferente quando o assunto é fornecedor. Um dos lemas que escutaram de pessoas do supermercado é: “se o fornecedor está feliz, algo está errado”...

Os produtos da Fazenda da Mata já estavam em mais de 80 pontos de venda, entregando diariamente cerca de 10 mil itens orgânicos de alta qualidade, mas não estavam conseguindo pagar as contas. Até que tomaram uma decisão: “vamos repensar tudo”.

Pausa para reflexão: eles largaram a vida de SP, criaram um negócio com produtos saudáveis, conseguiram entrar nos maiores supermercados do país, mas se viram no meio de um sistema injusto e predatório.

Mais uma vez tiveram que ter coragem... Não foi fácil. São muitos sonhos envolvidos. Que caminho escolher pra não abrir mão do propósito e conseguir continuar impactando?

Depois de muito refletirem, decidiram encerrar as relações comerciais com esses “grandes grupos supermercadistas”.

Ao avisarem o supermercado PA que iriam deixar de ser fornecedores, o executivo que os prejudicava, implorou para eles reconsiderarem a decisão. Nos dias que se seguiram, a “quebra” zerou. Isso mesmo, todo aquele desconto que o supermercado inventava, deixou de existir.

Mas já era tarde.  Decisão tomada. 

A partir de agora, a Fazenda da Mata irá se dedicar a produção de batata doce orgânica para exportação. Pois, fora do país as relações comerciais são honestas e justas

Triste ver que o sistema fez com que tivessem que deixar de produzir alimentos para a nossa população.

E, por uma questão de sobrevivência, mudar para exportação de batata doce.

Também se aproximaram de agricultores familiares assentados da reforma agrária para ajudá-los a produzir e exportar (imagine como é relação de exploração dos pequenos agricultores com os grandes grupos).

Agora, a Fazenda da Mata quer se fortalecer, para no futuro voltar ao sonho de produzir alimentos orgânicos para os brasileiros.

E de quem é a responsabilidade?

Toda empresa tem uma função social. Mas algumas esqueceram disso, não só quando quebram fornecedores, mas quando envenenam cachorro, quando agridem crianças negras ou matam João Alberto.

Enquanto isso, mais da metade da população está em insegurança alimentar e boa parte se alimentando mal.

Por enquanto, as indústrias do agrotóxico e do "lucro-a-qualquer-custo" estão vencendo… mas vamos trabalhar para isso mudar.

Te convido a refletir... sabe aquela alface (sim alface é feminino), que você comeu ontem? Onde você comprou? Será que o agricultor que plantou recebeu um valor justo ou ele vive de forma precária? Ele consegue plantar orgânicos ou o sistema dos transgênicos-agrotóxicos o engoliu?

Com carinho e esperança,

joão

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