Pensar Piauí

O enigma está nos quase 40% que não se definem ideologicamente

O foco são os 40%

Foto: Ilustração40%

Por Rudá Ricci, cientista social, no X 

A última pesquisa Datafolha reforçou a certeza de que a extrema-direita oscila ao redor de 30% dos brasileiros. Nem todos são bolsonaristas, mas professam valores racistas, machistas e até fascistas. A questão é: quem são os outros 70%? Este é o fio de hoje.

31% declaram que admiram o PT. Então, sobram 39% sem identidade ideológica. Mas, vale a pena uma parada para entendermos o que são esses 31%.

Há pesquisas que indicam que nem todos brasileiros que se autodefinem ideologicamente são coerentes com esta escolha. Pedro Henrique Marques, em seu ensaio "Dimensão e Determinantes do Pensamento Ideológico entre os Brasileiros" observa que apenas 22% são coerentes

A própria direção do PT revela uma baita incoerência, caso do vice-presidente do partido (Quá Quá), o conhecidíssimo defensor de bolsonaristas e antigos aliados de Sérgio Cabral

Os que se autodefinem como esquerda são mais coerentes que os que se autodefinem de direita, numa proporção de 2 para 1. Mas, aí, entramos em outra seara.

O lulismo vem educando o campo progressista a jogar toda sua energia nas eleições. Política, nesta concepção, se resume à disputa pela prenda: ganhou, vai feliz para a casa. Incentiva a dispersão no dia seguinte à vitória eleitoral

Já a extrema-direita brasileira copia o que a esquerda foi nos anos 1980 e 1990: não se dispersa nem mesmo na derrota eleitoral. Perdem e reagem e, assim, se mantém na ofensiva e a base eleitoral não se desmobiliza.

Então, até mesmo os 31% da base social do PT não são necessariamente articulados e mobilizados. Ao contrário, não está sendo raro se desesperarem e socializarem seus temores. Justamente o contrário do que ocorria quando o PT não governava o Brasil.

Mas, o enigma está nos quase 40% que não se definem ideologicamente. Afinal, o que comem? Onde vivem? O que fazem?

Aqui reside os caminhos da política brasileira. Vai muito além da questão religiosa, mas de um "silêncio profundo" que está encrustado na sociedade brasileira. Quase sempre, estamos confundindo estes "silenciosos" com a base bolsonarista. São diferentes.

Os 40% não definidos ideologicamente perfazem mais de 62 milhões de eleitores. Com eles, se faz barba, cabelo e bigode. Até pouco tempo, sabíamos que a grande maioria era composta por mulheres. Mas, hoje, não temos este tipo de recorte para análise.

Termino este fio enigmático sugerindo que estamos jogando nossas energias no lugar errado: não podemos nos restringir às eleições e não devemos acreditar que o foco é a base social da extrema-direita. O foco são os 40%.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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