Política

Lula, em Paris, perde chance de corrigir erro (por Eduardo Fernandez)

Em todos os países há movimentos que buscam definir políticas para uma “justa” distribuição dos ônus para se reverter a degradação ambiental


Foto: Ricardo StuckertLula e Macron se encontraram em Paris nesta quarta-feira (17)
Lula e Macron 

 

Por Eduardo Fernandez Silva, economista, na Coluna do Noblat, no Metrópoles  

Na semana de 18/06/23 Lula participou de diversas reuniões importantes na Europa. Em Paris solicitou, mais uma vez, que os países ricos paguem para ajudar os pobres a fazerem os ajustes indispensáveis para minorar a crise social/climática/ambiental. Esse pleito é antigo, feito pelo Itamaraty e outros há muito tempo, décadas talvez. É, no entanto, um pleito equivocado.

Sabe-se que há, nos países ricos, milhões de pessoas pobres. Em janeiro de 2022 – mês de inverno congelante em grande parte do país – o governo dos EUA estimava 580 mil pessoas sem teto. Há décadas, a parcela de pobres naquela população gira em torno de 10 a 13%. Já nos chamados “países pobres” há muitos milionários e bilionários. Destes, hoje há 51 no Brasil, de acordo com a Forbes. Assim, fica a pergunta: por que deveriam os pobres dos países ricos pagar para os milionários dos países pobres? Assim formulado, o pleito dá margem a ser descartado, como tem sido, com base na bem fundada crítica de que parte dos recursos eventualmente aportados seria apropriada pelos mais ricos, em diversos esquemas corruptos.

Por outro lado, está bem estabelecido que os principais poluidores são os mais ricos, do Norte e do Sul, por seu padrão de consumo e investimento: viagens de jatinho, uso de SUVs, descarte acelerado de produtos e acompanhamento da “última moda”, consumo conspícuo para se sentirem “superiores” e ainda gestão e apoio a empresas que, pelo lucro, não se importam de degradar o ambiente e a qualidade de vida das comunidades onde operam. Não há razão para os pobres, seja lá, seja cá, pagarem para consertar o que principalmente os ricos, de cá e de lá, estragaram e continuam a estragar. Também não há razão para excluir os ricos de cá de contribuírem para a necessária reconstrução. Não se trata de propor “nós contra eles”, mas sim de buscar equilíbrio entre ônus e bônus.

Em todos os países há movimentos que buscam definir políticas para uma “justa” distribuição dos ônus para se reverter a dupla degradação, social e ambiental. Suas propostas não colocam a questão em termos de países; todas focam a distribuição da renda nacional. Todos esses movimentos incluem pessoas pobres – lembrem-se do “Somos os 99%”! -, que não têm razão para apoiar o pleito se formulado em termos de países. Somarão, porém, caso a demanda seja feita baseada na responsabilidade pela poluição, por um lado, e capacidade financeira de contribuir para mitigá-la, por outro.

Estudo recente mostra que um imposto de apenas 1% sobre as fortunas superiores a um milhão de libras esterlinas, na Inglaterra, seria suficiente para arrecadar o que se estima aquele país deveria aportar ao Fundo de Reparação de Danos, criado em Paris na COP27 e ainda inoperável pela resistência dos “países ricos”. Há diversos outros estudos com conclusões semelhantes. Vale destacar, ainda, que pagar um por cento sobre a parcela da fortuna excedente a um milhão de libras esterlinas mal será percebido por tais milionários.

A insistência em colocar a questão da justiça climática, social e ambiental em termos de países, e não em termos de grupos de renda, aliena parcela substancial das populações em todo o planeta. Perdem-se apoios potenciais importantes. Perde-se também foco, tempo para analisar e refinar as propostas existentes e articular ações conjuntas, inclusive para redirecionar as práticas das agências de financiamento, internacionais e locais. Em suma, continua-se a percorrer uma trilha que se revela sem fim e sem resultados…

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