Pensar Piauí

Jacinta Andrade: um residencial que homenageia as mulheres

Quem foi Jacinta Andrade, mulher que dá nome ao maior residencial popular do Piauí?

Foto: Montagem pensarpiauiResidencial Jacinta Andrade
Residencial Jacinta Andrade

O maior conjunto residencial popular de Teresina, construído em 2013, é localizado na zona Norte e constituído por 4.300 unidades habitacionais. Recebe o nome de Jacinta Andrade. Quem terá sido essa mulher para receber tamanha homenagem?

Atuante no movimento popular de Teresina, Jacinta Andrade era natural da zona rural de Demerval Lobão, filha de trabalhadores rurais e aos 11 anos de idade, em 1971, foi morar com a madrinha em Teresina."A família era dona das terras em que morávamos de agregado”, conta a irmã, Clara de Aquino, que também veio morar na capital e ambas se tornaram vizinhas, na rua 24 de janeiro, centro de Teresina.

Foto: DivulgaçãoJacinta Andrade
Jacinta Andrade

Jacinta foi aluna das antigas freiras do convento que deu origem ao Instituto Dom Barreto, que na época ofereciam um curso à noite para as empregadas domésticas. Casou com o comerciário José de Ribamar, com quem teve dois filhos, e foram morar no Mocambinho e depois no bairro Redonda, onde conseguiram casa própria, mas logo depois veio a separação. Nessa época, a irmã, que já participava do movimento estudantil, convidou Jacinta para fazer parte, numa tentativa de ajudá-la a superar aquele momento.

Foi assim que ela ingressou na Associação de Moradores do Redonda, tornando-se diretora de Assuntos Comunitários, e, em 2001, na Federação das Associações de Moradores e Conselhos Comunitários (FAMCC), como secretária e depois diretora da equipe de Gênero, formada exatamente para combater a violência contra as mulheres. Ironicamente, Jacinta teve sua história de vida interrompida aos 40 anos, quando foi brutalmente assassinada pelo então namorado.

"Jacinta sofreu do que se chama hoje de feminicídio. Uma pessoa negra, pobre, lutadora, mas que infelizmente teve sua história abreviada. Quando decidimos homenagear alguém, buscamos uma pessoa de luta, guerreira, que sempre buscou seus direitos e que fazia parte da luta promovida pela coletividade por melhores condições de moradia. Nossa intenção era resgatar sua história e homenagear também a irmã que sempre esteve na luta com ela”, lembra o professor Marcelino Fonteles, que na época era diretor presidente da Agência de Desenvolvimento Habitacional, órgão responsável pela obra do residencial Jacinta Andrade.

"Jacinta era militante do movimento popular e amiga das comunidades", relata Neide Carvalho, ex-presidente da FAMCC. A irmã de Jacinta, Clara de Aquino, hoje integra a equipe da Agência de Desenvolvimento Habitacional do Piauí. "A gente não deseja isso pra ninguém, pra família nenhuma. Jacinta era muito alegre, divertida, gostava de dançar, sorrir, participar das manifestações, mas era ao mesmo tempo uma pessoa acanhada, tranquila, boa mãe, sempre presente”, lembra.

O residencial, que leva o nome da sua imã, tem uma particularidade: suas ruas também receberam nomes de mulheres que se destacaram, ao todo 26, sete delas piauienses. A avenida principal do conjunto ganhou o nome da deputada federal Francisca Trindade, política oriunda do movimento de jovens do bairro Água Mineral e que faleceu vítima de AVC em 2003, com apenas 37 anos.

Foto: DivulgaçãoFrancisca Trindade
Francisca Trindade

A escritora Amélia Beviláqua, nascida em Jerumenha, também foi homenageada. Em 1902 liderou a revista "O Lírio", em Recife, e influenciou na criação do periódico "Borboleta". Amélia foi a primeira mulher teresinense a se candidatar a uma vaga na Academia Brasileira de Letras. 

A escrava Esperança Garcia também dá nome a uma das ruas. Em 1770, ela escreveu uma carta ao então governador do Piauí denunciando maus tratos e relatando ideais de liberdade. Graças a ela foi instituído o Dia Estadual da Consciência Negra.

A jovem Jovita Feitosa transcendeu sua época e pediu permissão para lutar pela pátria na Guerra do Paraguai, mesmo quando as mulheres eram proibidas. Outra homenageada é a trabalhadora rural Antônia Flor, vítima de pistolagem em um conflito agrário que se estendeu por mais de meio século e colocou a cidade de Piripiri no livro "Assassinatos do Campo", editado na década de 1980.

Leonice Ribeiro de Almeida (Nicinha), considerada a eterna rainha do carnaval piauiense, também dá nome à rua do residencial, e foi encontrada morta há 20 anos. Maria dos Anjos Sousa Brito, de Luzilândia, também foi homenageada e contribuiu na organização de mulheres para aquisição de créditos e benefícios no meio rural. Assim como ela, Santinha (Maria dos Santos Rodrigues), que foi presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Acauã e morreu num acidente quando levava o grupo para participar da Marcha das Margaridas em Brasília, também teve sua história imortalizada nas ruas do Jacinta Andrade.

Foto: Arquivo PessoalClara de Aquino
Clara de Aquino

ÚLTIMAS NOTÍCIAS