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Entidades ressaltam caráter privatista do PL 3453/15

Entidades ressaltam caráter privatista do PL 3453/15

Convidados para a audiência pública que discutiu o Projeto de Lei 3453/15 nesta terça (25/10), FNDC, Intervozes e Proteste alertaram os deputados para o retrocesso que a aprovação da proposta significará para o direito à comunicação no país. Renata Mielli, coordenadora geral do Fórum, afirmou que alterar a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) – Lei 9.472/1997 nos moldes da proposta em debate significa privatizar os serviços de telecomunicações e extinguir a possibilidade de universalização da banda larga no país. A proposta, de autoria do deputado Daniel Vilela (PMDB-GO), acaba com as concessões de telefonia fixa, transfere o patrimônio da União para a iniciativa privada (em forma de bens reversíveis) em troca de investimentos em banda larga e transforma em renovações perpétuas as atuais licenças de frequências de telecomunicações. “Na prática, o que esse projeto propõe é que o Estado brasileiro dê às empresas o privilégio de explorar o serviço sem tempo determinado e sem qualquer exigência regulatória. Isso vai comprometer a universalização desses serviços e extinguir a garantia de que todos possam ter acesso a eles com tarifas justas, além de transformar o Estado em refém dessas empresas”, afirmou Renata. A LGT, lembrou a jornalista, prevê a existência de dois tipos de regime de prestação de serviços: o privado e o público. No primeiro, estão todos os serviços tidos como não-essenciais. No segundo, estão os serviços essenciais e de interesse coletivo, prestados sob a observância de critérios como garantia da universalização. Atualmente, apenas a telefonia fixa é prestada como serviço público, embora diversas organizações da sociedade civil defendam o acesso à banda larga também como serviço essencial. A jornalista lembrou que a prestação de um serviço como público garante que ele chegue não somente onde há interesse econômico. Outro ponto negativo do PL é a transformação do valor dos bens reversíveis à União ao fim do período de concessão em investimentos privados. “Quando essas empresas entraram no mercado, passaram a atuar com base numa infraestrutura já existente que foi concedida para ser explorada por um tempo determinado por essas empresas e que retornariam para o Estado ao final do período de concessão”, observou Mielli. A advogada Flávia Lefèvre, representante da Proteste, afirmou que o valor dos bens reversíveis à União valem mais de R$ 100 bilhões, e não cerca de R$ 17 bilhões, conforme as estimativas divulgadas pelo governo. Os dois valores, afirmou, foram encontrados pela própria agência reguladora, em épocas distintas. “Em 2012, a distribuição dos bens reversíveis pelo valor de aquisição, conforme a Anatel, era de R$ 108,3 bilhões. Em 2013, a Anatel estimou o valor das redes de transporte e de acesso em R$ 71 bilhões. Entretanto, agora fala em R$ 17 bilhões a título de trocar os bens reversíveis por investimentos em redes privadas, desvinculadas de obrigações de universalização, continuidade e modicidade tarifária”, lamentou ela. Lefèvre também alertou que as alterações propostas no projeto são insuficientes para garantir que o setor se desenvolva de modo sustentável, e de acordo com a finalidade de inclusão digital, estabelecida no Marco Civil da Internet. Para ela, a mudança do regime de concessões para o de autorizações vai concentrar ainda mais a oferta de serviços nas grandes empresas monopolistas. Ela ressaltou que as entidades da sociedade civil não são contra a discussão do marco regulatório das telecomunicações, mas que essa discussão precisa ser feita de forma ampla, e não somente a partir dos interesses econômicos do setor empresarial. Representando o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, o jornalista Jonas Valente questionou a transferência do patrimônio público ao setor privado no momento em que país discute um pesado ajuste fiscal. “É preciso ter zelo com a coisa pública, e o zelo com a coisa pública não significa entregar cerca de 100 bilhões de reais para as empresas de telecomunicações”. Valente rebateu o argumento de que esse patrimônio esteja tecnologicamente defasado. “Já há tecnologia voltando a trabalhar com os pares de fios de cobre para garantir acesso à banda larga. Então, para que vamos abrir mão desse patrimônio?”, observou. Para o ativista, a LGT é muito clara quando institui as obrigações do poder público de garantir a prestação desses serviços aos cidadãos e de instituir como direito desses cidadãos o acesso aos serviços essenciais. “O Marco Civil da Internet reforça essa compreensão em seus artigos 4ª e 7º, dizendo que a internet é um serviço essencial. E nesse sentido o Brasil não inventa, mas acompanha um debate que é internacional”. Falar de modernização do setor, observou Valente, “não é falar de manter metade da população sem acesso à internet, mas garantir que esses serviços cheguem ao conjunto dos seus cidadãos, é reconhecer que cada vez mais países hoje aprovam a internet como direito, e esse PL não cumpre esse papel”. As entidades participantes da audiência pública integram a Campanha Banda Larga é um Direito Seu e a Coalizão Direitos na Rede. O debate foi realizado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e foi requerida pelos deputados Chico Alencar, Ivan Valente, Jefferson Campos e Thiago Peixoto. Também participaram do debate Paulo José Rocha Júnior, procurador da República, a advogada Flávia Lefèvre, da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste); Rafael Zanatta, pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); Eduardo Levy Cardoso Moreira, representante das teles; Juarez Quadros do Nascimento, presidente da Anatel; André Müller Borges, secretário de Telecomunicações do Ministério da Ciência e Tecnologia, Inovações e Comunicações; e Marcos Ferrari, representante do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Inconstitucional O procurador José Paulo Rocha alertou os deputados de que se o PL for aprovado como está trará sérios problemas constitucionais e poderá ser questionado pela Procuradoria Geral da República (PGR), se não for modificado. “O que nos preocupa é a falta de licitação. Como vai reverter uma oportunidade de negócio para um agente privado e não oferecer para outro?” indagou o procurador.

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