Política

Bolsonaro quer liberdade acima da vida, mas tenta tomar celular de youtuber

Um membro da equipe de Bolsonaro chegou a tentar impedir que o repórter do G1, que registrou toda a cena, continuasse gravando - sem sucesso

  • quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Foto: ReproduçãoAgressão a youtuber
Agressão a youtuber

 


Por Leonardo Sakamoto, jornalista, no Facebook 

Faça o que eu digo, não faça o que eu faço. O presidente Jair Bolsonaro ignorou a lição que sistematicamente tem dado a seus seguidores, de que a "liberdade é mais importante que a vida", e tentou impedir a gravação de um youtuber que o criticava, nesta quinta (18), em Brasília.

Wilker Leão, que tem um canal voltado à temática militar, apresenta-se como cabo do Exército e critica tanto apoiadores do presidente quanto petistas, foi empurrado e caiu no chão após fazer perguntas provocadoras a Bolsonaro enquanto ele falava a seguidores na porta do Palácio do Alvorada.

Após ser derrubado, xingou Jair de "vagabundo", "safado", "covarde" e "tchutchuca do Centrão". E perguntou: "O senhor vai pedir para o pessoal do GSI [Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República] me tirar de um local público?"

Jair chegou a entrar no seu carro oficial, mas diante dos gritos, vai em direção a Leão, diz que quer falar com ele e, surpreendentemente, puxa o rapaz pela gola da camisa, coloca a mão no celular para impedir a gravação e o segura pelo braço. Os seguranças então empurram Leão para longe.

Um membro da equipe de Bolsonaro chegou a tentar impedir que o repórter do G1, que registrou toda a cena, continuasse gravando - sem sucesso.

Como o caso pode causar ruídos de imagem em meio à campanha eleitoral, assim que os ânimos de acalmaram, Leão foi levado para entrevistar Bolsonaro. Na conversa, trataram de temas como mudanças na lei da delação premiada, orçamento secreto e aliança com o centrão.

O caso aponta que a defesa da liberdade de expressão vale para o presidente e seus aliados, que mentem para erodir a credibilidade das urnas eletrônicas e das vacinas contra covid-19. Mas não para a imprensa ou críticos ao seu governo. Pode-se criticar os xingamentos do youtuber, mas a reação destemperada do presidente choca.

E essa reação, somada àquela que ele teve horas depois, em São José dos Campos (SP), quando questionado por jornalistas sobre as mensagens que defenderam um golpe de Estado em caso de vitória de Lula, trocadas em um grupo de ricos empresários bolsonaristas, mostra que o presidente não está nos melhores dias.

Nervoso, ele primeiro tentou atacar o mensageiro, ou seja, a coluna do jornalista Guilherme Amado. E diante da explicação de que há meses de prints comprovando as postagens, simplesmente disse que era "fake news".

Presidente foi apontado pela Fenaj como maior agressor de jornalistas

Bolsonaro se consolidou como a maior ameaça ao exercício da liberdade de imprensa no país segundo Relatório da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil, elaborado pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), sobre o ano de 2021, divulgado no começo do ano. O presidente aparece como o principal agressor, responsável por 147 casos registrados, ou 34,19%. No total, foram 430 casos em 2021, dois a mais que o ano anterior.

O número é menor que os 175 registros (41%) de 2020, em que ele também aparecia no triste primeiro lugar. Neste ano, foram 18 agressões verbais a jornalistas e 129 episódios em que atacou a credibilidade da imprensa.

Dirigentes da EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), empresa pública sob responsabilidade do governo federal, responderam por 142 casos - ou 33,02% dos registros, principalmente por conta da censura baixada durante a atual gestão. Ou seja, sob comando de Bolsonaro. Depois disso, em terceiro lugar, vieram políticos e seus assessores, com 9,3%.

O relatório aponta que 4,65% dos casos registrados partiram de bolsonaristas.

Não é necessário que o presidente demande uma ação - apesar de não duvidar que ordens nesse sentido sejam repassadas a fãs, apoiadores e seguranças. Seu comportamento e seus discursos, acusando outros de mentirem quando a narração dos fatos lhe desagrada, alimentam as milícias que agem para defendê-lo, tornando a vida dos trabalhadores da imprensa um inferno.

Mesmo a omissão do presidente diante do comportamento desses grupos os incentiva a punir, nas redes e fora delas, aqueles que fiscalizam seu líder e denunciam as irregularidades que ele comete. O ensurdecedor silêncio do presidente da República enquanto equipes de afilhadas da Globo e do SBT eram agredidas por seus seguranças e fãs, em Itamaraju (BA), no dia 12 de dezembro de 2021, é um exemplo. Uma repórter levou um mata-leão.

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