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Economista

Acilino Madeira

Economista

Miséria invisível e os novos cativos

Foto: ObviousOs liberais tupiniquins estão assustados?
Os liberais tupiniquins estão assustados?

 

Foi no governo Bolsonaro, na pandemia do Covid-19, que os fantasmas da exclusão (política, econômica e social), no Brasil, materializaram-se. Esqueletos pularam de dentro dos caixões e dos armários para assustarem os liberais tupiniquins da hora.

Se puxarmos pela memória, recordaremos que o discurso bolsonarista, seja na fala do próprio presidente da República ou de seus fiéis seguidores, parecia a de um papagaio: quando diz o que sabe, mas não o que diz - como no velho ditado. Havia sim uma nítida entonação de falsidade. Repetia-se a mesma ladainha professada pela teoria econômica neoclássica. Esta até então sustentava, em corpo e alma, o liberalismo econômico e suas derivadas crenças. Dentro destas, a de que os indivíduos têm racionalidade ilimitada em um mundo de informações simétricas, onde não cabem os riscos e as incertezas.

Como se tudo desse certo no final, sem precisar combinar com os russos ou mesmo com os chineses. Os liberais brasileiros se deixaram influenciar muito mais pelo conservadorismo de gente de caráter corroído, como Olavo de Carvalho e Donald Trump; do que pelos sinais de mudanças enunciados pelos novos protagonistas na geopolítica global, a exemplo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Por cegueira e despreparo, a política externa brasileira foi tocada de forma tosca. O governo Bolsonaro criou uma série de contratempos e narrativas equivocadas que só causaram prejuízos econômicos desnecessários.

Renascido sob as bênçãos da ultrapassada Escola de Chicago, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tornou-se o representante máximo do pragmatismo tomado de herança do mainstream econômico internacional. Todas as indagações sobre medos, riscos e incertezas foram reportadas e encaminhadas ao seu Posto Ipiranga – uma espécie de oráculo ou Mãe Diná para o Bolsonaro e sua malta de conservadores de carteirinha verde amarela, com chancela do Tio Sam.

Os novos liberais conservadores brasileiros desprezaram as instituições nacionais, zombaram da objetividade da norma científica e estabeleceram regras esdruxulas para o revisionismo da cultura brasileira – como se o nosso legado histórico fugisse aos padrões da ética protestante (neo) pentecostal e do espírito do capitalismo financeiro. Montados em seus cavalos de batalha, animados pela generosa ração ofertada por parte da burguesia mercantil nacional; estes novos atores ganharam as eleições em 2018, utilizando-se de um marketing político impulsionados por fakes news e muito apoio financeiro.

Logo que o governo se estabeleceu, Bolsonaro e seus ministros e secretários impuseram uma pauta de costume para a negação de direitos, desconhecimento sobre as mazelas criadas pelo racismo estrutural, naturalização da alta concentração de renda e não reconhecimento das abundantes desigualdades na sociedade brasileira.

As providências tomadas pelo governo Bolsonaro foram no sentido de redução do Estado, aceleração do processo de privatização das estatais, descompromisso com as políticas públicas nos campos da educação, saúde e segurança pública. As universidades públicas foram desclassificadas, o SUS passou a ser atacado e satanizado.  A ciência brasileira foi tratada de forma vil, bem como os cientistas. Todas as políticas em defesa do meio ambiente foram atacadas de forma cruel

O governo Bolsonaro herdou de Temer a Reforma Trabalhista, em molde liberal, que havia flexibilizado as relações de trabalho ao máximo. Conseguiu com o apoio do Congresso Nacional empreender com sucesso a reforma da Previdência Social, sem que esta tenha trazido ganho algum para as classes trabalhadoras. Na verdade, tudo fantasia. Até mesmo para os bancos, tais ganhos em capitalização e poupança para aposentadorias futuras não vingaram. O sonho liberal virou pesadelo. Além dos desempregados, dos informais e biscateiros, como distribuir renda também para os excluídos dos excluídos? Estes últimos constituem um contingente de 21 milhões de pessoas morando nas ruas, sem domicílio próprio, analfabetos digitais, miseráveis e invisíveis.

O governo Bolsonaro acabou e novos e diferentes cenários já foram ou continuam ainda em construção. A vida segue e o tempo não para.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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