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Jornalista

Sérgio Fontenele

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A tóxica e covarde política cultural de Bolsonaro

Foto: google imagensIndicado ao Oscar 2020, o filme de Karim Aïnouz foi censurado pela Ancine
Indicado ao Oscar 2020, o filme de Karim Aïnouz foi censurado pela Ancine

Uma das características mais marcantes do governo Bolsonaro é a trincheira montada, a partir do aparelhamento político-ideológico do estado, contra a cultura, seus agentes, a liberdade de expressão, a arte e o pensamento. Causa horror, revolta e perplexidade a maneira com que o governo tem tratado essa área da vida social, origem da incrível diversidade, pluralidade, alto nível de elaboração, qualidade estética e poética, e transgressão ao sistema opressor dominante, aspectos que tanto contribuíram para a formação do País.

Influenciada diretamente pelo obscurantismo proposto pelo obscuro – a repetição é proposital – astrólogo ou pseudo-filósofo Olavo de Carvalho, guru do presidente Jair Bolsonaro e de uma extrema-direita feroz, ressentida e obtusa, a política cultural oficial implementada hoje visa destruir, por um lado, e tolher, pelo outro. Desde a extinção do Ministério da Cultura, rebaixado à categoria de segundo escalão, a destruição dos meios de fomento cultural é a estratégia adotada para contribuir com o processo de manipulação ou idiotização coletiva.

Tratada como secundária – é o aspecto mais superficial dessa política –, a cultura brasileira tem sido o alvo de ataques que passam pela asfixia financeira, cortando diretamente recursos públicos federais e direcionando ideologicamente os meios de subvenção da produção cultural. Um dos principais, a Lei Rouanet, foi mutilado pelo Ministério da Cidadania, que abriga o guarda-chuva do extinto Ministério da Cultura, e hoje fere de morte, por exemplo, a então pujante indústria do audiovisual, que gera – ou gerava – milhares de empregos.

Livros em chamas

Como a motivação dessa política é fundamentalmente ideológica, o que se pretende é impedir que a cultura, em suas múltiplas expressões artísticas, realize seu papel transformador, individual e coletivo, ampliador da consciência, disseminador do humanismo e gerador de prazer e felicidade. Algo semelhante ocorreu na Alemanha Nazista, onde pilhas monumentais de livros, escritos por autores alemães considerados subversivos ou proscritos, foram incendiadas, a partir da noite do dia 10 de maio de 1933.

É o que está faltando para compor o “belo quadro” da era bolsonarista. Não será surpreendente, se tal absurdo se repetir nos territórios dos trópicos tupiniquins. Mas há gestos semelhantes, como a retirada, das paredes da sede da Agência Nacional do Cinema (Ancine), dos quadros com pôsteres de filmes brasileiros, expostos desde 2002 nos corredores e salas do órgão. Sem qualquer explicação ou justificativa à opinião pública, o ato é emblemático da gestão bolsonarista da cultura, e claramente objetiva apagar a memória. Não parou por aí.

Filmes brasileiros também foram retirados do site da Anice, que, não satisfeita, cancelou a exibição do longa “A Vida Invisível”, do diretor Karim Aïnouz, com a participação da atriz Fernanda Montenegro, inscrito para a disputa do Oscar 2020. Em resposta, Aïnouz foi lapidar. Segundo ele, o cancelamento é um ato de censura, o desdobramento de uma “política tóxica e covarde, perpetrada por um governo catastrófico, que põe deliberadamente em xeque a cultura de um país tão abundante quanto o nosso”. Perfeita definição, diretor!

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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