Política

PEC das Praias será votada nesta quarta com possibilidade para privatização

Apresentada originalmente em 2011, Por Flávio Bolsonaro, a proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados em fevereiro de 2022


FernandoPodolski/Getty Images/iStockphoto PEC das Praias será votada nesta quarta com possibilidade para privatização
PEC das Praias

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deve votar nesta quarta-feira (4) a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 39/2011, conhecida como PEC das Praias. Se aprovada, a medida permitirá a transferência da posse de terrenos litorâneos da União para estados, municípios ou particulares. As informações são do UOL.

Apresentada inicialmente em 2011, a PEC foi aprovada pela Câmara dos Deputados em fevereiro de 2022 e começou a tramitar na CCJ do Senado em maio deste ano. Desde então, tem enfrentado forte resistência popular: até a última segunda-feira (2), uma enquete no site do Senado registrava mais de 160 mil votos contrários, contra apenas 2,3 mil favoráveis à proposta.

O texto prevê que estados e municípios possam receber esses terrenos gratuitamente, enquanto particulares teriam que pagar uma taxa pela posse. Críticos alertam que a medida pode levar à privatização das praias, uma vez que os proprietários poderiam ter controle exclusivo sobre essas áreas, transformando-as em espaços privados.

A emenda apresentada pelo relator da PEC, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), busca suavizar as críticas. O novo texto especifica que "as praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar". Bolsonaro também reforçou que qualquer obstrução ao acesso será proibida.

No entanto, o senador Humberto Costa (PT-PE) acredita que a emenda não resolve o problema. "Só essa emenda não é o bastante para garantir que as praias continuem acessíveis. Hoje, temos vários planos diretores que asseguram o acesso, mas há pontos onde hotéis, por exemplo, fazem praias privadas", afirmou. Costa adiantou que deve pedir vista para analisar melhor o texto.

Além das implicações sociais, Costa também alertou para as consequências ambientais. "Em tempos de mudanças climáticas, a propriedade desses terrenos é crucial para o meio ambiente, para o controle da pesca", destacou.

Veja o comentário do jornalista Leonardo Sakamoto

O Senado Federal deve analisar duas polêmicas nesta semana que parecem coisas diferentes mas, na verdade, são um bicho só. Uma é a que privatiza áreas de marinha, coladas às praias. Outro a que libera cassinos, bingos e o jogo do bicho.

Sob a justificativa de garantir segurança a moradores pobres de áreas costeiras e de gerar empregos a trabalhadores pobres, as duas propostas, na verdade, estão sendo empurradas por grandes empresas e políticos (tanto aqueles que são donos de áreas costeiras quanto os que operam pelas grandes empresas) que querem explorar resorts-cassinos no litoral.

A consequente especulação imobiliária que vai expulsar comunidades inteiras e o impacto negativo para a saúde pública da liberação dos jogos de azar junto a trabalhadores que, buscando a ilusão de sair de forma fácil da pobreza, já estão viciados em caça-níqueis e nas famigeradas bets? Dane-se.

A Comissão de Constituição e Justiça deve discutir, nesta quarta (4), a proposta de emenda que privatiza os terrenos de marinha (faixa de algumas dezenas de metros ao longo da costa). Hoje, elas pertencem à União e os proprietários pagam uma taxa.

Por mais que o relator da matéria, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), tenha acrescido um trecho afirmando que o acesso às praias irá continuar garantido após o tema bombar as redes graças à atriz Luana Piovani, especialistas e pesquisadores têm dito que isso é insuficiente para impedir que os empreendimentos interditem o acesso a áreas inteiras e impeçam comunidades tradicionais, como pescadores, de ganhar seu sustento.

Um problema ainda maior é que a proteção das áreas costeiras, como a de manguezais, desempenha um papel importante no combate às mudanças climáticas. Com a construção desenfreada de resorts e outros empreendimentos, esse papel vai pro brejo literalmente. Uma vez que a responsabilidade de fiscalização passaria aos municípios, mais suscetíveis a pressões econômicas, imagine a farra.

Se estivesse pensando nos mais pobres, a proposta poderia isentá-los de taxa ou garantir a papelada para dar segurança a quem vive nessas áreas. Mas, ao invés disso, vai no sentido do sonho de Jair Bolsonaro de transformar regiões como a Baía da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, em uma “Cancún brasileira”.

E, nessa Cancún, um dos principais atrativos para o público interno e externo são os cassinos.

Não coincidentemente o Senado pautou para análise do plenário também nesta quarta o projeto de lei que libera cassinos e bingos. Originalmente, o PL apresentado pelo ex-deputado federal Renato Vianna pretendia legalizar apenas o jogo do bicho, fonte de violência e corrupção policial, mas foi inchando com os lobbies bilionários e com políticos que vão ganhar muito cascalho com isso.

Sua aprovação abre uma brecha para que a jogatina on-line também seja legalizada. E no momento em que vivemos uma epidemia de vício em jogos causado pela liberação das bets, que está desestruturando família, consumindo a renda dos trabalhadores e levando algumas pessoas ao suicídio, analisar a liberação dos cassinos parece uma brincadeira de mau gosto dos parlamentares.

Como exaustivamente alertado, as casas de jogos estão construindo um caos social, principalmente entre os trabalhadores pobres – que perdem o dinheiro da própria sobrevivência. Anúncios de bets deveriam ser proibidos na TV, no rádio e na internet, mas também em estádio e nas camisas de times de futebol, mas como elas trazem receitas para ao Estado, para a mídia e para amigos de políticos, segue o jogo.

Qualquer tigrinho com problemas de cognição sabe que as casas de apostas lucram com o comportamento compulsivo promovido por elas mesmas. Alertar para ter consciência na hora de jogar, como fazem algumas bets, soa como um traficante na “cracolândia” vender uma pedra e alertar: fume com moderação.

No momento em que o povo pede água para apagar o fogo, ou seja, leis para mitigar o impacto dos jogos disso na saúde pública, o Senado vem com um projeto que pode jogar gasolina.

Esperemos que a base do governo Lula não aceite colocar essas propostas como parte da negociação do pacote de ajuste fiscal, atendendo à chantagem de alguns parlamentares. Ou ver na legalização dos jogos de azar mais uma possibilidade de fonte de renda, pois isso é falso. O custo social e de gastos em saúde para remediar o problema é muito maior do que o ganho em receita.

A PEC que privatiza os terrenos colados às praias e o PL que libera jogos de azar são duas metades da mesma proposta, não à toa estão sendo analisadas conjuntamente agora. A pressão de lideranças do Congresso em nome delas é enorme.

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