Saúde

No Piauí, 33 médicos cubanos ainda atuam pelo Mais Médicos

Os profissionais cubanos estão espalhados por 29 municípios e alguns já pretendem fazer do Brasil  morada definitiva

  • domingo, 6 de junho de 2021

Lançado em 2013 pelo Governo de Dilma, o Programa Mais Médicos visava suprir a carência de médicos nos municípios do interior e nas periferias das grandes cidades do Brasil, apesar de críticas da sociedade civil, conselhos de medicina, estudantes e até Ministério Público.

Antes da chegada dos profissionais estrangeiros, o Brasil possuía 388 015 médicos, correspondendo a dois médicos para cada mil habitantes. Mas havia no país uma distribuição desigual de médicos por região, sendo que 22 estados possuíam um índice inferior à média nacional e apenas 8% dos médicos estavam em municípios com população inferior a 50 000 habitantes, que somam 90% das cidades brasileiras.

Criado em 2013, o Mais Médicos chegou, até 2017, a ter 18.240 médicos, garantindo acesso a 63 milhões de pessoas em 4.058 municípios. Em 14 de novembro de 2018, Cuba anunciou a saída do programa em decorrência de alterações que seriam realizadas nos termos de cooperação. Com isso, cerca de 8 556 médicos cubanos deixaram o programa.

Para resolver a situação, o governo abriu edital para substituir os cubanos. Entretanto, 30% dos profissionais não haviam se apresentado nas respectivas localidades.

Em 1º de agosto de 2019, o governo Bolsonaro lançou o programa Médicos pelo Brasil, em substituição ao Mais Médicos. No ano passado, com dificuldade de atrair médicos brasileiros, o mesmo Governo preparou um edital direcionado especificamente aos profissionais cubanos que estavam atuando na atenção básica pelo Mais Médicos no dia 13 de novembro de 2018 (quando Cuba anunciou a saída do programa após críticas do recém-eleito Bolsonaro). Outra exigência era que eles tivessem permanecido no país até o dia primeiro de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio.

No Piauí, o programa Mais Médicos está funcionando em 130 municípios, onde atuam 308 profissionais. Deste total, 214 são médicos formados no Brasil; 61 são brasileiros formados no exterior e 33 são médicos cubanos reintegrados ao programa.

Os profissionais cubanos estão espalhados por 29 municípios e alguns já pretendem fazer do Brasil  morada definitiva. É caso da doutora Beatriz Alvarez Martinz, 35 anos, que veio com o marido que também é médico e a filha, hoje com 12 anos. Ela trabalha no município de Buriti dos Lopes e o esposo em Brasileira.

Foto: Arquivo pessoalDra. Beatriz
Dra. Beatriz

A chegada ao Piauí da família se deu pelo município de Avelino Lopes, onde ela prestou serviços por dois anos. Com a quebra do contrato do programa eles ficaram desempregados mas conseguiram se realocar na administração municipal, fazendo palestras educativas. “Foi uma experiência importante e uma alternativa econômica”, conta.

A filha, na época com nove anos, não teve dificuldades para se adaptar. “Desde o início já pensávamos em ficar pois não concordamos com o regime de Cuba e gostamos muito do Brasil. Aqui vimos mais possibilidades de ajudar nossas famílias mesmo trabalhando distante”, revela a médica, que lamenta o pouco reconhecimento da sua profissão em seu país de origem.

Beatriz elogia o desempenho do programa Mais Médicos. “A atenção básica é a porta de entrada ao sistema de saúde e onde a gente resolve 80% dos problemas. Tem ajudado muitas pessoas que não tem condição de acesso ao atendimento médio”, observa.

Ela destaca o trabalho dos agentes de saúde, que não existia em Cuba. “Aqui acho mais organizado e tem mais pessoas trabalhando. De negativo, cito a falta de comunicação com o segundo nível da atenção. Por exemplo, se encaminho o paciente para um especialista infelizmente eu não tenho retorno”, comenta.

Como ela, o médico da família Ramon Ernesto Llanes Villageliu, 21 anos de profissão e formado na Universidade de Havana, cela as suas raízes e constituiu família com uma brasileira, que está à espera do segundo bebê.

Foto: Arquivo pessoalRamon Ernesto
Ramon Ernesto

Atuando no município de Fronteiras, ele chegou ao Piauí através do programa e prestou serviços, na primeira etapa, na cidade de Morro Cabeça do Tempo. A esposa é de Araripina.

O acolhimento do povo nordestino é, para o profissional, um grande diferencial, mas ele observa que teve dificuldades com alguns costumes muito arraigados. “Aqui muita gente toma remédio controlado e sedativo, ou receitado por médicos ou por conta própria. Então tivemos que oferecer tratamentos alternativos para ajudar a diminuir essa dependência”, relata ele, que também é acunputurista e quiropraxista.

Ramon Ernesto esclarece que Cuba desenvolve convênio semelhante com 67 países e que eles são de extrema importância para a economia local. “A preocupação agora é por não saber como ficará o Mais Médicos no próximo ano, que no Brasil será ano eleitoral”, afirma.

“O suporte todo do programa pode melhorar, mas aqui o programa está bastante bem estruturado”, ressalta Dr Ramon. Ele observa que alguns médicos cubanos que não estavam na ativa quando da quebra do contrato entre Brasil e Cuba não puderam ser reintegrados ao programa em decorrência das novas regras definidas em lei. É o caso da sua colega de profissão Lisandra, que não voltou a trabalhar pelo Mais Médicos, mas continua vivendo no Piauí. “São pessoas que querem trabalhar e poderiam estar cobrindo as vagas disponíveis”, afirma.

Vagas em aberto

No último certame do Programa Mais Médicos no Piauí, das 25 vagas oferecidas, apenas 15 foram preenchidas. No momento existem 22 vagas no Piauí que deverão ser preenchidas por médicos cubanos dentro dos critérios previstos em lei (ou seja, quem estavam na ativa quando do rompimento entre Cuba e Brasil).

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