Política

Enquanto pressiona por ajuste fiscal, Congresso amplia gastos e favorece super-ricos

Congresso aumenta número de deputados, mantém isenções fiscais e blinda os mais ricos do Imposto de Renda


Pedro França/Agência Senado Enquanto pressiona por ajuste fiscal, Congresso amplia gastos e favorece super-ricos
Rodrigo Pacheco (PSD-MG)

Enquanto impõe derrotas ao governo e exige cortes de despesas, o Congresso Nacional contribui para o aumento dos gastos públicos que costuma atribuir ao Executivo. Segundo levantamento da Tendências Consultoria, encomendado por O Globo, as medidas aprovadas pelos parlamentares terão um impacto fiscal de R$ 106,9 bilhões em 2025. Para 2026, o valor sobe para R$ 123,25 bilhões.

O estudo aponta que esse aumento é resultado de projetos que ampliam despesas, impedem cortes ou mantêm benefícios fiscais. Entre os fatores estão o crescimento das emendas parlamentares, a criação de novas cadeiras na Câmara dos Deputados e o programa de renegociação de dívidas estaduais, o Propag — idealizado pelo ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Sancionado em janeiro, o Propag elimina a cobrança de juros (anteriormente fixada em 2% ao ano), mantendo apenas a correção pela inflação. A partir de 2026, estima-se que o programa custe R$ 20 bilhões ao ano.

Supersalários, emendas e mais deputados

Um dos principais vetores do aumento de despesas são as emendas parlamentares. Hoje, elas somam R$ 62 bilhões — bem acima dos R$ 8,6 bilhões registrados em 2014. O economista Bráulio Borges, da FGV/Ibre, sugere que esse valor seja reduzido para R$ 10 bilhões, alinhando-se à prática de outros países. Para ele, o Executivo carrega um fardo desproporcional: “Temos um Legislativo empoderado e governos regionais com mais espaço no gasto total, mas, quando há problemas, recorrem à União”.

O cientista político Carlos Melo, do Insper, também critica a criação de 18 novas cadeiras na Câmara a partir de 2026. Segundo ele, além do aumento de despesas, os novos parlamentares vão reivindicar as mesmas prerrogativas dos atuais, como emendas e controle sobre o Orçamento. “Negam aumento de receita e elevam a despesa na mesma tacada”, afirmou.

Melo ainda destaca que, com os atuais valores das emendas, do fundo partidário (que chegou a R$ 1,368 bilhão em 2024) e do fundo eleitoral (R$ 5 bilhões), os parlamentares já não dependem do governo para garantir recursos. “São cinco centenas de vereadores federais. Falam em ‘governo congressual’”, completou.

Jabutis, isenções e renúncias fiscais

Apesar de não estarem no Orçamento da União, os chamados “jabutis” — dispositivos incluídos em projetos com temas diferentes — aprovados pelo Congresso em propostas do setor elétrico em junho devem gerar um custo de mais de R$ 190 bilhões para os consumidores. Para Borges, tratou-se de “um ataque especulativo do Congresso contra o Brasil”, aproveitando-se da fragilidade do governo.

Outro exemplo é o Perse, programa criado para apoiar o setor de eventos na pandemia. O Congresso impediu sua extinção, mantendo uma renúncia fiscal superior a R$ 15 bilhões. Também foi mantida a desoneração da folha de pagamento para 17 setores, apesar da exigência do STF por compensações. A estimativa de perda fiscal é de R$ 20 bilhões, dos quais apenas R$ 9 bilhões foram compensados com receitas extraordinárias.

Educação, assistência e Imposto de Renda

A participação da União no Fundeb também aumentou, passando de 10% em 2020 para uma previsão de 21% — com acréscimos anuais de cerca de R$ 6 bilhões. Já o Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a idosos de baixa renda e pessoas com deficiência, teve mantida a flexibilização das regras de acesso, resultando em um gasto anual de R$ 121 bilhões — entre R$ 25 e R$ 30 bilhões acima do que seria com os critérios anteriores.

O professor Guilherme Klein, da Universidade de Leeds e pesquisador do Made-USP, alerta ainda para o impacto da proposta do PP que altera a nova tabela do Imposto de Renda. A proposta do Executivo previa que a alíquota mínima começasse a ser cobrada a partir de rendimentos mensais de R$ 50 mil. A versão do PP eleva esse piso para R$ 250 mil, o que pode gerar uma perda de R$ 38 bilhões em arrecadação.

Congresso se movimenta de olho em 2026

Para Ricardo Ribeiro, analista político da LCA 4Intelligence, as movimentações do Congresso refletem as expectativas para as eleições de 2026. “O Centrão, que tem um pé no governo, já se articula para o cenário eleitoral. Não se trata de ser a favor ou contra cortes de gastos, mas de antecipar o embate político que está por vir.”

Siga nas redes sociais

Deixe sua opinião: